Consulta de Contribuinte SEFAZ nº 63 DE 29/05/1997
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 29 mai 1997
PREPARAÇÃO DE REFEIÇÕES
PREPARAÇÃO DE REFEIÇÕES - Atividade sujeita ao ICMS, ainda que o preparo e o fornecimento ocorram no próprio estabelecimento do contribuinte (Art. 5º § 1º, item 1, e Art.6º, VIII, da Lei 6.763/75).
EXPOSIÇÃO E CONSULTA:
Segundo informam, a primeira consulente é empresa tradicional, tendo estabelecimento filial em Belo Horizonte/MG, com as seguintes atividades operacionais:
a) prestação de serviços de administração de bens e negócios de terceiros, especialmente restaurantes industriais, com o fornecimento de mão-de-obra (através de empregados seus) para o perfeito funcionamento dos restaurantes;
b) fornecimento de alimentação e bebidas em restaurantes industriais (refeições prontas);
c) administração de vale-refeição/alimentação, na forma do programa de alimentação do trabalhador.
Já a segunda consulente é empresa ligada à primeira, e possui como atividade operacional a compra e venda de mercadorias, gêneros alimentícios ou não, importados ou não, em nome próprio e por conta e ordem de terceiros.
Relatam que esta última foi desmembrada da primeira, tendo como objeto social a específica atividade de compra e venda de mercadorias para as empresas que a contratam, na condição de fornecedor exclusivo, ou não. Assim, ela especializou-se como forcecedora de gêneros alimentícios in natura, bebidas e outros materiais a empresas para servirem ao preparo de refeições destinadas a serem consumidas pelos empregados e dirigentes do comprador das mercadorias.
As consulentes formalizam com seus clientes os seguintes contratos:
- pela primeira consulente: "Gestão Integrada - GIN Contrato de Prestação de Serviços";
- pela segunda consulente: "Gestão Integrada - GIN Contratos de Compra e Abastecimento".
Segundo elas os preços cobrados são fixados da seguinte forma:
"1 - A primeira consulente, como remuneração pelo serviço prestado, fixa o preço da administração dos bens de terceiros e locação de mão-de-obra através de um percentual sobre o custo da mão-de-obra locada (salários, encargos sociais e trabalhistas, etc.) e sobre o custo de aquisição, pelo tomador dos serviços, das mercadorias utilizadas para o preparo e distribuição das refeições;
2 - A segunda consulente, como fornecedora de mercadorias, fixa como preço destas o valor de aquisição acrescidos de um percentual (margem de lucro fixa)."
Afirmam que a atividade da primeira consulente estaria enquadrada no item 43 da Lista de Serviços, "Administração de bens e negócios de terceiros e de consórcio", bem como no item 84, "Recrutamento, agenciamento, seleção, colocação ou forneci-mento de mão-de-obra, mesmo em caráter temporário, inclusi-ve por empregados do prestador do serviço ou por trabalhadores avulsos por ele contratados".
Após a exposição dos fatos as consulentes asseveram o seguinte entendimento:
"a) não se confundem as atividades da primeira e da segunda consulentes nos contratos anexados à presente, constituindo operações distintas e separadas, de prestação de serviços previstos na Lista anexa à Lei Complementar nº 56/87 e da venda de mercadorias sem qualquer processo de aperfeiçoamento ou industrialização;
b) incide exclusivamente o ICMS sobre o total das vendas da segunda consulente, tendo como base de cálculo e alíquota aquelas previstas na legislação vigente para cada mercadoria vendida; e
c) incide exclusivamente o ISSQN sobre a receita bruta advinda da prestação dos serviços prestados pela primeira consulente, imposto que será recolhido no Município em que estiver situado cada estabelecimento, como expressa a legislação vigente."
Assim, em conformidade com o entendimento exposto, ressalta que a segunda consulente vem recolhendo exclusivamente o ICMS, ao passo que a primeira consulente recolhe somente o ISSQN.
Ao final questionam a esta Diretoria se o entendimento externado acima está correto.
RESPOSTA:
O entendimento manifestado pelas consulentes, no que concerne aos procedimentos adotados pela primeira consulente, não encontra respaldo na legislação tributária vigente, face às seguintes razões e fundamentos:
A Constituição Federal de 1988 atribuiu aos Municípios a com-petência para instituir impostos sobre serviços de qualquer natureza , desde que não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar (artigo 156, III).
