Consulta de Contribuinte nº 166 DE 08/10/2018

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 08 out 2018

ICMS - ATIVO IMOBILIZADO - DIFERIMENTO - Para aplicação do diferimento previsto na alínea “b” do item 41 do Anexo II do RICMS/2002, o bem destinado ao ativo imobilizado para emprego pelo próprio importador em processo de extração mineral, industrialização ou na prestação de serviço de comunicação, conforme o caso, não poderá ser considerado alheio à atividade do estabelecimento, nos termos do § 3º do art. 70 do RICMS/2002 c/c Instrução Normativa DLT/SRE nº 01/1998.

EXPOSIÇÃO:

A CONSULENTE, com apuração do imposto pelo regime de débito e crédito, tem como atividade principal informada no cadastro estadual a fabricação de periféricos para equipamentos de informática (CNAE 2622-1/00).

Afirma que é a primeira empresa integralmente brasileira com capacidade técnica especializada para encapsulamento de circuitos integrados semicondutores.

Informa que, para a instalação de seu parque fabril, foram importados diversos itens que incorporaram o processo produtivo especializado de circuitos integrados, contando atualmente com um moderno laboratório para análise de falhas e testes de confiabilidade, usados durante a elaboração de chips de memória.

Diz que conta com ampla estrutura de “salas limpas” que atendem parâmetros internacionais - Certificado ISO 14644 - para possibilitar rígido controle de pureza de todo o ambiente produtivo e garantir que a matéria prima não sofra perdas por contaminação de qualquer tipo.

Aponta que as “salas limpas” são inexoráveis ao processo produtivo da empresa por conter elementos que controlam a pureza do ar, a temperatura e a umidade do ambiente, o que permite o manuseio da placa de memória no seu interior sem que haja perdas de capacidade de armazenamento por contato do insumo com poeira ou umidade.

Aduz que as importações realizadas pela empresa, destinadas ao seu ativo imobilizado, se deram com autorização para desembaraço aduaneiro ao abrigo do diferimento do ICMS, nos termos da alínea “b” do item 41 do Anexo II do RICMS/2002, anexando o documento denominado Expediente nº 086/2014.

Argumenta que a legislação que disciplina a matéria estabelece que: (I) a entrada da mercadoria deve ser em decorrência de importação direta do exterior; (II) a mercadoria deve ser destinada a integrar o ativo permanente; (III) o emprego da mercadoria deve ser dado pelo próprio importador; (IV) em seu processo de industrialização.

Argumenta também que o conceito de “processo de industrialização” é o requisito que gera maior perplexidade dessa lista por que é fluido e está nos holofotes atualmente, com todas as mudanças tecnológicas que enfrenta a indústria.

Acrescenta que a legislação não categoriza exaustivamente esse termo, dando apenas amostras do que pode ser por ele entendido, conforme se depreende da sua definição no inciso II do art. 222 do RICMS/2002.

De acordo com essa definição, entende que grande parte da atividade que é realizada em suas “salas limpas” está inserida no conceito de beneficiamento, uma vez que, por meio de máquinas sofisticadas e profissionais altamente especializados, realiza o beneficiamento das delicadíssimas placas de memória, tornando-as utilizáveis para os fins que se prestam.

Confessa que ressente de segurança jurídica na interpretação de “ativo destinado ao processo de industrialização”, visto que os materiais por ela importados, por serem de altíssima especialização, não se acomodam tão intuitivamente ao outrora conceito de processo produtivo, virado às avessas com a revolução da indústria 4.0.

Salienta que os impactos da indústria 4.0 sobre a produtividade, a redução de custos, o controle sobre o processo produtivo e a customização da produção, dentre outros, apontam para uma transformação profunda nas plantas fabris e de seus processos produtivos, ficando mais difícil entender, por ocasião da revisão das autorizações de diferimento do ativo importado realizada pela fiscalização, o que seria diretamente ligado a esse processo, ou a ele estaria obliquamente relacionado.

Certifica que seu processo produtivo é muito delicado e não obedece ao fluxo antigamente lido por normal, pelo contrário, a delicadeza e a sofisticação dos processos produtivos muito se assemelham a ambientes hospitalares e aos laboratórios ultramodernos da indústria farmacêutica, chegando a ser ainda mais complexos sob determinados aspectos.

Assinala que anexou orientação preparada pelo seu corpo técnico a qual detalha todo o ambiente diferenciado a que se adstringe, sem o qual não se produziria sequer um circuito de memória que seja útil e funcional.

Menciona que sua preocupação pela interpretação restritiva dada ao “processo de industrialização” não é meramente retórica, uma vez que numa revisão do processo de autorização dos produtos importados realizada pela fiscalização poderá ser considerado que tais produtos não são ligados diretamente ao processo de industrialização, ocasionando cobrança do imposto, multas e juros.

Reconhece que, num processo de industrialização tido como padrão, não seria anormal que o Fisco categorizasse microscópios, condicionadores de ar, estações de tratamento de água e outros relacionados pela CONSULENTE, como elementos apenas auxiliares, não diretamente ligados ao processo produtivo.

