Consulta SEFAZ nº 215 DE 04/12/2000
Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 18 dez 2000
Construção Civil - Diferencial Alíquota - Cadastro de Contribuintes
Senhor Secretário:
A empresa acima indicada, inscrita no CNPJ sob o nº ..., e no CCE sob o nº ..., estabelecida na ... , Cuiabá – MT; formula consulta com as seguintes questões:
1) é devido o diferencial de alíquota para empresas de Construção Civil que não praticam operações descritas no artigo 429 do ICMS?
2) é divido o diferencial de alíquota mesmo no caso de o Estado de origem tenha tributado a operação pela alíquota interna ("cheia")? Se devido não seria o caso de bitributação?
3) As empresas de Construção Civil que não praticam as operações descritas no artigo 429 do Regulamento do ICMS estão obrigadas a se inscrever no Cadastro de Contribuintes? Caso não estejam obrigadas, haveria algum impedimento de serem expedidas certidões de quitação com a Fazenda Estadual para participação de concorrências públicas e também se haveria algum impedimento para transportar material para obras fora de sua sede?
É a consulta.
Sobre o assunto, a extinta Assessoria Tributária, bem como a atual Gerência de Legislação Tributária da Coordenadoria de Tributação, que lhe substituiu nas suas atribuições, tem reiteradamente se manifestado pelo seguinte entendimento:
"Objetivando a melhor compreensão da matéria, é de se trazer à colação os preceitos que norteiam a tributação dos prestadores de serviços, iniciando pelo Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, que, em seu artigo 8º, determina:"Art. 8º - O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.
§ 1º - Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.
§ 2º - O fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao imposto sobre circulação de mercadorias."Examinando a Lista de Serviços remetida, já na redação conferida pela Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, verifica-se estarem nela arroladas as seguintes atividades, conforme itens 32 e 34:"(...)
32. Execução, por administração, empreitada e subempreitada, de construção civil, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços que fica sujeito ao ICM).
(...)
34. Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM).
(...)."
A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe sobre o ICMS, determina:"Art. 2º - O imposto incide sobre:
(...)
V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.
(...)."
Editada ainda sob a égide do Convênio ICM 66/88 (então em vigor com status de lei complementar no âmbito do ICMS, conforme artigo 34, § 8º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) a Lei 5.419, de 27 de dezembro de 1988, que instituiu o tributo no Estado de Mato Grosso, ao elencar as hipóteses constitutivas do seu fato gerador, estabelece:"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:
(...)
VIII - no fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:
(...)
b) compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência deste imposto, como definida em lei complementar;
(...)"
Conveniente observar que não há contradição entre os dispositivos da Lei recepcionada com a ordem conferida pela LC nº 87/96. Muito menos, a aludida Lei Complementar trouxe nova regra que alterasse o tratamento estabelecido entre os impostos estadual e municipal, ditado pelo Decreto-lei nº 406/68.
Atentando para os limites da competência estadual, o Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06 de outubro de 1989, detalha:"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:
(...)
IX - no fornecimento de mercadorias com prestação de serviços compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência do ICMS, como definida na lei complementar, a saber:
a) fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador do serviço, fora do local da prestação do serviço:
1) nos casos de execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares;
2) nos casos de conservação, reparação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres;
(...)."
Por seu turno, cuidando da não-incidência, o artigo 4º do texto regulamentar dispõe:"Art. 4º - O imposto não incide sobre:
(...)
XIV - as saídas de mercadorias de estabelecimento prestador de serviços a que se refere o artigo 8º do Decreto-lei Federal nº 406, de 31 de dezembro de 1968, na redação determinada pelo Decreto-lei 834, de 8 de setembro de 1969, constante da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos VIII e IX do artigo 2º deste regulamento.
(...)."
Não é demais trazer à colação a definição de contribuinte, contida no artigo 10 do Regulamento do ICMS:
"Art. 10 - Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviços descritos como fato gerador do imposto.
§ 1º - Incluem-se entre os contribuintes do imposto:
(...)
X - o prestador de serviços compreendidos na competência tributária dos Municípios, e que envolvam fornecimento de mercadorias ressalvadas em lei complementar;
(...)."
Ainda do RICMS, busca-se o disposto no artigo 21:"Art. 21 - Inscrever-se-ão no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes de iniciarem atividades:
I - as pessoas arroladas no artigo 10;
(...)
V - as demais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que praticarem habitualmente, em nome próprio ou de terceiros, operações relativas à circulação de mercadorias;
(...)."
Além das disposições até aqui invocadas, estatuídas em artigos de caráter geral, o RICMS contém capítulo exclusivo normatizando as Operações relativas à Construção Civil (Capítulo III do Título VII do Livro I). Deste, incumbe transcrever:
"Art. 426 - Considera-se empresa de construção civil, para fins de inscrição e cumprimento das demais obrigações fiscais previstas neste regulamento, toda pessoa, natural ou jurídica, que executar obras de construção civil ou hidráulicas, promovendo a circulação de mercadorias em seu próprio nome ou de terceiros.
