Consulta de Contribuinte nº 224 DE 03/12/2020
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 03 dez 2020
TFRM - FATO GERADOR - O fato gerador da TFRM é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Estado sobre a atividade de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento dos recursos minerários, realizados no Estado, na forma prevista no art. 1º da Lei Estadual nº 19.976/2011.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente, com apuração pelo regime de débito e crédito, tem como atividade principal informada no cadastro estadual a extração de minério de ferro (CNAE 0710-3/01).
Informa que, em junho de 2008, celebrou contrato de compra e venda por meio do qual adquiriu de empresa mineradora todos os direitos minerários na região de Tejuco em Brumadinho/MG.
Diz que, em virtude de dificuldades para efetuar o pagamento do contrato de compra e venda mencionado, acabou tendo a situação judicializada nos autos do processo judicial, tendo dado origem a título extrajudicial.
Afirma que, em 2017, realizou uma composição judicial onde foi acordado que parte do pagamento da dívida decorrente do contrato de compra e venda supramencionado, constituído através do título extrajudicial nos autos do processo, seria efetuado por meio da “dação em pagamento” pela Consulente de 850.000 toneladas de minério fino e 24.000 toneladas de minério LUMP.
Alega que o acordo homologado judicialmente previa ainda que a Consulente deveria ceder, pelo prazo de 4 meses, uma unidade de tratamento de minério (UTM) completa para que a empresa mineradora exequente pudesse beneficiar o minério objeto da negociação judicial, ficando acordado entre as partes que a empresa exequente venderia o referido minério recebido em dação em pagamento, inclusive para a própria Consulente.
Menciona que quem efetuou todos os passos para extração, beneficiamento e posterior revenda do referido minério objeto da dação em pagamento foi a própria empresa exequente, haja vista que a Consulente unicamente cedeu em dação em pagamento os direitos para exploração das pilhas de minério, situações estas previstas no acordo efetuado para liquidação da dívida objeto da ação judicial mencionada.
Salienta que, na operação em destaque, no que se refere à dação em pagamento das toneladas de minério de ferro, a Consulente transferiu apenas os direitos decorrentes de tais toneladas de forma que:
1- Não utilizou o minério de ferro objeto da dação em pagamento como matéria-prima para posterior revenda;
2- Não transferiu o minério de ferro utilizado como dação em pagamento entre estabelecimentos do mesmo titular;
3- Não efetuou a venda do minério uma vez que ele foi utilizado como dação em pagamento.
Entende que não houve venda de minério, haja vista que a venda pressupõe a entrega de uma coisa e o recebimento da devida remuneração, tendo havido tão somente a dação em pagamento e o consequente direito da empresa exequente explorar as referidas toneladas, conforme consta do acordo homologado entre as partes.
Acrescenta que no referido acordo foi convencionado além da dação em pagamento das referidas toneladas, a cessão não onerosa por quatro meses de uma UTM completa para que a empresa mineradora exequente pudesse extrair, beneficiar, enfim efetuar todas as atividades necessárias para que pudesse comercializar as referidas toneladas recebidas como dação em pagamento.
Argumenta que houve tão somente um pagamento para a empresa exequente, na forma de dação em pagamento, para extinguir uma obrigação, qual seja, o título extrajudicial.
Relaciona diversas considerações e respeito da situação apresentada, argumentando que:
- a “dação em pagamento”, prevista nos arts. 356 a 359 do Código Civil/2002, é admitida como forma de adimplemento e extinção da obrigação, não pode ser confundida com o instituto da venda, uma vez que não havia contraprestação a receber por parte da empresa exequente e tão somente foi celebrado acordo cujo objeto jurídico era a extinção de um débito existente a partir de outro contrato diverso.
- a dação em pagamento foi utilizada como forma de solução da obrigação contratada, pois foi entregue para solver a obrigação, objeto diverso daquele inicial do contrato, sendo considerada nova obrigação ou obrigação autônoma;
- ofereceu como dação em pagamento as toneladas de minério, ficando determinado que todas as atividades inerentes à extração, beneficiamento e venda das referidas toneladas passaram a ser direito da empresa exequente, evidenciando-se que a entrega do direito de cessão do referido minério tem natureza jurídica de pagamento e não de venda de mercadorias;
- relativamente às toneladas de ferro utilizadas como dação em pagamento não efetuou a venda do mineral, não extraiu o minério e não realizou sua transferência entre estabelecimentos do mesmo titular em outra unidade da Federação ou no exterior.