Adverte que no cenário vivenciado pela CONSULENTE e pela especificidade de seu insumo - uma delicadíssima placa de memória - não existe processo de industrialização viável se ela não se aparelhar com sistemas de controle de temperatura, pureza e umidade do ar, bem como sistemas de análise microscópica de circuitos.

Acrescenta que se durante o processo de produção as referidas placas não forem inspecionadas durante sua elaboração, correm risco de seguir nas etapas seguintes de produção apresentando perdas que as inviabilizariam, o que justifica o investimento em microscópios e congêneres de análise e testes.

Julga que as mercadorias importadas para o seu ativo imobilizado compõem o processo de industrialização, pois modificam o funcionamento dos circuitos de memória e os aperfeiçoam para o consumo, ocasionando perdas de todos insumos, caso sejam retiradas do referido processo.

Pondera que a relação de ativos importados pela empresa ao abrigo do diferimento, anexa à presente consulta, corre o risco de ser mal interpretada pela fiscalização como não sendo integrante do seu processo produtivo, até mesmo pela conceituação legal defasada de “industrialização”, desta forma vem buscar segurança jurídica sobre a sua correta interpretação quanto ao pleito do diferimento do ICMS precariamente autorizado por ocasião da importação destes ativos, uma vez que se aproxima o quinquênio prescricional para o lançamento de eventuais diferenças, bem como há muito tempo expirou o prazo de 45 dias que o Fisco teria para diligenciar neste sentido.

Propõe uma visita técnica ao local que está instalado o seu processo produtivo, inclusive, por meio de diligência fiscal, considerando que a matéria é complexa, podendo ser, assim, melhor avaliada.

Com dúvida sobre a interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

As mercadorias importadas pela CONSULENTE, com diferimento autorizado previamente, mas sujeito à fiscalização, estariam amoldadas ao conceito do art. 222 do RICMS/2002, segundo o qual “industrialização é qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo”?

RESPOSTA:

Conforme disposição clara contida no inciso II do art. 222 do RICMS/2002, para os efeitos de aplicação da legislação do imposto, in litteris:

II - industrialização é qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo, observado o disposto nos §§ 1º, 3º e 6º, tais como:

a) a que, exercida sobre matéria-prima ou produto intermediário, importe em obtenção de espécie nova (transformação);

b) a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);

c) a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e da qual resulte um novo produto ou unidade autônoma (montagem);

d) a que importe em alterar a apresentação do produto pela colocação de embalagem, ainda que em substituição à original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte de mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento);

e) a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento); (destacou-se)

Conforme observado pela CONSULENTE, as modalidades de industrialização indicadas no rol do inciso II do art. 222, acima transcrito, são exemplificativas, podendo ser constatada modalidade diversa que se enquadre melhor à atividade específica do contribuinte, porém tais modalidades devem sempre se adequar ao texto do caput do referido inciso.

Acrescente-se, ainda, que o § 3º do art. 70 do RICMS/2002 dispõe que consideram-se alheios à atividade do estabelecimento todos os bens que não sejam utilizados direta ou indiretamente na comercialização, industrialização, produção, extração, geração ou prestação de serviço de transporte, interestadual ou intermunicipal, ou de comunicação.

Para a definição do alcance da expressão “utilizados direta ou indiretamente” na industrialização pelo § 3º do art. 70 do RICMS/2002 não basta a verificação de seu significado comum ou vulgar, é necessário verificar na legislação de regência do ICMS o significado técnico que é dado para esses termos.

A Instrução Normativa SLT nº 01/1986 exige, para a caracterização do produto intermediário por extensão (aquele que não integra o produto final, mas é consumido no curso de sua produção), que o mesmo seja consumido de forma direta, assim entendido aquele cuja participação se der num ponto qualquer da linha principal de produção - afastando de seu conceito aquele cuja participação se der em uma linha marginal ou independente (considerado como consumido de forma indireta).

Desta forma, o emprego da expressão “utilizados direta ou indiretamente” na industrialização pelo § 3º do art. 70 do RICMS/2002 tem como objetivo definir que não apenas o bem utilizado na linha principal de produção enseja o direito ao crédito, e, portanto, também a aplicação do diferimento do imposto de que trata a alínea “b” do item 41 do Anexo II do RICMS/2002, mas igualmente aquele alocado nas linhas marginais ou independentes de seu processo produtivo.

A definição de bem alheio está condicionada ainda à Instrução Normativa DLT/SRE nº 01/1998. O art. 1º dessa instrução normativa apresenta critérios gerais para a conceituação de bens alheios:

- aqueles que não sejam empregados na consecução da atividade econômica do estabelecimento, assim entendidos os não utilizados na área de produção industrial (alínea “c” do inciso II). A área de produção industrial compreende os espaços onde são desenvolvidas as atividades relacionadas com o processo produtivo, desde o recebimento dos insumos até a entrega do produto final;

- aqueles utilizados em atividade exercida no estabelecimento, fora do campo de incidência do ICMS (alínea “a” do inciso II), assim entendido os bens utilizados em atividades listadas no Anexo Único da Lei Complementar nº 116/2003 e que não sofrem incidência do ICMS, ressalvados desta condição aqueles empregados nas atividades desenvolvidas na área de produção industrial.

