Despacho FUNAI nº 84 de 25/10/2007
Norma Federal
Aprova as conclusões objeto do citado resumo para afinal, reconhecer os estudos de identificação da Terra Indígena BACURIZINHO de ocupação do grupo tribal Tenetehara-Guajajara, localizada no município de Grajau, Estado do Maranhão.
O PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI, tendo em vista o que consta no Processo FUNAI/BSB/0764/1992, e considerando o Resumo do Relatório de Identificação, de autoria da antropóloga LESLYE BOMBONATTO URSINI que acolhe, face as razões e justificativas apresentadas, decide:
1 . Aprovar as conclusões objeto do citado resumo para afinal, reconhecer os estudos de identificação da Terra Indígena BACURIZINHO de ocupação do grupo tribal Tenetehara-Guajajara, localizada no município de Grajau, Estado do Maranhão.
2 . Determinar a publicação no Diário Oficial da União e Diário Oficial do Estado do Maranhão, do Resumo do Relatório Circunstanciado, Memorial Descritivo, Mapa e Despacho, na conformidade do § 7º do art. 2º do Decreto nº 1.775/1996 .
3 . Determinar que a publicação referida no item acima, seja afixada na sede da Prefeitura Municipal da situação do imóvel.
MÁRCIO AUGUSTO FREITAS DE MEIRA
ANEXORESUMO DO RELATÓRIO CIRCUNSTANCIADO DE IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA TERRA INDÍGENA BACURIZINHO
Referência: Processo Funai; BSB nº 0764/1992 - Identificação e Delimitação. Terra Indígena: Bacurizinho. Superfície aproximada: 134.040ha. Perímetro: 202km. Localização: Município de Grajaú, Estado do Maranhão. Sociedade Indígena: - Tenetehara-Guajajara. Família Lingüística: Tupi. População: 3.663 hab. (2003). Identificação e Delimitação: Grupo Técnico constituído pelas Portarias nº 725/PRES de 30.08.2001, DOU 31.08.2001; nº 746/PRES de 14.09.2001, DOU 17.09.2001; nº 725/PRES de 30.08.2001, DOU 31.08.2001; nº 890/PRES de 31.10.2001, DOU 05.11.2001; nº 940/PRES de 19.11.2001, DOU 20.11.2001; nº 168/PRES de 04.03.2002, DOU 06.03.2002; e coordenado pela antropóloga Leslye Bombonatto Ursini.
1 - DADOS GERAIS - O povo Tenetehara assim se autodefine, porém Guajajara ou Tembé, a depender da localização, é denominação adquirida; as línguas faladas são o Português e o Tenetehara.
A colonização no Maranhão teve início em 1612 por obra dos franceses para, três anos depois, serem secundados pelos portugueses que empreenderam a escravidão dos índios do litoral do Maranhão e de outras etnias que habitavam o interior do estado (Fernandes, F. A Organização Social dos Tupinambá. Brasília. São Paulo: UnB. Hucitec. 1989, p. 58). Os missionários registraram em 1613 a presença Tenetehara às margens do rio Pindaré, onde existia uma grande nação (Gomes, Mércio. P. O Índio na História. O povo Tenetehara em busca da liberdade. RJ: Vozes. 2002. passim). A estimativa é de três mil índios compondo a nação Tenetehara antes do contato com os portugueses, os quais dizimaram boa parte da população antes dos jesuítas fazê-lo. Os jesuítas foram expulsos do Brasil em 1759, frustrados nos seus intentos de conversão dos Teneteharas, como avalia em 1733 o Pe. A. Mazzolani (Zannoni, C. Conflito e Coesão. O dinamismo Tenetehara. Brasília: CIMI. 1999, p. 43). Dentro da política colonial passou-se a cultivar o algodão no Maranhão, para o que foi constituída a Companhia Geral do Grão Pará e Maranhão em 1755 e africanos foram trazidos para trabalharem como escravos (Zannoni, 1999, p.44). Permaneceram os descimentos dos índios capturados e as guerras contra os índios não pacificados. Os índios - de diversas etnias - continuaram sendo transferidos para aldeamentos organizados para a produção agrícola. Por outro lado, os indígenas não cessaram de retornarem fugidos para as matas. Desde os 1700 até o início do século XIX, deu-se a expansão dos Teneteharas pelo sertão maranhense (região de chapada), seguiram do alto do rio Pindaré para as suas porções geofísicas média e baixa, para o rio Gurupi, e nos sertões cortados pelos rios Mearim e Grajaú, sendo que nesta última porção - na região desses dois rios - os Teneteharas entraram em confronto com os Timbiras, que já se encontravam ocupando aquela área (Zannoni, 1999, p.44). Os Teneteharas também são registrados no século XVII ocupando mais de trinta aldeamentos nos rios Pindaré e Mearim nas suas porções Alta, Média e Baixa (Diniz, E. S. Os Tenetehara-Guajajara e a Sociedade Nacional. Avaliação das relações intersocietárias. São Paulo: Unesp. 1988, p.4)
No Mapa Manuscrito do Maranhão, 1856, o engenheiro Saint Amand traçou o riacho dos Ovos "entrando no Mearim um pouco acima de onde está localizada a aldeia ribeirinha tenetehara (...) a aldeia na beira do Mearim daqueles primeiros anos tinha o nome de Coati; a outra, localizada mais no centro da mata ficou conhecida como Lagoa do Caboclo" (Gomes 2002:391/2). Em 1873, para cuidar dos índios locais, foi criada a Diretoria Parcial na aldeia Bananal (Velho), na margem esquerda do riacho Enjeitado (Gomes, 2002, p.262-3), praticamente onde a aldeia Bananal (nova) está localizada hoje.
A TI. Bacurizinho foi ocupada em entremeio aos fluxos migratórios dos Teneteharas originados na região dos rios Gurupi, Pindaré, Carú e Zutiua, os quais subiram o rio Grajaú (antes de 1820) até o local em que está o município homônimo. Outro foi o fluxo de Teneteharas que subiram o rio Buriticupu, atravessaram a Serra Negra para atingir a cabeceira do rio Mearim ao "S" da TI. Bacurizinho, e também atingiram este rio pela sua margem esquerda, por meio do riacho dos Ovos e por meio da Chapada grajauense (antes de 1850). Os descimentos pelo rio Mearim estão na memória tenetehara para descrever o processo de "empurração" sofrido: Felipe (Segundo Cacique da aldeia Cocal Grande) - "Então esses índios quando chegaram na cachoeira do Morcego, o índio chamava na linguagem: anirá imãn. Lá que era antigamente a aldeia, depois que se mudaram para Nazaré. O branco vinha vindo atrás, no Nazaré chegou também esse Barros e foi indo agradando, matando gado, agradando ele pra poder amansar [o índio]. Aí pegou os vaqueiro, o vaqueiro dizia: 'Ô rapaz, o lugar é bom, heim? Aqui pra criar gado.' Aí vieram, pediu pra mudar de lá, diz que dava rês pra eles comerem (...). Lá era aldeia grande. Fizeram outra aldeia ali no chamado Escondido. De lá veio de novo, vindo, aí se mudaram mais pra cá, ali no Cocalinho, de lá que se mudaram pra cá e de novo atrás."