Entretanto, desde o advento do Decreto-lei nº 406/68, optou-se por elaborar uma lista de atividades, chamada Lista de Serviços, sujeita à incidência do tributo municipal.
O fato gerador do imposto foi assim definido pelo artigo 8º do referido Decreto-lei:
"Art. 8º - O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a presta-ção, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa."
Assim, os municípios tiveram sua imposição tributária vinculada às atividades previstas na Lista, sendo impedidos de estender a tributação a qualquer espécie de prestação de serviços.
Nesse sentido o mestre Gilberto de Ulhôa Canto escreve (in Direito Tributário - Pareceres. 1a. ed., RJ, Forense Universitária, 1992.):
"A jurisprudência do STF firmou-se pela taxatividade da Lista, embora tenha ressalvado a possibilidade de os enunciados dos seus itens comportarem interpretação extensiva, para abrangerem, como hipóteses de incidência, situações que, embora neles não referidas de modo expresso, neles se contenham por expressão lógica."
Então, diante da compreensão lógica desse contexto, para que a atividade da primeira consulente seja alcançada simplesmente pela tributação do ISSQN, impreterivelmente, há que se ter o seu enquadramento em algum dos itens da Lista de Serviços.
Explicitamente, não se encontra na referida lista o enquadramento da atividade em qualquer um de seus itens.
Entretanto, as consulentes alegam que o item 43, como também o 84, abrange aquela atividade.
Dos itens alegados constam os seguintes serviços:"...
43 - Administração de bens e negócios de terceiros e de consórcio....
84 - Recrutamento, agenciamento, seleção, colocação ou forneci-mento de mão-de-obra, mesmo em caráter temporário, inclusive por empregados do prestador do serviço ou por trabalhadores avulsos por ele contratados...."
Em exegese dos citados dispositivos, Bernardo Ribeiro de Moraes (in Doutrina e Prática do Imposto Sobre Serviços. 1a. ed., SP, Ed. Revista dos Tribunais, 1984.), autor também citado pelas consulentes, afirma:
- em relação ao item 43:
"Administrar quer dizer gerir, governar, dirigir. Serviços de administração são os relacionados com a gestão de interesses de alguém. Quem administra para terceiros presta serviços através de vários atos concretos e executórios, para a consecução direta de um fim. Na administração encontramos a coordenação, supervisão e controle de trabalhos, com o fim de produzir um resultado."
- em relação ao item 84:
"As três atividades citadas (recrutamento, colocação ou fornecimento) estão ligadas à mão-de-obra, isto é, ao trabalho manual. Abrangem os serviços prestados pelas empresas de recrutamento, seleção e orientação do pessoal, ou pelos escritórios remunerados de empregos. Todos agem como intermediário entre os empregadores e os trabalhadores, em questões de mão-de-obra."
Na análise dos conceitos doutrinários verifica-se a absoluta impossibilidade de enquadramento da atividade exercida pela primeira consulente em algum dos itens acima.
A preparação de refeições é atividade bem diversa da atividade administrativa, que se faz presente em qualquer empreendimento e não se confunde com a atividade produtiva e com o seu resultado, nem tampouco com o tratamento tributário dado a este.
Já em relação ao item 84, constata-se, sem qualquer esforço de interpretação, que as consulentes se dedicam a atividades completamente diversas daquelas ali relacionadas.
Assim, estando verificada a impossibilidade de tributação de qualquer das atividades exercidas pelas consulentes pelo ISSQN, não restando também qualquer dúvida sobre a tributação da atividade exercida pela segunda consulente pelo ICMS, passaremos à análise da atividade da primeira consulente à luz da legislação tributária concernente a este imposto.
Segundo disposição constitucional (Art. 155, II, CF/88) coube aos Estados e ao Distrito Federal a atribuição de competência para instituir imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e de comunicação.
Na acepção de "circulação de mercadorias" encontramos os seguintes aspectos a serem observados para compreensão das hipóteses de incidência tributária: o da circulação física, o da circulação jurídica e o da circulação econômica.
