Consulta nº 75 DE 17/06/2016

Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 17 jun 2016

ICMS. COMERCIALIZAÇÃO DE ÁRVORES DE PINUS EM PÉ DESTINADAS AO CORTE. BEM MÓVEL POR ANTECIPAÇÃO. FATO GERADOR DO ICMS. TRATAMENTO TRIBUTÁRIO.

A consulente expõe que atua na comercialização de árvores de pinus em pé e que pretende praticar operação de venda em que o comprador fica responsável pela manutenção, corte, retirada e transporte das árvores adquiridas, conforme contrato de compra e venda, ficando imitido na posse (do imóvel onde se encontram plantadas as árvores) desde a assinatura do contrato.

Dessa forma, o corte, a retirada e o transporte das árvores serão realizados em momento posterior (mais de um), conforme a conveniência do comprador, dentro dos limites contratuais.

Entende que:

a) a árvore em pé é um bém imóvel, nos termos do art. 79 do Código Civil, e sua venda não caracteriza circulação de mercadoria, não estando obrigada a emitir nota fiscal por ocasião da assinatura do contrato;

b) não está obrigada à emissão de notas fiscais no momento da retirada das árvores anteriormente vendidas, pois compete ao comprador emiti-las por ocasião de seu transporte, nos termos do art. 160, § 1º, inciso I, do RICMS;

c) a comercialização de madeira de pinus em pé está ao abrigo do diferimento do ICMS, previsto no art. 107, item 74, do RICMS.

Indaga se está correto seu entendimento.

RESPOSTA

Em que pese o art. 79 do Código Civil considerar a árvore em pé, enquanto incorporada ao solo, bem imóvel, tal classificação fica alterada em razão da finalidade econômica dada ao bem, conforme apontam doutrina e jurisprudência, a saber:

“[...] o industrial que adquire […] a madeira, para recebê-la cortada ou para ele próprio encarregar-se da derrubada, não está positivamente negociando uma coisa imóvel, pois que as árvores de nada lhe servirão enquanto presas pelas raízes. O objeto do contrato é a madeira a ser cortada; o que tem interesse econômico são as árvores destacadas do solo” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Vol. I. 21 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 424)”.

“[...] as árvores destinadas ao corte, para finalidade industrial, convertem-se em móveis, porque o que se vende é a árvore abatida, a madeira cortada. As árvores só são imóveis quando consideradas conjuntamente com o solo a que aderem” (STF, AI 37.061/PR no REx 57.935/PR).

“Venda de safra futura. Bens móveis por antecipação. A venda de frutos, de molde a manifestar o intuito de separação do objeto da venda em relação ao solo a que se adere, impõe a consideração de que tais coisas tenham sido, antecipadamente mobilizadas (STJ, AReg no AI 174.406/SP)".

“Alienado o bem para ser destacado do imóvel, sendo a intenção dos contratantes exatamente proceder a essa separação, de que resultará a mobilização física, muito de aceitar-se que, desde a feitura do contrato, móveis já se considerem (STJ, Resp 23.195-8/PR)".

Nessa perspectiva, portanto, em que as árvores são objeto de negociação autônoma, o direito brasileiro tem considerado a mata em pé um bem móvel por antecipação:

“O fim que se tem em vista, na compra e venda de mata, é, pois, decisivo. Destinada à derrubada, o que se vende é a árvore abatida, a madeira cortada. Não se trata assim de bem imóvel, mas de bens móveis por antecipação” (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito divil. 38 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 150).

“As árvores e frutos da terra enquanto não separados consideram-se imóveis, mas podem ser alienados para corte ou colheita e, nesses casos, classificam-se como móveis por antecipação” (DUARTE, Nestor et al. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Cordenador Cezar Peluso. 4 cd rev e atual. Barueri: Manole, 2010, p. 90).

“As árvores, quando destinadas ao corte, são consideradas bens 'móveis por antecipação'” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 1: parte geral. 10 ed. São Paulo, Saraiva, 2012, p. 274/275).

“Árvores vendidas para corte são bens móveis por antecipação e para sua alienação independem de outorga uxória” (RT, 227/231, 209/476 apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 1: parte geral. 10 ed. São Paulo, Saraiva, 2012, p. 298).

A respeito dessa categoria de bem, é oportuno citar ainda que:

“O art. 82 do Código Civil considera móveis 'os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social'. Trata-se dos móveis por natureza, que se dividem em semoventes e propriamente ditos. Ambos são corpóreos. Outros são móveis para os efeitos legais (CC, art. 83), sendo que a doutrina menciona ainda a existência de móveis por antecipação.