As aldeias da TI. Bacurizinho foram temporariamente desarticuladas no período em que as crianças tenetehara eram levadas de seus pais pelos padres, o que resultou na Revolta de Alto Alegre, em 1901, em que índios, não apenas Teneteharas, mataram os padres. O ataque foi uma insurreição contra a prática dos padres de levarem as crianças para o internato e também contra as punições aplicadas àqueles que praticavam a poligamia (Diniz, 1988, p.17). Felipe (Tenetehara-Guajajara) - "Pegava o meninozinho que mama e será que uma pessoa dessa [criança pequena] pode estudar? Mas levava assim mesmo."/Leslye (antropóloga) - "Algum desses meninos que foram levados pra estudar voltou?"/Felipe - "Nenhum."/Felipe - "Eles botavam os índios pra dançar, todo dia de tarde, de noite."/Zequinha (Tenetehara-Guajajara)- "Pegava de todo o canto, né?, do Bananal, do Bacurizinho, da Mangueira também carregava muito. Isso aqui tudinho, fizeram uma morada bem aqui na encruzilhada tinha uma morada [aldeia antiga]." Depois de cinco anos as aldeias estavam novamente articuladas, mas muitos dos Teneteharas que não morreram naquela ocasião deixaram de vez a região e seguiram em direção ao atual estado de Tocantins. Antes, em 1890, "havia 496 Tenetehara, número que cairia com a Rebelião de Alto Alegre" e que só em 1940 o crescimento populacional seria retomado (Gomes, 2002, p.262-3).
Na década de 1970, houve disputas pela posse de terras nas áreas de abrangência dos Postos Indígenas Pindaré, Bacurizinho e Angico Torto, pois as áreas ocupadas pelos índios eram invadidas e "reclamadas judicialmente por fazendeiros que desejavam instalar grandes projetos agro-pecuários na região" (Diniz, 1988, p.5). Nesse ensejo a TI. Bacurizinho foi demarcada, em 1979, numa delimitação que privou os Tenetehara-Guajajaras principalmente do acesso aos três cursos d’água perenes: o rio Mearim ao Norte ("N") e ao Sul ("S") da terra indígena, em sua margem direita; o riacho Enjeitado ao "S" e uma pequena parcela ao "N", margem esquerda; e o riacho Piranhas ao "S", ambas as margens. A razão dos Tenetehara-Guajajaras reivindicarem a identificação da TI. Bacurizinho é a de que as tentativas e planos de demarcação anteriores (1942 e 1957, SPI - Serviço de Proteção ao Índio) que resultaram na demarcação de 1979, segundo os Tenetehara-Guajajaras, foram frutos de negociações que mais serviram para atender os interesses dos não-índios, inclusive de ex-servidores do SPI (Gomes, 2002, p.394), e não tiveram o propósito de reconhecer a terra indígena ocupada efetivamente pelos Tenetehara-Guajajaras.
2 - HABITAÇÃO PERMANENTE - O censo populacional da Funasa (2001) contou 2.069 índios na TI. Bacurizinho, os quais habitam de forma permanente 21 aldeias cadastradas. O Grupo Técnico (GT), diferentemente da Funasa, contou 36 aldeias, e embora haja um fluxo de moradores entre as aldeias (para visitar parentes, cuidar das roças ou para estar mais perto dos cursos d’água) a estimativa é que a população fosse maior, hoje são 3.663 índios (Funasa/2003).
Os locais de habitação permanente são as aldeias, e nelas são construídas casas de estrutura de madeira, com barro, cobertas com palha (de buriti, principalmente, por vezes usam madeiras - os cavacos - para cobrir em vez da palha) e chão de terra aplainada, não raro, gerações se sucedem na mesma casa. Dada a escassez da palha na terra indígena, algumas casas hoje são cobertas com telhas conseguidas por meio de projetos da associação indígena. As habitações temporárias são precárias, construídas apenas para servir de abrigo quando os Tenetehara-Guajajaras se distanciam das aldeias para as atividades de caça e de coleta.
A área da TI. Bacurizinho resultante da demarcação de 1979 tem como limites uma linha seca ao "N" e outra ao "S", a margem esquerda do riacho Enjeitado ao Leste ("L") e a margem direita do rio Mearim ao Oeste ("O"), formando um retângulo em que os cursos d’água, hoje, estejam nas laterais de menor extensão desse retângulo (a "L" e a "O"). As aldeias distribuem-se em sua maior parte nesse espaço entre aquelas que margeiam esses cursos d’água e aquelas que ficam na parte interna da terra indígena demarcada em 1979, onde há grandes as dificuldades com a obtenção de água para beber, higiene pessoal e dessedentação animal e os poços poucos perfurados têm vazão baixa e a água é salobra. A demarcação de 1979 deixou de fora a totalidade do riacho Piranhas (ao "S"), parte da margem direita do rio Mearim (da cachoeira do Morcego até as proximidades em que este rio recebe águas do riacho Piranhas) e a faixa de terras na beirada do rio Mearim (ao "N"). As porções "N" e "S" da terra indígena, à margem direita do rio Mearim, está ocupada por não-índios, bem como, ao "S", as duas margens do riacho Piranhas e a margem esquerda do riacho Enjeitado também está ocupada por não-índios, ou seja, aos indígenas cabe o acesso restrito aos recursos hídricos do seu território, dos quais não estão usufruindo exclusivamente ou têm o acesso impedido por terceiros. A localização das aldeias é regida tanto pela proximidade com corpos d’água (rio, riacho e lagoa) quanto pelo apego à ancestralidade: os Tenetehara-Guajajaras sentem-se bem em lugares que foram habitados por seus antepassados ou que estes estejam ali enterrados. Boa parte das aldeias centrais da terra indígena teve seus ciclos: depois de crescerem bastante foram depopulacionadas pela não-sustentabilidade do ambiente, principalmente a falta d’água, e depois de algum tempo gerações mais novas de famílias antigas do lugar voltaram para lá para "reerguer a aldeia", como dizem. Exemplos são as aldeias Mangueira Nova, Sapucaia, Olho d’Água. Alguns aldeamentos antigos são sempre visitados (caça, coleta, pesca e vigilância contra invasões de terceiros) e parte deles, principalmente, os que encontram com incidência de ocupação de não-índios, não têm ciclos de moradia recentes. São: a cachoeira do Morcego, no extremo "S" da terra indígena, não voltaram morar porque sentem-se inseguros por conta da ocupação de não-índios nas imediações; e a aldeia Morro, ao "N", para onde se estendeu a fazenda Sibéria, de ocupação não indígena. Diferentemente se passou com a aldeia Nazaré-Coati, apesar da ocupação de não-índios, é local de aldeamento recente por conta da segurança que sentem pela proximidade de outros grandes aldeamentos, apesar dos conflitos ali existentes.