§ 1º Entendem-se por obras de construção as adiante relacionadas, quando decorrentes de obras de engenharia civil:
I - construção, demolição, reforma ou reparação de prédios ou de outras edificações;
(...)
§ 2º O disposto neste capítulo aplica-se também aos empreiteiros e subempreiteiros, responsáveis pela execução da obra no todo ou em parte.'
'Art. 427 - O imposto não incide sobre:
I - a execução de obras por administração sem fornecimento de material;
II - o fornecimento de material adquirido de terceiros por empreiteiro ou subempreiteiro para aplicação na obra;
III - a movimentação de material a que se refere o inciso anterior, entre estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra obra;
IV - a saída de máquinas, veículos, ferramentas ou utensílios para prestação de serviço em obra, desde que devam retornar ao estabelecimento do remetente.'
Ressalva-se que o artigo 427 transcrito foi restabelecido no RICMS, com nova redação, através do Decreto nº 81, de 28 de março de 1995.
'Art. 429 - O imposto será pago sempre que a empresa de construção promover:
I - saídas de materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, quando destinados a terceiros;
II - a saída de seu estabelecimento, de material de fabricação própria;
III - a entrada de mercadoria importada do exterior;
IV - a entrada, no estabelecimento da empresa, de mercadoria oriunda de outro Estado ou do Distrito Federal destinada a consumo ou a ativo fixo;
(...)
Parágrafo único - Nas hipóteses dos incisos IV e V a obrigação da empresa consistirá, afinal, em pagar o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual."
A longa reprodução dos preceitos legais e regulamentares tem por escopo oferecer a sustentação para as conclusões que se seguirão.
O Decreto-lei nº 406/68, ao remeter, em seu artigo 8º, à sua anexa Lista, as hipóteses constitutivas do fato gerador do ISS, deixou a salvo do então ICM - hoje, ICMS - o fornecimento de mercadorias por empresas de construção civil, adquiridas de terceiros.
A exclusão, vale destacar, está claramente explicitada no artigo 4º, inciso XIV do RICMS.
Por conseguinte a empresa que, atuando no ramo em tela, em regime de administração, empreitada ou subempreitada, não forneça mercadorias de fabricação própria, produzida fora do local da obra, não configura, por esta atividade, contribuinte do imposto.
O entendimento esposado é ratificado pelo § 1º do artigo 10 do RICMS, que, no que pertine ao prestador de serviços submetido ao imposto municipal, considera-o contribuinte do ICMS, quando também fornecer mercadorias ressalvadas em lei complementar (inciso X).
Prosseguindo na análise das indicações, há que se investigar os fundamentos da parcela do imposto devido a título de diferencial de alíquota.
A Carta Magna de 1988, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 1993, preconiza:"Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
(...)
§ 2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) a alíquota interestadual quando o destinatário for contribuinte do imposto;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII - na hipótese da alínea 'a' do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
(...)."
Ora, se as empresas consideradas não são contribuintes do imposto, não cabe se lhes exigir o diferencial de alíquota, eis que ausente elemento necessário à tipificação do fato gerador do imposto.
Em contrapartida, porém, não se-lhes aplica a alíquota interestadual; vale dizer, nas aquisições de mercadorias de outras unidades da Federação, as operações devem ser gravadas com a alíquota interna, vigente na unidade federada de localização do remetente.
Ocorre que, via de regra, as empresas em questão dedicam-se a mais de uma atividade - é comum estatutos sociais prevendo não só atividades em questão, mas também outras de natureza correlata, com submissão ao ICMS (fornecimento de mercadoria ressalvada em lei complementar) e, até mesmo, atos de comércio, senão em geral, pelo menos, de sobras e resíduos, como indicado no inciso I do artigo 429 do RICMS.
De sorte que, em tese, no desempenho de suas atividades, as empresas enumeradas nos §§ do artigo 426, praticam também fatos que lhe conferem a condição de contribuinte, ainda que em caráter excepcional.
Para a exigibilidade do diferencial de alíquota, é necessária a qualidade, mesmo que em potencial, de contribuinte do ICMS, mas não se perquire se a mercadoria vai ser destinada a atividade afeta a este imposto, ou não.
Uma vez contribuinte, a alíquota aplicável nas aquisições de outros Estados é a interestadual, ainda que o bem ou material seja empregado em prestação de serviço sujeita apenas ao ISS.
Daí a celebração do Convênio ICMS 71/89 firmando o seguinte entendimento:"Cláusula primeira - ... nas operações interestaduais de bens e mercadorias destinadas a empresas de construção civil, para fornecimento em obras contratadas que executem sob sua responsabilidade, e em que ajam, ainda que excepcionalmente, como contribuinte do imposto, aplica-se o disposto na letra 'a' do inciso VII e, se for o caso, no inciso VIII, do § 2º, do artigo 155 da Constituição Federal."
