Declaração de Ineficácia de Consulta COTRI nº 10 DE 07/04/2017

Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 12 abr 2017

PROCESSO Nº: 0125-000875/2016

ICMS. Princípio da não cumulatividade. 1- Apropriação de crédito. Combustíveis utilizados no processo fabril. Gás Liquefeito de Petróleo - GLP. Não se enquadra no conceito de matéria-prima se não se agregar direta ou indiretamente ao produto final. Crédito vedado. 2- Apropriação do crédito na entrada de mercadorias destinadas a uso ou consumo. Possibilidade: efeitos para entradas ocorridas a partir de 1º de janeiro de 2020, salvo alteração futura.

I - Relatório

1. Pessoa jurídica de direito privado, estabelecida no Distrito Federal, que exerce atividade no ramo de fabricação de produtos farmoquímicos e de medicamentos para uso humano, formula Consulta em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Sobre a Prestação de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, regulamentado pelo Decreto 18.955, de 22 de dezembro de 1997 - Regulamento do ICMS - RICMS/DF.

2. Em linhas gerais, o Consulente relata que adquire, a granel, Gás Liquefeito de Petróleo - GLP e emprega essa mercadoria na produção de diversos produtos relacionados à sua respectiva área de atuação.

3. Entende o Consulente que o gás (GLP) adquirido e utilizado diretamente no processo fabril enquadra-se como matéria-prima e, em decorrência disso, geraria direito ao crédito do imposto.

4. Fundamenta sua convicção basicamente no princípio da não cumulatividade, citando diversos artigos da legislação tributária, tendo como ponto de partida o Item I do parágrafo 2º do Art. 155 da Carta Magna, além de doutrina e jurisprudência.

5. Por outro lado, relata o consulente que nem todo gás (GLP) por ele adquirido é utilizado diretamente no processo industrial.

6. Aponta que uma parcela de GLP é utilizada no restaurante e, por conseguinte, não faria parte dos insumos aplicados no processo de industrialização de seus produtos.

7. Relata que aplica um método de rateio dos valores relativos à aquisição com GLP, atribuindo parte dessa despesa ao restaurante. Pretende com isso excluir do montante de seus créditos do ICMS o valor relativo ao consumo dessa mercadoria por esse setor.

8. Ao final, apresenta os seguintes questionamentos:

1. A consulente possui direito aos créditos de ICMS sobre as aquisições de GLP - Gás Liquefeito de Petróleo adquiridos com desta que do imposto e utilizados diretamente na fabricação de fármacos e medicamentos também tributados destinados à venda interna e interestadual?

2. Ainda sim, em sendo positiva a resposta acima,a Consulente possui a opção de proceder ao creditamento destes valores realizado o rateio da parte utilizada em seu refeitório interno para fins de exclusão do GLP não utilizado no processo produtivo, nos temos do cálculo apresentado ou outra forma que entenda esta D. consultoria?

II - Análise

9. Trata a presente consulta de questionamentos sobre direito a crédito de ICMS sobre aquisição de GLP, que é utilizado preponderantemente em processo industrial, mas empregado, em parte, no preparo de refeições no restaurante da própria empresa.

10. Preliminarmente é preciso verificar o que pode ser considerado como matéria-prima, sendo aqui necessário apontar se o GLP, espécie do gênero combustível, pode enquadrar-se nessa categoria.

11. É imprescindível distinguir se o combustível GLP é matéria-prima agregada ao processo produtivo ou se, por não sofrer ou não provocar ação direta mediante contato físico com o produto, não o seria.

12. Ocorre que, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça - STJ adentrou no mérito quanto a considerar ou não os combustíveis como matéria-prima em processo de fabricação de produtos, conforme jurisprudência abaixo:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.CAUSA EM QUE SE DISCUTE O CRÉDITO PRESUMIDO DO IPI, COMO RESSARCIMENTO DO PIS/PASEP E COFINS, DE QUE TRATA A LEI 9.363/1996. EMPRESA PRODUTORA E EXPORTADORA DE SUCO DE LARANJA CONCENTRADO E CONGELADO. VALORES DOS COMBUSTÍVEIS UTILIZADOS NAS CALDEIRAS E DOS REAGENTES QUÍMICOS DE LIMPEZA. CREDITAMENTO.IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL FIRMADA POR ESTA CORTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

I - Agravo interno interposto em 24.06.2016, contra decisão publicada em 22/06/2016, que, por sua vez, julgara recurso interposto contra decisão que inadmitira o Recurso Especial, publicada na vigência do CPC/73.