As aldeias funcionam como núcleos concêntricos: os Tenetehara-Guajajaras moram nelas, implantam suas roças nas proximidades e exercem longe das aldeias outras atividades (caça, coleta de frutos silvestres, penas, mel e palhas) com as finalidades de subsistência e uso ritual, ao mesmo tempo em que levam consigo os mais jovens, oportunidade em que repassam o conhecimento acerca do mundo em que vivem, classificando ao seu modo espécies e relacionando-as com as épocas do ano. A área designada para os Tenetehara-Guajajaras pela demarcação de 1979 diz mais respeito a esses núcleos concêntricos de habitação e não aos usos totais que fazem do território.
De acordo com o § 1º, art. 231 da CF, as terras ocupadas tradicionalmente pelos índios e necessárias às atividades produtivas, ao bem-estar do povo indígena, à reprodução física e cultural dos indígenas e imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais, também são objeto de reconhecimento por parte do Estado e de competência da União demarcá-las, e não apenas as terras ocupadas em caráter permanente.
3 - ATIVIDADES PRODUTIVAS - A coleta, praticada por homens e mulheres, é de espécies nativas da unidade fisionômica do cerrado e outras da floresta subcaudocifólia, para as finalidades: fitoterápica, construção, combustão, ritual, alimentar e artesanal. A pesca é feita por anzol e tarrafa. No passado, os Tenetehara-Guajajaras usavam, para a pesca, armadilhas, formas de envenenamento e arco e flecha. Mais expressiva que a atividade de pesca, é a de caça (por "espera", "varrida" ou "facheada") empreendida por homens, muitas vezes realizada em grupos grandes (quando se pretende conseguir uma maior quantidade de caça para se fazer a Festa do Moqueado) e, além da finalidade alimentar e ritual, tem a função de repassar aos mais jovens o conhecimento acerca do comportamento dos animais para garantir o sucesso da caçada e dos ambientes e épocas do ano onde são encontrados esse ou aquele animal. As atividades de caça, de coleta e de pesca são realizadas na totalidade do território, pois os Tenetehara-Guajajaras percorrem-no, para além da parte da terra demarcada em 1979, em toda a sua extensão em uma periodicidade que respeita a sazonalidade, dando-lhes um entendimento claro do lugar, físico, cultural e simbólico que ocupam.
A criação de gado é tímida. Raramente abatem gado para consumo, usando-o para o leite e como uma espécie de poupança. Pouquíssimas aldeias têm gado, a propriedade do gado é particular. Consideram um rebanho bom em torno de vinte cabeças. Os rebanhos dos não-índios são maiores e por vezes invadem as roças dos Tenetehara-Guajajaras e o que não é comido é pisoteado, uma razão das muitas desavenças entre índios e não-índios.
A produção de gêneros alimentícios na Terra Indígena Bacurizinho, atualmente, destina-se principalmente à subsistência. Em outras épocas os Tenetehara-Guajajaras abasteciam a cidade de Grajaú, porém, com a abertura da rodovia 226 (que facilitou o acesso dos produtos vindos de outras regiões) e, paralelamente, o aumento da demanda por alimentos dentro da terra indígena (dados o aumento populacional e a baixa capacidade de produção de excedentes) as relações entre as pessoas que vivem na terra indígena e destas com terceiros foram modificadas. Hoje dependem do comércio da cidade para a complementação da sua dieta com itens que não mais produzem. produzem. O milho e a farinha produzidos pelos Tenetehara-Guajajaras ainda são vendidos com regularidade no mercado em Grajaú. E itens como óleo para cozinha ou combustível, vestuário, gás de cozinha ou carvão, fumo, sabão e material escolar para crianças e adultos estudantes são comprados. Há outras formas de obtenção de renda que não a produção de excedentes: (1) a aposentadoria - o que poderia garantir o dinheiro mínimo necessário para a compra dos itens: alimentares que não conseguem mais produzir a contento, outros itens de que necessitam (vestuário, carvão, sabão, pagamento de contas de luz e água das casas mantidas na cidade para que os jovens estudem), porém, isso não acontece porque os cartões bancários das aposentadorias de boa parte daqueles Tenetehara-Guajajaras são mantidos por alguns comerciantes na cidade, com as respectivas senhas, devendo o aposentado adquirir os produtos disponíveis naquele estabelecimento; (2) diárias por serviços (trabalhos em roças, como boiadeiro, etc.) prestados tanto para indígenas, como para não-índios; e (3) empregos no serviço público (professores indígenas contratados e cargos funcionais da Funai, Funasa e Prefeitura Municipal).
A baixa produtividade dos cultivos empreendidos pelos Tenetehara-Guajajaras deve-se ao uso das sementes híbridas compradas no mercado melhoradas por empresas em vez de continuarem usando as sementes por eles selecionadas ao longo dos anos, que poderiam ser guardadas da safra anterior e garantir a seguinte, o que não acontece com as sementes híbridas do mercado cujo uso acarreta a dependência dos insumos agrícolas e da compra de mais sementes, além dos impactos ambientais.
As condições dos Tenetehara-Guajajaras da Terra Indígena Bacurizinho comprometem-lhes tanto as gerações futuras quanto a dignidade enquanto povo, pois, eles estão compartilhando os recursos naturais com ocupantes não-índios, o que contraria o § 2º do art. 231 da CF, que prevê o usufruto exclusivo desses recursos. A situação dos Tenetehara-Guajajaras é a da falta de escolhas. O contato com a sociedade de entorno não lhes comprometeu a identidade, porém, têm-no que empreender hoje para garantir o sustento, sob a forma da integração à sociedade nacional, o que não desejam - na forma de imposições externas - e que contraria tanto a Lei 6.001, art. 2º, incisos III, IV e V, como a Convenção 169/1989 da OIT -Organização Internacional do Trabalho.