Sobre este último aspecto assim lecionam Maria Lúcia e José Cassiano (in O ICMS ao alcance de todos. 2a. ed., RJ, Forense, 1992):
"Circulação econômica: é a movimentação da mercadoria desde a fase da produção até o consumo. Essa movimentação econômica da mercadoria constitui o próprio eixo da hipótese de incidência do ICMS."
Constata-se, então, que o ICMS alcança a mercadoria em suas diversas fases de circulação, ainda que haja transformação em sua constituição originária, através de processo de industrialização.
Para averiguação da caracterização desse processo o RICMS/96 preceitua:
"Art. 222 - Para os efeitos de aplicação da legislação do imposto:...
II - industrialização é qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo, observado o disposto nos §§ 1º e 2º , tais como:
a - a que exercida sobre matéria-prima ou produto intermediário, importe em obtenção de espécie nova (transformação);..."
Diante desses significativos conceituais conclui-se que a atividade exercida pela primeira consulente enquadra-se no conceito de industrialização quando, utilizando-se de gêneros alimentícios (matéria prima) e do processo de transformação, obtém espécie nova, refeições, que são fornecidas aos empregados das empresas dela contratantes.
Essa atividade, por sua vez, conforma-se perfeitamente à hipótese de incidência do ICMS prevista no inciso primeiro do artigo segundo da Lei Complementar nº 87/96 que, da seguinte forma, se manifesta:
"Art. 2º - O imposto incide sobre:
I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;..."
Também em relação ao momento de ocorrência do fato gerador a Lei Complementar nº 87/96 é bastante clara:
"Art. 12 - Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:...
II - do fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias por qualquer estabelecimento;..."
Disposições idênticas, oriundas dos preceitos acima externados, encontramos na Lei 6763/75, Art. 5º, § 1º, item 1, e Art. 6º, VIII, e, também, no RICMS/96, Art. 1º, I, e Art. 2º, VIII.
Para tramelar o conjunto de normas que se aplicam à matéria o Anexo XXII, do RICMS/96, que define o Código de Atividade Econômica (CAE ), cujo objetivo é classificar e codificar a principal atividade econômica do contribuinte, traz no gênero indústria de produtos alimentares (cód. 26), o grupo preparação de refeições industriais e alimentos conservados, congelados ou não (cód. 26.8.1), e o subgrupo produção de refeições preparadas industrialmente no estabelecimento, por firma especializada, para consumo nos locais de fabricação (CAE 26.8.1.30-7).
Por seu turno, a jurisprudência já firmou entendimento que acolhe a incidência do ICMS nessas atividades, o que se pode inferir da seguinte decisão do Supremo Tribunal Federal, publicada no "Diário da Justiça da União" em 27.09.96:
"Recurso Extraordinário nº 176.969-6 - MG
Rel. Min. Moreira Alves
ICMS. Fornecimento de alimentos e bebidas consumidas no próprio estabelecimento do contribuinte. Lei 6763/75 do Estado de Minas Gerais.
Esta Corte já firmou o entendimento de que, havendo Lei estadual que estabeleça como fato gerador do ICMS o fornecimento de alimentos e de bebidas consumidas no próprio estabelecimento do contribuinte, bem como sua base de cálculo, esse tributo foi legitimamente instituído.
Ora, no caso, é o que ocorre, porquanto a Lei 6763/75 do Estado de Minas Gerais preencheu esses requisitos, como se vê do disposto em seus artigos 5º, III, e 13, VI.
Recurso extraordinário conhecido e provido."
É de se observar que, em relação aos dispositivos citados na re-ferida decisão, a Lei 6763/75 ainda estava sob a égide do Convênio ICM 66/88, que fixou, provisoriamente, normas para regular o ICMS.
Finalizando, na conclusão de que tanto a atividade da segunda consulente como também a da primeira são alcançadas pela incidência do ICMS, queremos lembrá-las de que o tributo, considerado devido, deverá ser recolhido, com os acréscimos pertinentes, dentro de 15(quinze) dias, contados da data em que as consulentes tiverem ciência da resposta, atendendo o preceito estatuído pelo § 3º , do artigo 21, da CLTA/MG, aprovada pelo Decreto nº 23.780/84.
DOT/DLT/SRE, 29 de maio de 1997.
Luiz Geraldo de Oliveira - Assessor
Sara Costa Felix Teixeira - Coordenadora da Divisão