A referida instrução normativa também lista alguns exemplos mais concretos (veículos de transporte pessoal, salvo prova em contrário, conforme inciso I; utilizados nas atividades listadas na alínea “b” do inciso II - capacitação técnica, de cultura, de lazer, esportivas, ou de profilaxia dos empregados, ainda que visem a aumentar a produtividade da empresa), além da hipótese prevista no inciso III (mercadorias destinadas à construção, reforma ou ampliação do estabelecimento).

Assim, tem-se que não devem ser considerados como alheios aqueles bens, inclusive mercadorias ou serviços, utilizados em atividade operacional (no caso, industrial) do estabelecimento sujeita a tributação pelo ICMS.

A partir desse entendimento, pode-se concluir que são exemplos de bens alheios à atividade de estabelecimentos industriais aqueles empregados na execução das seguintes atividades (além daquelas já listadas pela IN DLT/SRE nº 01/1998):

- alimentação de funcionários (restaurantes internos);

- enfermaria;

- segurança patrimonial;

- combate e prevenção a incêndios;

- desenvolvimento de produto/protótipo (tal atividade está prevista no subitem 2.01 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003 e não é realizada na área de produção industrial, conforme conceito já explicitado);

- tratamento de gases ou efluentes para fins exclusivos de atendimento à legislação ambiental (tal atividade está prevista no subitem 7.12 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003 e não é realizada na área de produção industrial, conforme conceito já explicitado).

Por outro lado, não devem ser considerados alheios à atividade de estabelecimentos industriais aqueles bens empregados na execução das seguintes atividades:

- controle de qualidade de produtos sujeitos à tributação pelo imposto (atividade desenvolvida na área de produção industrial, conforme conceito já explicitado);

- tratamento de afluentes com o fim específico de adequação de suas propriedades às necessidades demandadas pelo processo produtivo do contribuinte (realizada na área de produção industrial, conforme conceito já explicitado);

- tratamento de efluentes para reutilização no processo produtivo do contribuinte ou como processo produtivo independente/novo ciclo industrial (apesar de tal atividade estar prevista no subitem 7.12 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003, a mesma é realizada na área de produção industrial, conforme conceito já explicitado). Neste sentido, vide a orientação contida nas Consultas de Contribuintes nos 227/2011 e 123/2013.

Quanto ao cabimento do diferimento do imposto, de que trata a alínea “b” acima transcrita, cabe a análise do titular da Delegacia Fiscal (DF) a que estiver circunscrito o estabelecimento do importador, conforme previsto no subitem 41.12 do mesmo Anexo, visto que dependente da verificação no caso concreto da utilização dada pelo contribuinte a determinado bem do ativo imobilizado, para fins de considera-lo alheio ou não à sua atividade operacional, nos termos da Instrução Normativa DLT/SRE nº 01, de 06 de maio de 1998.

Importa acrescentar que a alínea “c” do subitem 41.12 da Parte 1 do Anexo II do RICMS/2002, que facultava o titular da Delegacia Fiscal determinar diligência no prazo de 45 dias para verificar a conformidade da importação com diferimento de que trata a alínea “b” do item 41 desta mesma Parte, foi revogada, a partir de 05/06/2018, pelo art. 2º com vigência estabelecida pelo art. 4º, ambos do Decreto nº 47.423/2018.

Observa-se, no entanto, que o referido prazo não tinha o condão de delimitar as fiscalizações as quais poderão ser efetuadas quando o Fisco julgar necessárias ao acompanhamento fiscal do contribuinte, observado o prazo decadencial. Neste sentido, vide resposta à Consulta de Contribuinte nº 119/2013.

Cumpre esclarecer que a Consulta de Contribuinte se presta, tão somente, a interpretar a aplicação de legislação tributária, em relação a fato de interesse da CONSULENTE, de acordo com o art. 37 do Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos - RPTA, aprovado pelo Decreto nº 44.747/2008, não cabendo neste foro a classificação dos bens por ela relacionados ou a aplicação no seu processo produtivo.

Assim, independentemente da consistência do laudo técnico juntado pela CONSULENTE, a confirmação do emprego de bens imobilizados no seu processo industrial, observada a orientação dada nesta consulta, somente será possível após avaliação do referido processo onde os bens estão inseridos, bem como do registro de tais bens em seu patrimônio.

A título de informação, saliente-se, ainda, que há previsão no subitem 195.1 da Parte 1 do Anexo I do RICMS/2002 de isenção na entrada, decorrente de importação do exterior, no estabelecimento industrial fabricante de produtos relacionados na Parte 5 do Anexo XII do mesmo Regulamento, em fase de instalação no Estado, de bens ou mercadorias que sejam considerados, no estabelecimento destinatário, bens alheios à atividade ou de uso ou consumo, exceto material de construção, observadas as demais condições dispostas no item 195 da Parte 1 do Anexo I do RICMS/2002.

Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a CONSULENTE tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 8 de outubro de 2018.

Jorge Odecio Bertolin

Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso

Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza

Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues

Superintendente de Tributação