Consulta SEFAZ nº 188 DE 19/04/2004

Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 19 abr 2004

Prestação de Serviço de Transporte - Recolhimento Indevido

Senhor Secretário Adjunto:

1. A empresa acima indicada, inscrita no CNPJ sob o nº .... , e Inscrição estadual nº .... , estabelecida na ......, Cuiabá-MT, requer restituição do ICMS que alega recolhido indevidamente sobre serviços de transporte prestados à empresa Barralcool Usina da Barra S/A, com sede em Barra do Bugres.

Requer ainda, a suspensão da exigência dos valores levantados através de ação fiscal realizada em seu estabelecimento e notificada através do Termo de Intimação nº 077/2003, até o desfecho final do presente pleito.

2. Instruem o processo os seguintes documentos:

1) Relação dos CTRC emitidos no período de 15/09/99 a 30/01/2003, sobre os quais alega ter sido recolhido indevidamente o valor total de R$ 508.425,71 a título de ICMS (fls. 12 a 62);

2) cópia autenticada de Declaração da empresa Barralcool Usina da Barra S/A de que a requerente presta serviços de transporte de álcool CIF para a mesma, desde setembro de 1999 (fls. 63);

3) cópia das Notas Fiscais nº ..... e ....., emitidas pela empresa Barralcool – Usina da Barra S/A em 06/02/2003 e 05/02/2003, respectivamente, bem como do CTRC nº ... emitido pela requerente (fl. 66);

4) Termo de Intimação nº 077/03, de 24/09/2003, expedida pela Superintendência Adjunta de Fiscalização desta Secretária de Estado de Fazenda relativo a exigência de ICMS diferencial de alíquota não recolhido (fls. 67 e 68).

3. É o relatório.

4. Trata o presente de pedido de restituição de ICMS que interessada alega recolhido indevidamente sobre prestação de serviços de transporte à empresa Barralcool Usina da Barra S/A, referente a venda de mercadorias com cláusula CIF.

A requerente informa ser prestadora de serviços de transporte de álcool hidratado, anexando relação de Conhecimentos de Transporte Rodoviário de Cargas – CTRC, emitidos no período de setembro/99 a janeiro/2003, cuja soma do ICMS destacado totaliza R$ 508.425,71.

De acordo com o entendimento da requerente, pelo fato de o produto ter sido comercializado com cláusula CIF (frete incluso no valor da mercadoria), o imposto incidente sobre a prestação de serviço foi recolhido pela empresa remetente, juntamente com o imposto que gravou a saída da mercadoria, tornando-se desnecessário o recolhimento do ICMS-Transporte.

Afirma a requerente que os CTRC relacionados se referem a prestação de serviços de transporte de álcool etílico hidratado carburante à empresa Barralcool Usina da Barra S/A.

5. As cópias de 2 (duas) Notas Fiscais, emitidas pela tomadora dos serviços, e de 1 (um) CTRC, de sua emissão, anexados ao processo, demonstram tratar-se de operação interestadual.

Contudo, embora entenda a interessada que os documentos fiscais coligidos são as provas de suas alegações, os mesmos retratam apenas as operações e prestação neles consignadas.

Ausentes os Conhecimentos de Transporte Rodoviário de Cargas que acobertaram as demais prestações de serviços, a que se reportam o presente pedido, não é possível a identificação do remetente e do destinatário dos produtos e, por conseguinte, da natureza das operações realizadas.

Todavia, na quase totalidade do período reclamado, em relação ao produto combustível, não havia previsão, na legislação tributária, para que o ICMS incidente sobre a prestação de serviços de transporte fosse recolhido por substituição tributária.

6. Assim, no que pertine ao ICMS, nas prestações de serviço de transporte do aludido produto, impõe-se a observância do mesmo tratamento conferido àquelas relativas ao transporte de outras mercadorias, sendo, a princípio, irrelevante tratarem-se de operações internas ou interestaduais, bem como a qualificação dos remetentes e destinatários, pois, em qualquer caso, não haverá duplicidade de recolhimento do imposto.

De fato, a operação de comercialização da mercadoria e a prestação de serviço de transporte constituem fatos geradores distintos, cada qual com seu tratamento tributário, inclusive com sujeitos passivos diferentes.

No que concerne à prestação de serviço de transporte, o sujeito passivo da obrigação tributária é o transportador, ressalvados os casos em que a legislação admita a substituição tributária.

Tratando da incidência do imposto, a Lei nº 7.098, de 30 de dezembro de 1998, que consolida normas referentes ao ICMS, reproduzindo a redação dos mesmos dispositivos da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, dispõe:

"Art. 2° O imposto incide sobre:

I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;

II – prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;

(...)".

E, ao definir o momento da ocorrência do fato gerador, o mesmo Diploma legal assevera:

"Art. 3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I – da saída da mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

(...)

V – do início da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, de qualquer natureza;

(...)."

7. Em apressada interpretação, poderia até se cogitar que o valor do imposto sobre a prestação de serviço, nas vendas com cláusula CIF, estaria sendo exigido duas vezes: primeiro, em relação à própria prestação de serviço e, de novo, juntamente com o preço da mercadoria.

Ocorre, porém, que, na sistemática do ICMS, o valor que grava a prestação do serviço, ressalvadas as hipóteses de vedação, consiste em crédito para o respectivo tomador, conforme prevêem os artigos 24 e 27 da citada Lei n° 7.098/98:

"Art. 24 O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores por este ou por outro Estado.