II - Na forma da jurisprudência deste Tribunal, "para a aplicação do entendimento previsto na Súmula 83/STJ, basta que o acórdão recorrido esteja de acordo com a orientação jurisprudencial firmada por esta Corte, sendo prescindível a consolidação do entendimento em enunciado sumular ou a sujeição da matéria à sistemática dos recursos repetitivos" (STJ, AgR. no REsp 1.447.734/SE, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 17.06.2015). No mesmo sentido: STJ,AgRgnoREsp1.337.910/ES, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS,SEGUNDA TURMA,DJe de 25.10.2012; AgRg no REsp 1.318.139/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 03.09.2012.

III - A Primeira Turma desta Corte, ao julgar o REsp 529.577/RS, deixouassentado que "o art. 1º da Lei 9.363/96 disciplina o reconhecimento do direito ao ressarcimento do crédito presumido do IPI somente em relação às mercadorias agregadas em processo produtivo a produto final destinado à exportação. A desoneração da carga tributária, como benefício fiscal, e em exceção à regra geral que é a incidência dos tributos que gerarão o crédito presumido, deve ser interpretada nos exatos termos da previsão legal, sem ampliação ou redução de seu alcance" (STJ, REsp 529.577/RS, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJU de 14.03.2005).

VI - No mesmo sentido a Segunda Turma do STJ, a partir do julgamento do REsp 1.049.305/PR (Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 31.03.2011), firmou o entendimento de que "a energia elétrica, o gás natural, os lubrificantes e o óleo diesel (combustíveis em geral) consumidos no processo produtivo, por não sofrerem ou provocarem ação direta mediante contato físico com o produto, não integram o conceito de 'matériasprimas' ou 'produtos intermediários' para efeito da legislação do IPI e, por conseguinte, para efeito da obtenção do crédito presumido de IPI, como ressarcimento das contribuições ao PIS/PASEP e à COFINS, na forma do art. 1º da Lei 9.363/96". No mesmo sentido: STJ, AgRg no REsp 1.222.847/PR, Rel.Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/04/2011; REsp 816.496/AL, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/06/2012; REsp 1.331.033/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 09/04/2013; AgRg no AREsp 843.844/SP, Rel.Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 27/05/2016; AgRg no REsp 1.493.176/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 02.02.2016.

V - Nos presentes autos, consta da sentença que, "considerando que somente há o direito de creditamento do IPI pago anteriormente quando se tratar de insumos que se incorporam ao produto final ou que são consumidos no curso do processo de industrialização, de forma imediata e integral, não há que se falar em crédito no caso em exame. In casu, os combustíveis utilizados nas caldeiras e os reagentes químicos de limpeza não se enquadram em tal definição, posto não se agregarem, direta ou indiretamente, ao produto final".

No acórdão recorrido, ao confirmar a sentença, o Tribunal de origem deixou consignado que, "in casu, tanto os combustíveis como os reagentes químicos não são adquiridos com a exclusiva finalidade de elaborar o produto final, não sendo considerados, portanto, matéria-prima ou produto intermediário submetido à transformação".

VI - Portanto, ao decidir pela impossibilidade de inclusão dos valores relativos aos combustíveis utilizados nas caldeiras e aos reagentes químicos de limpeza, dentre os insumos que integram a base de cálculo do crédito presumido do IPI, o acórdão do Tribunal de origem alinhou-se à jurisprudência do STJ sobre o tema, pelo que incide, na espécie, a Súmula 83/STJ. Impende salientar que a orientação firmada nos supracitados precedentes do STJ, no sentido da impossibilidade de creditamento dos valores relativos aos combustíveis, aplica-se, pelas mesmas razões, aos reagentes químicos de limpeza.

VII - Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp 908.161/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 04.11.2016).

13. Diante desse posicionamento restou claro que mercadoria adquirida pela indústria somente será considerada matéria-prima do processo fabril se houver incorporação ao produto final.