4 - MEIO AMBIENTE - O rio Mearim (Mearí = "rio largo") e o riacho Enjeitado (Irikamirí = riacho) são usados para pesca, banhos, lavar roupa e utensílios de cozinha, para caçadas em alguns trechos e para pegar água de beber. A água do riacho Enjeitado quando bebida causa "dor de barriga", deve-se acostumar com ela ou, como faziam os mais velhos, beber um pouco da sua lama para evitar desarranjos intestinais. O riacho Piranhas, único corpo d’água em que as duas margens estão dentro da terra indígena, é usado para caça, coleta e captação d’água (em galões), nele os Tenetehara-Guajajaras não permanecem por muito tempo, dada a presença de não-índios nesse local. O mesmo uso discreto, porque cerceado, os Tenetehara-Guajajaras fazem do rio Mearim ao "N" da terra indígena, pelas mesmas razões da presença ali de não-índios e os conflitos sempre existentes entre índios e não-índios pelo acesso àqueles recursos. O entorno do igarapé da Água Preta, que deságua no rio Mearim no extremo "N" da terra indígena, é uma região de incidência de animais para caça, num ambiente contíguo ao Ritio (região à montante da Água Preta, também apontado como local de caça). Porém, a linha seca da demarcação de 1979, ao "N", dividiu esse ambiente entre índios e não-índios, também o fez com a região Cabeça de Boi (floresta de árvores grandes e local de caça) ao Nordeste da terra indígena (próximo onde o rio Mearim se encontra com o riacho Enjeitado), além de privar os Tenetehara-Guajajaras de toda a margem direita do rio Mearim ao "N", numa faixa que varia de 2km a 300m aproximadamente de largura (entre a linha seca demarcada em 1979 e a margem direita do rio Mearim) numa larga extensão de "L" a "O" destinada atualmente à ocupação de não-índios (incluído as fazendas Jatobá e Santa Cruz, pela foz do igarapé Água Preta - que drena a região de caça do Ritio, utilizada pelos Tenetehara-Guajajara - também as fazendas Sibéria e Bela Aurora, região da antiga aldeia Morro, incluído região Cabeça de Boi até a confluência com o riacho Enjeitado). A antiga linha seca mais ao "S" da terra indígena, também traçada de "L" a "O", deixou de fora a totalidade do curso do riacho Piranhas. "No 'verão', ou estação seca, de julho a novembro, igarapés e pequenos tributários secam completamente, os rios principais baixam muito de nível" (Galvão, E. Diários de Campo. Entre os índios Tenetehara, Kaioá e índios do Xingu. Rio de Janeiro. Brasília: UFRJ. MI-Funai. RJ. 1996, p.27). As lagoas, as que ou se tornam lamacentas ou secam completamente, que ficaram incluídas na demarcação de 1979, são: lagoas Sapucaia, São José, Kitara, Comprida, Sumaúma; do Caldeirão, Sabonete, Taboca e Caboclo.
A pesca é feita com anzol e linha ou tarrafa, antes faziam anzol com ferro batido, hoje o compram e, no passado mais distante pescavam com arco e flecha. Alguns dos peixes existentes: arraia/zariwiri, cabeça de véia/pirá-tenetê, corró/ini-ã, curimatá/pirá-tí, pacu/pirá-péu, peixe/pirá, piáu/pirá-tapezú, pintado/pirá-zu, surubim/curuwí, tamatá/pirá-taqueretê, traíra/(não informado).
A caça é exercida por homens, individualmente ou em grupos, nos caminhos entre uma aldeia e outra quando são distantes ou nos locais de maior incidência de animais, onde por vezes fazem casas temporárias: Ritio, Cabeça de Boi ("N" da terra indígena), Barro Branco (centro), Chapada, região da cachoeira do Morcego, do riacho Piranhas, jusante do riacho Enjeitado ("S" da terra indígena). Ao "S" e ao "N" há conflitos entre não-índios e índios por conta destes exercerem as atividades de caça além da parte da TI. Bacurizinho demarcada em 1979: Manoel (Tenetehara-Guajajara) - "O fazendeiro não aceita a gente caçar, mas a gente caça assim mesmo. Tem vez que a gente faz umas casinha pra caçar, dois, três dias, depois eles queimam." Alguns dos animais existentes na TI. Bacurizinho (nem todos são "caça"): Anta/tapi-ír, arara amarela/arara-zú, arara vermelha/arara-pirã, camaleão/camãrião, cascavel/mói-maracá, (veado) catingueiro/maháu, catingueiro pequeno/maháu-aí, cobra/mói, cotia/acutí, ema/wiranú, gambá/mãuetín, gavião/wir-hú, guariba/guariú, jacaré/zacaré, jaó/tururí, jacu/zacu, jaracuçu/muzaíu, jibóia/arapuhá-mói, macaco/ca-í, macaco preto/ca-i-hú, macaco quatro-olho (só anda de noite)/apori-quí, (veado) vermelhão/arapuhá-hú, paca/curumã, papagaio/azurú, passarinho/wirã-mirí, periquito/tuí, rã/zu-i-múi, sapo/cururu, siriema da chapada/aracuru-hú, sucuruju/muzu-hú, tamanduá/tamãno-hú, tamanduá bandeira/tamanuá, tamanduá do pequeno/tamanuá-í, tiú/[incopreensível] e veado/arapuhá e tatu (não informado)
A coleta pode ser específica (Tenetehara-Guajajaras saem em excursões para coletar palha, por ex.) ou se dá nas ocasiões e nos locais em que caçam, percorrendo longas distâncias. Alguns objetos de coleta: bacaba, pitomba, pequi, cajuí, catolé, bacuri, sendo o puçá, buriti e também mel de maior incidência na Chapada. Nicácio (Tenetehara-Guajajara) - "Os índios só usufrui das fruteira do mato mesmo, é pitomba, é bacaba, como ele falou aí, é juçara, é buriti, as outras frutas mais. Então, dessa área daqui [parte demarcada em 1979] não tem. Agora, dentro dessa área ali tem buritizal, e sempre eles vão pra lá, e os fazendeiros não quer que o índio vai lá pegar o buriti. Então a gente ficou pra cá sem o auxílio de buriti, sem água corrente. Os índios anda muito, eles vão pra lá, fazendeiro não aceita."
Os Tenetehara-Guajajaras usam madeiras para construções de casas e pontes (não fazem embarcações), para combustível (cozinhar e moquear carne de caça) e para fitoterapia. Alguns tipos de madeira: angico (carvão; o chá da casca é usado para dor de barriga e para inflamação de garganta), aroeira (casa, pontes, chá da casca usado contra inflamações da garganta), aroerinha (ponte), coração de nêgo (o sumo é usado para diarréias em crianças), jatobá e tamboril (boas para fazer barcos, mas não os fazem), maçaranduba (tábuas), pau-d’arco/ipê e sapucarana ("cavaco" para cobrir o telhado), sapucaí (uso geral), sucupira (tábuas, da casca faz-se remédio para infecção da garganta) e sumaúma (leite da casca cura coceiras).