Os incisos IV e V do artigo 429 do RICMS, se tomados isoladamente, poderiam levar a concluir que a qualquer empresa impõe-se o recolhimento do diferencial de alíquota. A ilação é falsa. Os dispositivos hão que ser interpretados à luz dos demais, hierarquicamente superiores, que norteiam a matéria, sem perder a correlação com os incisos citados do artigo 2º do RICMS.
Por empresa, nos incisos em exame, deve-se entender apenas aquelas enquadradas na condição de contribuintes do ICMS - ainda, que, excepcionalmente, porém, contribuintes -, respeitando-se, portanto, os limites legais definidores do arquétipo do diferencial de alíquota.
Em não sendo contribuinte, isto é dedicando-se exclusivamente a atividade sujeita ao ISS, não estaria, sequer, inscrita no Cadastro do Estado não podendo, então, apresentar-se como tal nas aquisições interestaduais, devendo exigir do fornecedor o destaque do ICMS pela alíquota interna da unidade federada de origem.
Se as próprias empresas confessam-se contribuintes, se as aquisições são gravadas por alíquota minorada, resta a exigibilidade do diferencial de alíquota, como previsto nos incisos II e III do artigo 2º, combinado com os incisos IV e V do artigo 429, ambos do RICMS."
Diante da atualidade da presente consulta, cabe esclarecer que a Lei nº 5.419, citada no entendimento ora transcrito foi revogada pela Lei nº 7.098, de 30 de dezembro de 1998, que consolidou normas referentes ao ICMS, editada já em conformidade com a Lei Complementar nº 87/96, porém, com redação semelhante à Lei substituída, no que pertine à incidência do imposto:"Art. 2º - O imposto incide sobre:
(...)
V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.
(...)".
Após as considerações retro, passa-se a responder as questões suscitadas:
1 - A consulente não juntou cópia do seu contrato social, para que se conheça o objeto da sociedade, porém, isto se torna irrelevante, visto que as empresas de construção civil, via de regra, desenvolvem atividades decorrentes da principal, que as tornam contribuintes de ambos os impostos, haja vista o fornecimento de mercadoria ressalvada em lei complementar ou as saídas de materiais, sobras e resíduos (inciso I do art. 429 do RICMS).
Portanto, para o desempenho de suas atividades, necessariamente elas praticam operações que lhes conferem a condição de contribuinte do ICMS, mesmo que eventualmente.
Por conseguinte, as empresas de Construção Civil enquadram-se, ainda que excepcionalmente, como contribuinte do ICMS, por realizarem mesmo que esporadicamente as operações descritas no artigo 429 do RICMS.
2 - O fato de a empresa fornecedora estabelecida em outra unidade da Federação ter destacado o imposto aplicando-se a alíquota estabelecida para não contribuinte do ICMS, nas operações realizadas com a consulente, não impede este Estado de exigir a parcela do imposto devido a título de diferencial de alíquota que lhe foi constitucionalmente reservado. É justamente o que assevera o Convênio ICMS nº 71/89, que em momento algum foi declarado inconstitucional e do qual os Estados são signatários.
3 - Para responder a este item temos que nos reportar ao artigo 21 do Regulamento do ICMS anteriormente transcrito, que prevê a obrigatoriedade da inscrição Estadual para as pessoas arroladas no artigo 10 e as demais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que praticarem habitualmente, em nome próprio ou de terceiros, operações relativas à circulação de mercadorias.
Por sua vez, o artigo 10, remetido, inclui entre os contribuintes do imposto, o prestador de serviços compreendidos na competência tributária dos Municípios, e que envolvam fornecimento de mercadorias ressalvadas em lei complementar;
O dispositivo supra define contribuinte como qualquer pessoa física ou jurídica, que realize operação de circulação de mercadorias ou prestação de serviços descritos como fato gerador do imposto, ou seja, as operações descritas no artigo 429 do RICMS.
Diante do exposto, conclui-se que as empresas de construção civil estão obrigadas a se inscreverem no Cadastro de Contribuintes do Estado por serem, mesmo que em potencial, contribuintes do ICMS, ficando, portanto, prejudicadas as respostas a este item.
De qualquer forma, para as empresas não inscritas no Cadastro de Contribuintes do Estado, é expedida certidão de que as mesmas não são inscritas no C.C.E. E para acobertar eventuais operações realizadas por empresas que não são contribuintes do ICMS, são emitidas Notas Fiscais avulsas, pelas Agências Fazendárias.
É a informação, que se submete à superior consideração, com a ressalva de que os destaques apostos nos preceitos da legislação reproduzida inexistem no original.
Gerência de Legislação Tributária da Coordenadoria de Tributação, em Cuiabá-MT, 04 de dezembro de 2000.
Marilsa Martins Pereira
FTE
De acordo:
Yara Maria Stefano Sgrinholi
Respondendo pela Coordenadoria de Tributação