14. Assim, de acordo com a jurisprudência citada, se o STJ não considera, para fins de IPI, os combustíveis usados no processo produtivo como matéria-prima, então, aqui, pelos mesmos fundamentos, não poderão ser considerados para fins de crédito do ICMS.

15. Na situação apresentada não ocorre incorporação da mercadoria GLP ao produto final, embora haja consumo dessa espécie de combustível no processo produtivo.

16. Nesse contexto o próximo passo consiste em verificar aquilo que dispõe a legislação sobre créditos de ICMS.

17. De fato, o Item I do parágrafo 2º do Art. 155, da Carta Magna prevê a aplicação do princípio da não cumulatividade para o ICMS:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(.....)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;

(.....)

XII - cabe à lei complementar:

(.....)

c) disciplinar o regime de compensação do imposto;

18. No entanto, como esse mesmo diploma legal determinou, conforme acima transcrito, que Lei Complementar Federal disciplinasse normas gerais para esse imposto, foi editada a Lei Complementar nº 87 de 13 de setembro de 1996 que dispõe:

Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.

19. Ao que consta, existe a possibilidade de aproveitar esse crédito quando a mercadoria adquirida for destinada a consumo do estabelecimento, desde que a entrada não seja alheia à atividade do estabelecimento, nem se trate de operação isenta ou não tributada.

20. Cabe salientar que o exercício de tal direito somente será admitido para 21. Nesse mesmo sentido a Lei Distrital nº 1.254 de 8 de novembro de 1996 prevê:

Art. 31. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, com o montante cobrado nas anteriores, pelo Distrito Federal ou por outra unidade federada.

Art. 32. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada, real ou simbólica, de bem ou mercadoria no estabelecimento, inclusive se destinados ao seu uso, consumo ou ativo permanente, ou o recebimento de serviço de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

(.....)

Art. 79. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de:

(.....)

V - 1º de janeiro de 2020:

(.....)

b) o crédito fiscal relativo à entrada dos demais bens destinados ao uso ou consumo do estabelecimento, a que se refere o art. 32.

22. Finalmente quanto à forma de rateio dos custos de GPL restou prejudicada a análise do questionamento, tendo em vista que essa mercadoria não pode ser considerada, para fins de ICMS, como matéria-prima.

III - Resposta

23. Oferecendo resposta às indagações do Consulente, informa-se:

1. Não é permitido o aproveitamento de crédito de ICMS na aquisição de GLP, pelo fato dessa mercadoria não ser considerada matéria-prima a ser utilizada no processo industrial do Consulente. No entanto, para entradas ocorridas a partir de 1º de Janeiro de 2.020, por ora há previsão da possibilidade de creditar-se do valor do imposto relativo à aquisição de mercadorias destinadas a uso ou consumo no estabelecimento, observadas as regras da Lei nº 1.1254/1996, especialmente os artigos 31, 32 e 79.

2. Prejudicada.

24. A presente Consulta é ineficaz, nos termos do disposto na alínea a do inciso I do art. 77 do Decreto nº 33.269, de 18 de outubro de 2011, observando-se o disposto nos §§ 2º e 4º do art. 77, bem como no parágrafo único do art. 82, do mesmo diploma legal.

À consideração da Assessoria de Tributação da COTRI.

Brasília/DF, 7 de abril de 2017.

GERALDO MARCELO SOUSA

Auditor Fiscal da Receita do Distrito Federal

À Coordenadora de Tributação da COTRI

Encaminhamos à aprovação desta Coordenação o Parecer Supra.

Brasília/DF, 7 de abril de 2017.

ANTÔNIO BARBOSA JÚNIOR

Coordenação de Tributação

Assessor

Aprovo o Parecer supra e assim decido, nos termos do que dispõe a alínea a do inciso I do art. 1º da Ordem de Serviço nº 86, de 4 de dezembro de 2015 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 233, de 7 de dezembro de 2015).

Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565, de 25 de junho de 2014.

Brasília/DF, 7 de abril de 2017.

MÁRCIA WANZOFF ROBALINHO CAVALCANTI

Coordenação de Tributação

Coordenadora