(...)

Art. 27 O direito de crédito, para efeito de compensação com débito do imposto, reconhecido ao estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à idoneidade da documentação fiscal, conforme caracterizada no regulamento, bem como à sua escrituração nos prazos e condições estabelecidos em normas complementares, além da observância do disposto no parágrafo único do artigo 24.

(...)". (Destacou-se).

Dessa forma, no que se refere à prestação de serviço de transporte, é assegurado ao tomador do serviço, ressalvadas as hipóteses de vedação previstas na legislação tributária, o aproveitamento do crédito relativo ao ICMS correspondente ao frete por ele contratado.

E, em se tratando de venda com cláusula CIF, o tomador do serviço é o remetente da mercadoria.

Portanto, no caso em comento, o ICMS incidente na prestação de serviço de transporte do combustível não foi recolhido em duplicidade, posto ter implicado direito de crédito para o remetente, tomador do serviço.

8. Antecipadamente, já se afasta eventual alegação de que o remetente poderia não ter se aproveitado desses créditos, como justificativa para a repetição de indébito pleiteada, dada sua impertinência ao caso:

em primeiro lugar, porque a circunstância não asseguraria ao transportador legitimidade para requerer a sua restituição, uma vez que a não utilização dos créditos pelo remetente não tornaria indevido o imposto recolhido, diante da expressa previsão legal da respectiva hipótese de incidência;

e mais: o remetente poderia até mesmo não ter registrado os créditos, porém, em razão de outros tratamentos estabelecidos na legislação, como, por exemplo, a adesão a benefícios fiscais condicionados (para ilustrar, cita-se a utilização de crédito presumido já conferido a usinas, condicionados à renúncia dos demais créditos, cf. artigo 70 das DT/RICMS, redação do Decreto n° 4.441/2002).

9. E para que não paire dúvidas quanto a serem tributadas as prestações de serviço de transportes relatadas pela empresa, incumbe lembrar que a Secretaria de Estado de Fazenda, no período em que teriam sido executados os serviços de transporte, estabelecia critérios para fixação dos valores do frete de combustíveis, para efeito de base de cálculo e recolhimento do ICMS.

Com essa finalidade, foi publicada a Portaria Circular n° 88/96-SEFAZ, de 12/11/1996 (DOE de 14/11/96), que, inclusive, trazia, na sua Tabela 02-Combustível, a kilometragem/valor do frete por m3, relativa a cada unidade produtora deste Estado com destino a distribuidoras localizadas em Paulínea ou Avanhadava.

Posteriormente, com o mesmo intuito, foram editadas as seguintes Portarias:

Portaria nº: Data Data da Publicação
20/97 14/03/97 19/03/97
38/97 15/05/97 23/05/97
69/99 12/08/99 17/08/99
68/2001 27/09/2001 04/10/2001
80/2001 23/10/2001 31/10/2001
42/2002 09/05/2002 10/05/2002

10. Ainda em relação ao período em que foram realizados os serviços, há que se noticiar a existência de previsão na legislação de exceção à tributação do transporte do produto descrito pela requerente.

Contudo, e mais uma vez já repudiando eventual argumento desse naipe, tal regra somente foi introduzida pelo Decreto nº 4.753, de 08/08/2002, que acrescentou o art. 306-H ao Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06/10/89.

Por força do aludido preceito, foi dispensado o destaque do ICMS referente a prestação de serviço de transporte, relativo à remessa de AEHC, porém restrita àquelas realizadas dentro do território do Estado.

Eis o disposto no mencionado art. 306-H:"Art. 306-H Em função do disposto nos artigos 306 a 306-F, fica dispensado o destaque do ICMS referente à prestação de serviço de transporte intermunicipal, executada dentro do território do Estado, relativa à remessa de AEHC."

Infere-se, pois, que a regra não abrange a prestação interestadual de serviço de transporte.

A ausência dos CTRC impede também a identificação dos itinerários, mas os documentos fiscais juntados pela própria requerente revelam ser interestadual, pelo menos, a natureza daquelas prestações de serviço, inferindo-se que não estavam alcançadas pela dispensa contida no artigo transcrito.

11. Finalizando, vale lembrar que sendo o ICMS tributo que integra a sua própria base de cálculo. Uma vez que foi emitido o CTRC e tendo sido destacado o imposto, o seu valor compôs o preço total do frete e o seu ônus foi suportado pelo tomador do serviço, ao qual – repita-se –, salvo vedação expressa na legislação tributária, é dado o direito de creditar-se do valor recolhido.

12. Diante do exposto, resta propor o indeferimento do pedido de restituição, esclarecendo, ainda, à interessada que a legislação tributária não reveste o pedido de repetição de indébito de efeito impeditivo de instauração de procedimento fiscal junto ao estabelecimento requerente.

13. É o que cabia informar, ressalvando-se que, em sendo a presente aprovada, deverá ser encaminhada cópia ao Segmento de Combustíveis da Superintendência Adjunta de Fiscalização para conhecimento.

Gerência de Legislação Tributária da Superintendência Adjunta de Tributação em Cuiabá-MT, em 19 de abril de 2004.
Marilsa Martins Pereira
Gerente de Legislação TributáriaDe acordo:Dulcinéia Souza Magalhães
Superintendente Adjunta de Tributação