- o conceito de fato gerador da TFRM indicado na Orientação Tributária DOLT/SUTRI Nº 001/2012;
- segundo consta nos incisos I e III do art. 97 do Código Tributário Nacional - CTN caberá à lei estabelecer a instituição de tributos, bem como a definição do fato gerador da obrigação tributária principal;
- o art. 4º, incisos I, II e III do Decreto nº 45.936, de 23/03/2012, elenca as hipóteses em que se considera ocorrido o fato gerador da TFRM;
- o parágrafo único do artigo 4º do Decreto nº 45.936/2012 estabelece que o fato gerador da TFRM ocorrerá uma única vez, devendo ser considerado, dentre os momentos especificados no caput, aquele que primeiro ocorrer, não estando enquadrada a situação apresentada em questão;
- não se pode usar a analogia em Direito Tributário com o único fundamento de fazer surgir fato gerador de tributo, haja vista que este adota o Princípio da Tipicidade Fechada, sendo obrigatório que todos os elementos do fato gerador do tributo estejam indicados com clareza na lei formal;
- o administrador público está adstrito ao princípio da legalidade, diante da necessidade de uma base legal que transforma a relação tributária em relação jurídica, retirando-a do campo do mero arbítrio;
- no caso de mera dação em pagamento das toneladas de minério, considerando que caberia a outra parte efetuar os procedimentos adequados para extração, beneficiamento e comercialização do minério, não houve o surgimento do fato gerador da TFRM, uma vez que a natureza da dação em pagamento efetuada não se relaciona com o fato gerador em questão;
- a própria empresa exequente já efetuou o recolhimento da TFRM quando da venda das referidas toneladas de minério de ferro recebidas como dação em pagamento, sendo que o fato gerador da referida taxa incide uma única vez;
- a dação em pagamento é originária de acordo homologado judicialmente no qual todo custo operacional decorrente da exploração do minério cedido correrá por conta e ordem da empresa mineradora exequente;
- em detrimento da Teoria da Tipicidade Fechada, não existe fato gerador da TFRM na simples dação em pagamento das toneladas de minério, uma vez que as atividades incursas no fato gerador do tributo seriam efetuadas pela empresa exequente e, via de regra, o referido tributo incide uma única vez devendo ser considerado o momento que primeiro ocorrer o fato gerador devidamente incurso na legislação mencionada alhures.
Com dúvida sobre a correta interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 - Está correto o entendimento de que o estado não pode fazer surgir a obrigação tributária, in casu, a incidência da TFRM, através do uso de analogia, uma vez que as hipóteses de incidência obrigatoriamente precisam ter previsão legal?
2 - Em decorrência do art. 4° do Decreto 45.936/2012, bem como o item “1” da Orientação Tributária DOLT/SUTRI Nº 001/2012, está correto o entendimento de que o instituto da “dação em pagamento” não está descrito no regramento estadual mineiro como fato gerador e hipótese de incidência tributária da TFRM?
3 - Considerando que a TFRM deverá ser calculada no momento em que ocorrer quaisquer das três hipóteses de incidência previstas na legislação, quer seja, na utilização do mineral ou minério como matéria-prima em processo de transformação industrial, na hipótese de a extração e a transformação ocorrerem em um mesmo estabelecimento localizado no Estado; na transferência do mineral ou minério extraído entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular, inclusive para o exterior; ou no momento da venda do mineral ou minério extraído, está correto o entendimento de não calcular a TFRM sobre a operação em destaque (dação em pagamento), uma vez que a dação em pagamento não está descrita nas supracitadas hipóteses?
4 - Está correto o entendimento de que o recolhimento da TFRM deverá ser efetuado exclusivamente por aquele que promover qualquer uma das hipóteses de incidência previstas na legislação mineira para a referida taxa, haja vista que esta incide uma única vez?
5 - Está correto o entendimento de que a mera dação em pagamento das toneladas do minério de ferro não pode ser considerado fato gerador do tributo, uma vez que caberia à empresa que recebeu a dação em pagamento a execução de todas as atividades inerentes à extração e beneficiamento do minério e por fim sua venda, levando-se em conta a incidência única da TFRM?
RESPOSTA:
Esclareça-se, a princípio, que o fato gerador da TFRM é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Estado sobre a atividade de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento dos recursos minerários realizadas no Estado, conforme previsto no art. 1º da Lei nº 19.976/2011.