[...]

c ) Móveis por antecipação — A doutrina refere-se, ainda, a esta terceira categoria de bens móveis. São bens incorporados ao solo, mas com a intenção se separá-los oportunamente e convertê-los em móveis, como as árvores destinadas ao corte e os frutos ainda não colhidos. Observa-se, nesses casos, aos quais podem somar-se as safras não colhidas, a vontade humana atuando no sentido de mobilizar bens imóveis, em função da finalidade econômica. Podem ainda ser incluídos nessa categoria os imóveis que, por sua ancianidade, são vendidos para fins de demolição” (GONÇALVES, Carlos Roberto, opus cit, p. 274/279).

“Segundo Agostinho Alvim, as árvores e frutos só aderem ao imóvel, enquanto não sejam 'objeto de negócio autônomo' (Comentários ao Código Civil, v. 1, p. 223, n. 4). Decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo: 'Ação que versa sobre contrato de venda e compra de safra de laranjas, as quais constituem coisas móveis futuras, também ditas ‘móveis por antecipação’. Competência do Primeiro Tribunal de Alçada Civil, relativa a coisa móvel. Remessa dos autos determinada' (JTJ, Lex, 217/25, apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Idem, p. 299/300).

“As árvores destinadas a corte e os frutos que devem ser colhidos consideram-se móveis por antecipação, do que decorre a desnecessidade de outorga uxória e a incidência de imposto sobre circulação de mercadorias e não de transmissão de bens imóveis” (DUARTE, Nestor et al. Opus cit. p. 91).

“[...] há os bens denominados móveis por antecipação, como, por exemplo, as árvores, as edificações etc. Na verdade, tanto umas quanto outras são, por sua natureza, bens imóveis, mas somente enquanto estiverem presas ao solo. Em outras palavras, tanto as árvores quanto as edificações podem ser mobilizadas a qualquer momento. Se vendo mata de eucaliptos, ou o material de construção de uma casa, logicamente não estou vendendo o terreno no qual está plantada a mata ou construída a casa. Tanto isto é verdade, que essa venda se processará da forma que a Lei admite para a venda de bens móveis, ou seja, sem quaisquer solenidades ou formalidades. A venda poderá ser até mesmo verbal. Daí dizermos que estes bens são móveis por antecipação, isto é, para efeitos daquele contrato especificamente, são considerados móveis” (FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 12 ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p.185).

Tais considerações se almodam ao caso em tela, segundo relato da consulente.

Assim sendo, o negócio jurídico de venda de árvores em pé destinadas ao abate, que são bens móveis por antecipação, portanto, mercadorias, constitui fato gerador do ICMS, devendo ser observados os seguintes procedimentos:

1. na hipótese em que o adquirente fica responsável pela manutenção, corte, retirada e transporte das toras:

1.1 deve ser emitida nota fiscal por parte do alienante, pelo valor da comercialização, por ocasião da celebração do contrato de compra e venda, pois ocorre a circulação jurídica das mercadorias, ainda que não haja circulação física;

1.2 para documentar a posterior saída das toras, deve ser emitida nota fiscal pelo adquirente das árvores em pé, em razão da transferência física das mercadorias;

2. na hipótese em que a alienação das árvores em pé ocorrer sob a condição de entrega futura, no prazo acordado entre o vendedor e o comprador, modalidade de operação em que a eficácia do ato fica pendente de evento futuro, cabe ao vendedor proceder em conformidade com o estabelecido no art. 328, caput e § 2º, do RICMS, devendo emitir nota fiscal por ocasião da efetiva saída (global ou parcial) das toras, sendo facultativo fazê-lo no momento do fazimento do negócio, para fins de simples faturamento (Precedente: Consulta nº 193/2003).

Quanto ao tratamento tributário aplicável, expõe-se que as operações internas com toras, lascas e toretes, resultantes do abate ou desbaste de árvores, estão abrangidas pelo diferimento do pagamento do ICMS, nos termos do item 74 do art. 107 do RICMS, até que ocorra uma das operações mencionadas nos incisos I a VI do art. 106 da mesma norma regulamentar.

Logo, diante do antes exposto, de que as árvores em pé, quando objeto de comercialização, consideram-se mercadorias por antecipação, portanto, toras lascas e toretes por antecipação, conclui-se que sujeitas ao mesmo tratamento tributário dessas.

Caso esteja procedendo de modo diverso, a consulente tem o prazo de quinze dias para realizar os ajustes pertinentes, contados da data da ciência da presente resposta, nos termos do art. 664 do RICMS.

PROTOCOLO: 14.021.115-0