A extração de madeira na TI. Bacurizinho por parte de não-índios se dá ao "N", na faixa de terra entre a linha seca de 1979 e a margem direita do rio Mearim, principalmente no lugar Cabeça de Boi (a diligência composta por Tenetehara-Guajajaras da aldeia Bananal, pelo sr. "Madrugada"-Tenetehara-Guajajara chefe de Posto da Funai-, pela antropóloga do GT e pelo Del. de Polícia de Grajaú, em outubro/2001, verificou que as madeiras eram retiradas da área demarcada em 1979 e arrastadas para fora dela, porém dentro ainda da área ora identificada). No lugar de ocupação do não-índio, dentro da terra indígena delimitada, o sr. Ifraim Rodrigues, vizinho à aldeia Sabonete (Tacoatiara) há carvoeiras, na região central da terra indígena. Na região do Sítio do Meio também os não-índios usufruem das madeiras. Na noite de 20.11.2001, Agentes Federais designados para acompanhar o GT apreenderam e levaram para a Del. de Polícia um caminhão com toras de ipê no lugar Santa Teresa (Fazenda Nazaré, dentro da área identificada). Os quatro homens não-índios que estavam com o caminhão disseram que a madeira era do sítio do Meio. Além da exploração dos recursos naturais de forma massiva pelos ocupantes não-índios na terra indígena identificada, a parte demarcada em 1979 sofre invasões de não-índios ao "N", no Ritio, para caçadas e para coleta de jaborandi (há uma rede de comércio extensa na região para vender a matéria-prima em Parnaíba-PI, a um laboratório que extrai a pilocarpina para o fabrico de medicamentos e comercialização do mesmo pelo laboratório) o que deveria passar pela regulamentado pela Medida Provisória 2.186-16/2001 (em consonância com Convenção sobre a Diversidade Biológica-CDB (1992), promulgada pelo Dec. 2.519/98), no que toca aos lucros obtidos pela empresa e a justa Repartição dos Benefícios com os Tenetehara-Guajajaras, já que trata-se de povos indígenas, comunidades locais, detentoras e provedoras do patrimônio genético por elas conservados.
Índios e não-índios competem pelo acesso aos mesmos recursos, cumpre, portanto, à União garantir aos índios a posse permanente de seu território e o usufruto exclusivo dos recursos naturais nele existentes conforme a Lei 6.001, art. 2º, IX e CF, art. 231, § 2º , sendo "vedada a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa" ( L 6.001, art. 18, § 1º ).
5 - REPRODUÇÃO FÍSICA E CULTURAL - A população da TI. Bacurizinho é de 3.663 índios (Funasa/2003) e cresceu 56,5% em dois anos, sendo o crescimento progressivo. A densidade populacional (por 10.000ha) na parte demarcada (82.000ha) é de 252 índios, e naquela ocupada por terceiros (52.000ha) é de 88 não-índios.
Das festas rituais tradicionais do povo Tenetehara-Guajajara na TI. Bacurizinho acontecem hoje a Festa da Moça (na menarca, ocasião em que a moça é preparada pela avó para a maternidade com pinturas corporais e informações) e a Festa do Moqueado, que é o ritual de apresentação da moça para a comunidade, acontecendo no final do verão (outubro/novembro). Meses antes desta festa grupos de 10 a 30 caçadores fazem expedições longas com meses de antecedência e o que caçam é destinado ao moqueado (carne conservada na fumaça, sem sal até o dia da Festa, quando cozinham e servem com farinha aos convidados às seis da manhã, depois de uma noite inteira de cantorias e danças). As caças para o moqueado (queixada, mateiro, capelão, jaó, jacu e veado) são específicas e há o tabu com relação a outras (ex.: tatu e catingueiro). As moças são adornadas com pinturas de tinta de jenipapo, penas de arara, gavião, ema e outros pássaros (muitas dessas penas são conseguidas na região chamada de Chapada), nos intervalos na dança as moças ficam sentadas em esteiras de palha (mirráu). A Festa do Rapaz é um rito de passagem masculino que está sendo retomado. A não longevidade dos Tenetehara-Guajajaras é por eles relacionada à falta da realização desse rito, por meio do qual o homem tenetehara passa a ser um "cantor" que tem o direito de usar o maracá (chocalho) o que o coloca em comunicação com o sobrenatural. A desarticulação do modo de produção tenetehara e também as coibições religiosas desde a época das Missões colaboraram para o esmaecimento dessa prática ritual. A Festa do Mel não acontece mais entre os Tenetehara-Guajajaras da Terra Indígena Bacurizinho, embora saibam dela, do seu significado e pretendam reativá-la, dentro de um processo de reavivar as suas práticas e representações culturais em meio às pressões externas (Diniz, 1988, pp.26-7). Para essa festa uma casa é construída para pendurar-lhe nas vigas entre 120 e 180 cabaças de mel com mais de um litro cada uma, o que depois é bebido diluído em água. Até que o estoque seja completado cantam todas as noites rememorando um mito (acerca de um caçador de araras vermelhas e a deslealdade do seu irmão) que revela e classifica atitudes e comportamentos alimentares vegetarianos, carnívoros ou canibais (Lévi-Strauss, C. Mitológicas: de la miel a las cenizas. México: Fondo de Cultura Económica, 1987, pp. 27 e ss.). A escassez do mel (encontrado também na Chapada, lugar de ocupação não-indígena) é uma razão para terem negligenciado esse ritual.
Os principais cemitérios ativos na TI. Bacurizinho são: o da aldeia Bacurizinho (a própria aldeia Bacurizinho foi erigida sobre um cemitério de épocas imemoriais) e o da aldeia Nazaré-Coati, sendo que neste o fazendeiro local enterrou parentes, um dos motivos das desavenças com os Tenetehara-Guajajaras que exigem a retirada desses ossos. Em geral as aldeias têm ancestrais enterrados nelas, razão pela qual seus descendentes retornam para esses aldeamentos: José Lopes (Tenetehara-Guajajara) - "Quem acabou com a aldeia lá do morro foi o Chico Latão mais o Pedrão [não-índios]. Quem botou o nosso tio pra correr de lá, o Manoel caboclo. Eles tão tomando de conta dizendo que é deles. Mas eu tenho muita fé em Deus que eu vou morar lá, eu, vou morar lá, na Bela Aurora, que eu sou apaixonado com aquilo ali por que eu tenho a minha avó enterrada lá, eu vou morar lá em cima do cemitério."
Depois da morte, um familiar do morto leva para ele comida e coloca no túmulo, isso por volta de sete dias, depois disso os familiares voltam ao cemitério apenas para novos sepultamentos (Zannoni, 1999, pp.79). Os mortos são enterrados enrolados em suas redes de dormir ou em caixões convencionais, antes eram enrolados em casca de tawari, amarrada com cipó (ibidem). Os Tenetehara-Guajajaras crêem ter uma "alma" boa -que segue para junto de Maírae outra má - que vaga e pode fazer mal aos vivos (Zannoni, 1999, pp.78-9).
O pajé é a pessoa que tem o poder de cura sobre doenças originadas pelo desagrado dos espíritos e aprende o ofício em ocasiões mágicas, ensinado por ancestrais: Reginaldo (Pajé) - "Passei catorze dias doente, magro, magro mesmo. Aí depois eu sonhei com a minha avó (...) apareceu criança muito doente lá e ela falou assim pra mim: 'Ei meu neto, olhe aqui como que eu vou fazer o trabalho.' Aí tava curando a criança, criança assim não come, né? Criança ficou boazinha, tava comendo e eu vendo também. Aí deu o negócio que ela tirou de dentro da criança (...), aí a criança ficou mal de novo. Aí ela falou assim pra mim: 'Agora é a tua vez.' Rapaz, o negócio foi pesado pra mim, aí eu curei, tirei esse negócio da criança, a criança ficou bom." Os pajés são tidos como dotados de sensibilidade e sempre recebem "choques" (chamados) quando estão em lugares encantados, onde viveram os ancestrais como a cachoeira do Morcego e confluência do riacho Piranhas com o rio Mearim (na faz. Nazaré), também os cemitérios.
A origem e a trajetória histórica dos Tenetehara-Guajajaras é contada no mito de Maíra: uma mulher caminhava na mata e engravidou de Maíra disfarçado em árvore (versão da TI. Bacurizinho, há outras versões). Nascidos os irmãos Maíra-ir e Mucura-ir (ir=filho), iniciam uma saga em busca de Maíra e vão fazendo travessuras nesse percurso: criam brejos, as palhas nos brejos, separam a noite do dia, criam peixes para os rios e etc., explicando o mundo em que vivem e delineando o ethos social e moral da conduta tenetehara. A narrativa é longa e fatos acontecidos recentemente são a ela incorporados, como uma forma da prescrição cultural do que é ser tenetehara.
Os rituais, a transmissão dos conhecimentos acerca da cura, os lugares sagrados e os mitos falam dos Tenetehara-Guajajaras do passado ao mesmo tempo em que informam o rumo das novas gerações para o tempo futuro. São as diretrizes de um povo autodeterminado, condição esta reconhecida pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966, art. 1º, estendida a todos aqueles que se proclamam integrantes de "povos".
6 - LEVANTAMENTO FUNDIÁRIO - Os trabalhos realizados entre 10/10 e 12.11.2001 demonstraram que, dos 116 imóveis existentes cadastrados na TI. Bacurizinho, 73% estão ocupados, e apesar de levarem os nomes de "fazendas", são em sua maioria muito simplórias quanto às instalações e quanto à produção, quando esta existe. As famílias que de fato habitam os imóveis enfrentam sérias dificuldades como pequenas produtoras (crédito, capital para insumos agrícolas e regularização fundiária) e as constantes disputas pela terra reivindicada pelos Tenetehara-Guajajaras, o que se arrasta de forma mais acirrada desde década de 1950 (vide Gomes, 2002, pp.391-8), proporcionam insegurança aos não-índios nos empreendimentos que desejam para as suas ocupações. Há ocupações não-indígenas na TI. que funcionam como uma segunda casa, quando a moradia fixa com a família é na sede municipal de Grajaú.
Ocupantes não-indígenas incidentes na área identificada da TI. Bacurizinho (Grajaú-MA) (nome - localidade): Adão Chaves da Silva Bezerra - Jatobá; Aedson Chaves Carvalho Chaves - Enjeitado; Airley Rodrigues Bandão - Barriguda; Alfredo de Sales Calazans - Jatobá; Alzira Pereira de Souza - Bela Aurora; Ana Cláudia Pereira de Souza - Jatobá; Antonio Alves Bezerra - Jatobá; Antonio Claro Leda - Jatobá; Antonio Daniel da Conceição - Bela Aurora; Antonio de Jesus Ferreira - Bela Aurora; Antonio de Sousa Leda - Barriguda; Antonio Fernandes dos Santos Barros - Jatobá; Antonio Gomes de Sousa - Bela Aurora; Antonio Jose Herculano Chaves - Jatobá; Antonio Moraes Gomes - Barriguda; Antonio Wagner de Barros Akashi - Quatis (Coati), Santa Teresa e Nazaré; Arão Ferreira Costa - São João; Artur Cândido Ribeiro - Santa Cruz; Artur Ribeiro - Santa Cruz; Artur Vieira - Barriguda; Bernardino Soares da Costa - Jatobá; Cláudio Ivam Milhomen da Costa - Jatobá; Cleosnaldo Brito Siqueira - Sítio Pajeú (Piranhas); Cleonice Chaves Pereira - Jatobá; Dária Takabaiashi - Piranhas, Santa Helena e Belos Aires (Faz. São Gonçalo; Diocese de Grajaú - Sítio do Meio; Donília Pereira Chaves - Bela Aurora; Edson Hiroshi Takabaiashi - Piranhas; Erasmo Gonçalves Carvalho - Enjeitado e Enjeitado (Mata Grande); Espólio de Raimundo Vieira Santos - Jacaré; Eugênio Alves Sousa - Jatoba; Francisco Alves Leda - Bela Aurora; Francisco das Chagas Rodrigues Nunes - Jatobá; Francisco das Chagas Rodrigues de Araújo - Jatobá; Francisco de Assis Batista Santos - Vereda; Francisco Pereira da Silva - Jatobá; Herdeiros de Antonio Alves dos Santos Chaves - Jacaré; Herdeiros de Baltazar André de Barros - Cabeceira, Chata, Piranhas, São Bento, Sítio do Meio, Quatis (Coati), Santo Esídio; Herdeiros de Francisco Gonçalves de Almeida - Bela Aurora; Herdeiros de José Pereira de Sá - Jatobá (Morada Nova); Herdeiros de José Tomaz de Barros - Piranhas; Herdeiros de Juvenal Manoel da Silva - Barriguda; Herdeiros de Silvério Rodrigues do Nascimento - Bela Aurora; Ifraim Rodrigues dos Santos - Piranhas; Ifraim Rodrigues filho e Jéssica Galvão dos Santos - Piranhas; Instituto de Colonização de Terras do Maranhão-Iterma - Jatobá e Bela Aurora; João Alberto Chaves - Barriguda; João Coelho da Silva - Jatobá; João Divino de Sales Calazans - Jatobá; João Pedro Fraz Conceição e Outros - Bela Aurora; João Pereira de Sousa - Bela Aurora; João Raimundo dos Santos - Bela Aurora; João Soares da Silva - Bela Aurora; José Antonio Soares - Bela Aurora; José Carlos de Barros - Piranhas; José do Carmo Rodrigues Ferreira - Barriguda (Faz. São José); José Domingos Fraz Conceição - Bela Aurora; José Ferreira da Silva - Enjeitado (Mata Grande); José Itamar Pereira do Nascimento - Barriguda; José Lima e Silva - Jatobá; José Maria Figueira de Sousa - Barriguda; José Ribeiro de Barros - Santo Isídio; José Rodrigues da Silva - Jatobá; José Viana Santos- Jatobá; Josué Leda Pereira - Jatobá; Júlio José de Sousa - Jatobá; Lourival Alves Chaves - Barriguda; Luís dos Santos e Outro - Enjeitado (Mata Grande); João Batista Lima - Enjeitado (Mata Grande); Manoel João da Silva - Jatobá; Manole Luís Soares dos Santos - Bela Aurora; Manoel Paulo Freitas dos Santos - Jatobá; Maria do Nascimento Barros - Piranhas, Santo Antonio e Belos Aires; Maria Rosa Barros - Piranhas, Santa Helena e Belos Aires; Matias Coelho de Sá - Jatobá (Morada Nova); Moisés Luís Rodrigues - São João; Moisés Paulo dos Santos - Enjeitado; Olindina Bezerra Barros - Quatis (Coati); Osvaldo Alves da Silva - Bela Aurora; Paulo Sérgio Galvão dos Santos - Jatobá; Pedro da Conceição Costa - Bela Aurora; Pedro Martins Chaves - Enjeitado e Aliança; Pedro Nascimento Cunha e Outros - Enjeitado (Mata Grande); João de Deus Sousa Cunha - Enjeitado (Mata Grande); Pedro Martins da Silva - Enjeitado (Mata Grande); José Salomão de Sousa Cunha - Enjeitado (Mata Grande); Francisco de Assis Sousa Cunha - Enjeitado (Mata Grande); Raimundo Nonato da Costa Falcão - Jatobá; Raimundo Nonato de Moraes - Jatobá; Raimundo Nonato dos Santos Silva - Bela Aurora; Raimundo Nonato Pereira - Bela Aurora; Renato Rocha de Moura - Bela Aurora; Ricardo Oliveira Silva - Piranhas; Rinaldo Xavier - Santa Cruz; Timóteo Alberto Carvalho Chaves - Enjeitado (Aliança); Timóteo Antonio de Carvalho - Enjeitado; Valdivino de Sales Calazans - Jatobá; Valeriano Rodrigues Sobrinho - São João; Valdemar Melo de Almeida - Bela Aurora; Zacaria Paulo Santos - Piranhas e Enjeitado.
As desavenças entre os Tenetehara-Guajajaras e os ocupantes não-índios da TI. Bacurizinho, nos últimos dez anos, assumem as seguintes formas: na localidade da faz. Santa Cruz, instalada no limite "N" da terra indígena, perto da localidade Barriguda, houve a morte de um índio que fora queimado, o ato é atribuído ao não-índio "Passarinho", filho do Lastreano. Depois, um grupo de índios invadiu a tapera da fazenda Santa Cruz, a qual foi abandonada; dois bois de propriedade de não-índios foram mortos pelos Tenetehara-Guajajaras em represália à recorrência com que o gado dos não-índios invadia as roças dos índios na porção Noroeste da terra indígena demarcada em 1979, entre as aldeias Tamarina e São José. Cacique Francisco: "Aí os gado vieram, invadiram a nossa roça aí, esbagaçavam o que tinha na roça, balançavam e quebravam a mandioca todinha. Na beira, seis gado, os índios mataram dois, dentro da roça"; no limite "S" da terra indígena, o acesso à aldeia Tacoatiara (Sabonete) ficou interceptado pela fazenda do sr. Ifraim Rodrigues, o qual veio de Macaúba e comprou o direito de duas glebas, uma delas das mãos da família Akashi, na faz. Piranhas, as discussões foram contemporizadas na Prefeitura Municipal por meio de um trato para se deixar o acesso livre para os Tenetehara-Guajajaras, em que a Prefeitura se comprometia a melhorar o caminho, o que nunca aconteceu, também jumentos criados pelos Tenetehara-Guajajaras invadiram a fazenda daquele senhor, motivo da discussão calorosa entre o Cacique Nicácio e o sr. Ifraim que assumiu outros espaços além daquele da terra indígena no dia dez de abril de 2001 na agência do Banco do Brasil/Grajaú.
A presença da família Barros na TI. Bacurizinho não recua a gerações anteriores a Salomão Duarte de Barros, o qual era cearense (Gomes, 2002, p.392). A terra Quatis (lugar da posse Nazaré), onde está situada aldeia Nazaré-Coati ao "S" da terra indígena, foi recebida pelo sr. Wagner Akashi (residente em São Luís) como doação, mediante o pagamento de cinqüenta mil Cruzeiros em outubro 1979 para sua tia materna, Dária Wíncula Barros, filha de Salomão de Barros. No dia trinta de outubro de 2001, os Tenetehara-Guajajaras invadiram a sede da fazenda Nazaré de forma pacífica, porém em caráter permanente, tendo o caseiro o sr. Gedeão (do lugar Santa Teresa) se retirado do local. O sr. Wagner Akashi requereu, em 2002, a reintegração de posse da Fazenda Nazaré (Processo nº 124/02, Estado do Maranhão, Poder Judiciário, Comarca de Grajaú), cujos requeridos são o Cacique Damião e outros índios moradores da aldeia Nazaré-Coati, tal requisição foi contestada pela AGU - Advocacia Geral da União, sob a Petição PU/MA/AGU/JAN/M-142/nO 328/2003, de 17.02.2003), em que pede que a "V. Exa. que se digne a declarar sua incompetência para decidir sobre a demanda, revogando a liminar de reintegração de posse concedida, determinando a remessa dos autos ao Juiz Federal da 3a Vara para conhecer a ação onde a União e a Funai defenderão os seus direitos e interesses, apresentando a competente defesa". Antes, o sr Yuko Akashi também havia contestado os limites de confrontação da faz. Santa Maria com a parcela da TI. Bacurizinho demarcada administrativamente em 1979 que corrigia a demarcação judicial anterior que impedia o acesso dos Tenetehara-Guajajaras às lagoas do Caldeirão, do Sabonete e do Tabaco, cuja resposta ao pleito publicada no D.O. 02.02.1978, segue: "Se a constituição reconhece o direito do usufruto exclusivo das riquezas naturais aos silvícolas e se estas vêem usando as lagoas, em face dos termos do parágrafo primeiro do art. 198 da Carta Magna . Assim homologo os trabalhos do perito do Juízo, para fixar nos rumos ali declarados os limites das terras dos Autores. Prossigam os trabalhos demarcatórios, nos seus demais termos." (Juiz Carlos Alberto Madeira, Boletim da Justiça Federal nº 003/78, São Luís, 15 de dezembro de 1977).
Em 1959, Dária Wíncola de Barros negociou com o SPI (registro em cartório em 24 de agosto de 1959, intermediado pelos servidores Sebastião Xerxes e Raimundo Vianna) uma indenização no valor de cem mil Cruzeiros pelas aldeias que alegava direitos de propriedade, assinando o recibo da primeira parcela no valor de cinqüenta mil Cruzeiros pelas terras das aldeias Bacurizinho, Pedra Mangueira, Olho d’Água, Ipu e Cocal Grande, "era (...) uma maneira de pagar tributo a um interesse econômico de conotação política (...) Não parece ter havido qualquer viés de falcatrua ou corrupção nesse ato, mas também não há recibo sobre o restante" (Gomes, 2002, p.393). Antes disso (Relatório para o SPI, 1942) constou um projeto demarcatório que incluía na TI. Cana Brava as aldeias Morro, Pedra e Bananal (localizadas de N a S na parte L da TI. Bacurizinho), à revelia dos moradores das aldeias de ambas terras indígenas. Na década de 1960, acusações de corrupção foram lançadas contra ex-servidores do SPI, dentre os quais Xerxes e Vianna, sendo que este último relacionava-se com os Tenetehara-Guajajaras locais como patrão (Gomes, 2002, p.394). Todas as tentativas demarcatórias anteriores da TI. Bacurizinho são relatadas pelos Tenetehara-Guajajaras como frutos de negócios que não tinham por finalidade reconhecer-lhes de fato a territorialidade senão acomodar questões locais politicamente. Imbuído das determinações da CF de 1988 voltadas ao reconhecimento da diversidade étnica e aos direitos originários dos povos indígenas, foi designado pela Funai em 1995, o GT coordenado pelo antropólogo Klinton Senra e, dada a isenção do GT com as amarras políticas locais, os trabalhos não foram finalizados, estando faltantes os relatórios subsidiários. Nas mesmas circunstâncias de isenção, e de certo por conta delas, os trabalhos do GT coordenado pela antropóloga Leslye Bombonatto Ursini só puderam ser concluídos com a garantia de Liminar (Proc. 2001.7041-8, pela Justiça Federal de Primeira Instância - 3ª Vara, Maranhão) concedida em oito de novembro de 2001 e pelo acompanhamento em campo de quatro Agentes Federais, dados os impedimentos colocados por locais não-índios.
As disputas e os confrontos entre índios e não-índios se dão porque os Tenetehara-Guajajaras entendem a terra indígena Bacurizinho em sua totalidade como sua, em claro conflito entre direitos de propriedade, de posse e direitos originários, cuja disposição legal está no caput do art. 231 e § 6º, da CF .
7 - CONCLUSÃO E DELIMITAÇÃO - Os Tenetehara-Guajajaras reivindicam o reconhecimento da TI. Bacurizinho, e o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação, matéria deste Resumo, é o resultado dessa reivindicação e dos trabalhos técnicos de agrimensura, ambientais, antropológicos e dos levantamentos fundiários para a identificação da área de uso que os Tenetehara-Guajajaras fazem da terra indígena, conforme seus costumes e tradições, com maior ou menor desenvoltura dada a coibição dos ocupantes não-índios em alguns pontos da terra indígena. Do exposto conclui-se que os Tenetehara-Guajajaras, em progressivo crescimento populacional, estão confinados a uma parte restrita da terra indígena tendo compartilhado, a contragosto, com não-índios o usufruto dos recursos naturais nela existentes, contrariando, portanto, o prescrito na CF: "Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, seus costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens./ § 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para as suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições./ § 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhe o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes."
A delimitação da TI. Bacurizinho segue com coordenadas geográficas aproximadas partindo do P-01 (06º02’33,9" S e 46º01’40,9" WGr.) localizado na Cachoeira do Morcego, segue pela margem direita do Rio Mearim, sentido jusante, passando pelo local Santa Teresa/Nazaré e a aldeia Nazaré-Coati, junto à fazenda Piranhas, pela confluência do riacho Piranhas como rio Mearim (local sagrado e também onde foi realizado um ritual por pajés com a presença da antropóloga-coordenadora do Grupo Técnico, para o bom andamento e finalização desse trabalho de regularização fundiária, conforme traduziram do Tenetehara para o Português naquela ocasião), continua seguindo pela margem direita deste rio, sentido jusante, passando pelas aldeias Escondido, Talhado, Patizal, Cocalinho, Cocal Grande, Bacurizinho, Ipu e Tamarina, continuando pela margem direita do rio Mearim, sentido jusante, passando pelas fazendas Jatobá e Santa Cruz, foz do igarapé Água Preta (que drena a região de caça do Ritio, utilizada pelos Tenetehara-Guajajara), continua passando pelas fazendas Sibéria e Bela Aurora, região da antiga aldeia Morro, passando ao "N" da região Cabeça de Boi até a confluência com o riacho Enjeitado até o ponto P-02 (05º46'33,2" S e 45º36'27,9" WGr.) localizado na confluência do Rio Mearim com o Riacho Enjeitado; daí segue pela margem esquerda do riacho Enjeitado sentido montante ladeando a "O" a região da Cabeça de Boi (local de expedições não autorizadas de caça de não-índios, inclusive moradores de outros estados e de ação de madeireiros intrusos) dentro da terra indígena delimitada, para chegar à antiga aldeia Cabeceira, tendo na região, na outra margem do riacho, como confrontante, a empresa GUSA, para onde é dito o destino do carvão produzido na fazenda do sr. Ifraim Rodrigues intralimites da TI. Bacurizinho; seguindo passa-se pela aldeia Cabeceira, aldeia Bananal, Capinzal e outras limítrofes com a TI. Porquinhos (indígenas Canela), na região desta terra indígena onde está a localidade Matuzalém, seguindo ainda pela margem esquerda do riacho Enjeitado passando pela a aldeia Nova e pela fazenda Enjeitado (este é um local de caça utilizado pelos Tenetehara-Guajajaras prejudicado pela instalação da fazenda) até chegar ao ponto P-03 (06º07’39,9" S e 45º49’24,3" WGr.) localizado na confluência do igarapé Bracinho com o riacho Enjeitado. Do P-03 descrito segue por uma linha seca até o ponto P-04 (06º06'50,8" S e 45º53'02,2" WGr.) localizado na cabeceira do Riacho Piranhas; daí segue por uma linha seca até o ponto P-01, início da descrição deste perímetro.
LESLYE BOMBONATTO URSINI.
Antropóloga Coordenadora do GT
Portaria nº 725/PRES/2001
MEMORIAL DESCRITIVO
OESTE/NORTE: partindo do ponto P-01, de coordenadas geográficas aproximadas 06º02’33,9" S e 46º01'40,9" WGr., localizado na Cachoeira do Morcego, segue pela margem direita do Rio Mearim, sentido jusante, até o ponto P-02, de coordenadas geográficas 05º46’33,2" S e 45º36’27,9" WGr., localizado na confluência do Rio Mearim com o Riacho Enjeitado. LESTE: do ponto antes descrito, segue pela margem direita do Riacho Enjeitado, sentido montante, até o ponto P-03, de coordenadas geográficas aproximadas 06º07’39,9" S e 45º49’24,3" WGr., localizado na confluência com o Igarapé Bracinho. SUL: do ponto antes descrito, segue por uma linha seca até o ponto P-04, de coordenadas geográficas aproximadas 06º06’'50,8" S e 45º53’02,2" WGr., localizado na cabeceira do Riacho Piranhas; daí segue por uma linha seca até o ponto P-01, início da descrição do perímetro. OBS: 1. base cartográfica utilizada na elaboração deste memorial descritivo: SB.23-V-D-IV, SB.23-V-D-V, SB.23-Y-B-I, SB.23-Y-B-II - Escala 1:100.000 - DSG - 1979, 1982 e 1984; 2. o referido memorial descritivo foi elaborado com coordenadas geográficas obtidas pelo GPS Garmim modelo 12 XL. Responsável Técnico Identificação dos Limites: Reginaldo de O. Carvalho, Engenheiro Agrimensor, CREA-MG 71.729/D.