Considera-se ocorrido o fato gerador da TFRM, dentre outros, no momento da venda do mineral ou minério extraído, nos termos do inciso III do art. 5º da citada Lei, regulamentado no inciso III do art. 4º do Decreto nº 45.936/2012.
Nos termos do art. 6º do referido Decreto nº 45.936/2012, o contribuinte da TFRM é a pessoa, física ou jurídica, que esteja, a qualquer título, autorizada a realizar pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de recursos minerários no Estado.
Cumpre ressaltar que, nos termos do art. 37 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008, o processo de consulta de contribuinte visa tão somente a aplicação da legislação tributária em relação a fatos de interesse do contribuinte, que será completa e exatamente descrito na petição, não cabendo nesse foro investigar a fidedignidade dos fatos apresentados.
Neste sentido, salienta-se que a Fiscalização trouxe informações em manifestação fiscal, acerca da argumentação e documentação apresentada pela Consulente, esclarecendo que:
- não consta indicação em documentos que a empresa exequente (empresa que recebeu em dação em pagamento em processo) exerceria a atividade de extração de minério, mas tão somente o seu beneficiamento;
- o minério encontra-se em pilhas, sugerindo que houve uma etapa anterior de lavra, pois a jazida de minério de ferro não se encontra na natureza em pilhas;
- a empresa exequente não possui mais as concessões minerais constituídas pelos alvarás de pesquisa de minério de ferro, não podendo fazer extração mineral previsto no § 1º do art. 176 da Constituição da República/1988 e legislação ambiental;
- a dação em pagamento refere-se a minério já extraído (minério fino e/ou lump); e
- ao contrário do afirmado pela Consulente, a empresa exequente nunca apresentou Declaração de Apuração da TFRM e nem recolheu tributos a título de taxa de fiscalização de recursos minerários.
Feitos estes esclarecimentos, passa-se a responder os questionamentos formulados.
1 a 3 - A princípio, importar salientar que as obrigações definidas entre as partes (exequente e executado) em processo de execução de título extrajudicial não alteram ou modificam as obrigações previstas na legislação tributária.
A dação em pagamento de mercadorias definida, conforme o caso, em processo extrajudicial deverá ocorrer com a respectiva transmissão da propriedade, a qual deverá ser formalizada, inclusive, por meio de documentos fiscais que acobertem a sua circulação.
Uma vez determinado o preço da coisa dada em pagamento, as relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e venda, nos termos do art. 357 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil/2002).
Dessa forma, não há que se falar em surgimento de obrigação tributária com emprego de analogia, uma vez que o fato gerador da TFRM ocorrerá, também, no momento da venda do mineral ou minério extraído pela Consulente, nos termos do inciso III do art. 4º do Decreto nº 45.936/2012, mesmo que essa venda decorra de dação em pagamento em cumprimento de decisão de processo de execução de título extrajudicial.
4 - Sim. Conforme previsto no caput, c/c o parágrafo único, ambos do art. 4º do Decreto nº 45.936/2012, o fato gerador da TFRM ocorrerá uma única vez, devendo ser considerado, aquele que primeiro ocorrer, dentre os momentos nele especificados.
Consoante o disposto no art. 6º do referido Decreto, o contribuinte da TFRM é a pessoa, física ou jurídica, que esteja, a qualquer título, autorizada a realizar pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de recursos minerários no Estado.
Vale frisar que tanto o fato gerador da TFRM quanto a condição de contribuinte desse tributo decorre da verdade material dos fatos.
5 - A dação em pagamento de mercadorias (por exemplo, minério de ferro) calcada na satisfação de decisões processuais ocasionará a incidência da TFRM por ocasião da venda do mineral ou minério extraído, assim considerada a ocasião em que houver a transferência de sua propriedade.
Tratando-se de dação em pagamento que não envolva venda de mercadorias, como é o caso daquela relacionada com a transmissão dos direitos aos exercícios das atividades de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento dos recursos minerários, ocorrerá sem incidência da TFRM, uma vez que esta operação não se enquadra em nenhuma das situações previstas no art. 4º do Decreto nº 45.936/2012.
Na hipótese de a Consulente ter efetuado procedimentos em desacordo com o exposto, poderá, mediante denúncia espontânea, procurar a repartição fazendária de sua circunscrição para comunicar falha ou sanar irregularidade quanto à emissão e escrituração de documentos fiscais, observado o disposto no Capítulo XV do RPTA.
Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 3 de dezembro de 2020.
Jorge Odecio Bertolin |
Kalil Said de Souza Jabour |
Ricardo Wagner Lucas Cardos
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação