Instrução Normativa SSP nº 4 DE 04/06/2020

Norma Estadual - Maranhão - Publicado no DOE em 16 jun 2020

Institui o protocolo de atendimento às mulheres em situação de violência, baseada de gênero, no Plantão Especializado de Atendimento à Mulher de São Luís.

Considerando que é dever do Estado criar mecanismos para coibir a violência doméstica (art. 226, § 8º, CF);

Considerando a necessidade do desenvolvimento de políticas públicas que "visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão" (art. 3º, § 1º, da Lei nº 11.340/2006);

Considerando a Resolução nº 10/2018 - CONCPC, que trata da instituição das diretrizes a serem observadas pelas Polícias Civis dos Estados e do Distrito Federal para atendimento das mulheres vítimas de violência doméstica e de gênero, no contexto da lei Maria da Penha;

Resolve:

Instituir o protocolo de atendimento às mulheres, em situação de violência de gênero, no Plantão Especializado de Atendimento à Mulher de São Luís, nos seguintes termos:

CAPÍTULO I

DO ATENDIMENTO E ORIENTAÇÕES

Art. 1º Às mulheres em situação de violência, baseada no gênero, que buscam o atendimento em sede policial, deve ser-lhes garantido o respeito, o não julgamento de suas atitudes, a confidencialidade das informações e sua não exposição, de forma a evitar sua revitimização.

Art. 2º Efetuado o registro de ocorrência, deverá a vítima ser informada sobre a existência de rede de atendimento à mulher no município de sua residência e, conforme as peculiaridades de cada caso, deverá ser feito seu encaminhamento para atendimento pelos órgãos que a compõe, mediante ofício.

Art. 3º Em caso de violência doméstica e familiar, a ofendida será informada sobre os direitos a ela conferidos pela lei nº 11.340/2006 e os serviços disponíveis, inclusive sobre as medidas protetivas de urgência e seus efeitos.

Parágrafo único. A autoridade policial avaliará a necessidade de encaminhamento, realizado por demanda espontânea, da ofendida e seus dependentes para a casa abrigo, caso estejam em situação de risco e não dispuserem de local seguro para permanecer.

Art. 4º Em caso de vítima criança ou adolescente, não sendo possível a restituição ao seu responsável, deverá ser acionado o Conselho Tutelar competente.

CAPITULO II

DAS ATRIBUIÇÕES

Art. 5º São atribuições do plantão especializado:

I - registros de ocorrência;

II - após registro de ocorrência policial, agendamento para instauração de inquéritos e termos circunstanciados de ocorrência, a serem realizados pela equipe do expediente da Delegacia Especial da Mulher, conforme atribuições estabelecidas, ressalvados os casos previstos nos incisos IV e V;

III - - orientação à(o) s requerentes para o preenchimento) do requerimento de medidas protetivas de urgência, conforme legislação em vigor;

IV - oitivas imediatas de vítimas e testemunhas, que se apresentem no momento do registro do boletim de ocorrência, definidas nesta instrução normativa;

V - lavratura de autos de prisão e apreensão em flagrante;

VI - lavratura de termos e boletins circunstanciados de ocorrência, em situações conduzidos/apresentados;

VII - cumprimento de mandados de prisão em aberto, em face de comunicantes de boletins de ocorrência ou conduzidos;

VIII - encaminhamento dos conduzidos/apreendidos para osrespectivos responsáveis por sua custódia/acolhimento;

IX - representar pela prisão preventiva, nos casos que lhe forem noticiados e já estiverem presentes os requisitos que a autorizam.

CAPITULO III

DO REGISTRO DE OCORRÊNCIA

Art. 6º Por ocasião do registro de ocorrência, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, a equipe plantonista solicitará ao comunicante a atualização de seu endereço e contato telefônico, se for a vítima do fato comunicado, assim como do autor(a), devendo ainda fazer constar:

I - data, horário e local do crime ou fato comunicado;

II - tempo e tipo de relacionamento existente entre a vítima eo (a) autor(a);

III - caso já estejam separados, consignar o tempo de separação;

IV - descrição do fato, ressaltando a ação, meios empregados e resultado aparente;

V - nos crimes de ameaça, fazer constar as palavras, escritos, gestos ou instrumentos utilizados e se tais atos lhe causaram temor;

VI - no histórico do boletim, as expressões utilizadas pela vítima, sem traduções ou melhoramentos, bem como as palavras, escritos ou gestos usados pelo(a) autor(a) para a prática do delito;

VII - fazer constar o nome social da vítima, em conformidade à lei estadual nº 11.021/2019;

§ 1º Ao acessar o SIGMA, além das atualizações supramencionadas, fazer constar se a vítima é pessoa com deficiência e dados referentes à sua raça/etnia, em campo específico;

§ 3º Na passagem do plantão, os boletins de ocorrência devidamente assinados pela autoridade policial, comunicante e quem o registrou, deverão ser digitalizados e arquivados digitalmente em pasta específica para esse fim.

CAPÍTULO IV

DO AGENDAMENTO E ENCAMINHAMENTO

Art. 7º Nos crimes em que a ação penal for condicionada à representação, ou nos crimes de ação penal privada, não sendo o caso de prisão em flagrante, demonstrado interesse da vítima pela representação contra o autor, realizar agendamento em livro próprio, com assinatura da vítima dando-lhe ciência, data e horário de comparecimento na Delegacia Especial da Mulher - ocasião em que a autoridade policial verificará o procedimento a ser adotado.

Art. 8º Nos crimes de ação penal privada, após a confecção do boletim de ocorrência, além do agendamento previsto no artigo anterior, a vítima deve ser informada que, para o processamento do autor, deverá buscar auxílio de advogado ou de Defensor Público, a fim de ser apresentada queixa-crime no prazo legal;

Art. 9º Sendo atribuição para investigação de outra delegacia, e não se tratar de flagrante, efetuado o registro noticiando delito de ação penal pública incondicionada, deverá a autoridade policial encaminhar cópia do boletim de ocorrência à delegacia de polícia da circunscrição competente, consignando no próprio boletim de ocorrência que: "Fica a vítima ciente que deverá comparecer à delegacia responsável pela investigação do fato (colocar a Unidade Policial responsável pela investigação), preferencialmente, no primeiro dia útil subsequente, a fim de serem tomadas demais providências adequadas ao caso, dentro do prazo estabelecido no art. 38 do Código de Processo Penal".

§ 1º Sendo atribuição para a investigação de outra delegacia de polícia, efetuado o registro noticiando delito de ação penal pública condicionada à representação ou de ação penal privada, deve ser informado ao comunicante o endereço onde está sediada, para que compareça em dia útil e horário de expediente, consignando no boletim "Fica a vítima ciente que, desejando o processamento do autor do fato, poderá comparecer à delegacia responsável pela investigação do fato(colocar a Unidade Policial responsável pela investigação), para solicitar providências adequadas ao caso, dentro do prazo estabelecido no art. 38 do Código de Processo Penal".

Parágrafo único. Em se tratando de vítima menor ou idosa, especificamente de crimes sexuais, encaminhar de imediato para os exames periciais. Em caso de menor de idade, expedir guia para atendimento psicossocial no IPTCA, no dia útil imediatamente posterior, juntando cópia de recebimento da guia no procedimento a ser encaminhado à Delegacia competente.

CAPÍTULO VI

DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

Art. 10. As medidas protetivas de urgência poderão ser requeridas pela ofendida ou pelo Ministério Público, em situações de violência doméstica e familiar vivenciadas, conforme art. 19 da Lei nº 11.340/2006;

Art. 11. Após ser informada de seus direitos e manifestando-se a ofendida pelo interesse em requerer medidas protetivas de urgência, deverá ser preenchido formulário específico para tal fim e requeridas as medidas pertinentes ao caso que ora se apresente, conforme modelo de requerimento desenvolvido pela Delegacia de Mulher, que pode ser atualizado a qualquer tempo.

Art. 12. O requerimento e seu anexos, após assinados, deverão ser digitalizados e encaminhados no prazo legal para apreciação do juízo competente, em regra, via Processo Judicial eletrônico - PJe e, nas exceções previstas em lei ou regulamentos que tratam da matéria, poderão ser enviadas por peticionamento físico, devendo ainda ser observado:

I - no período compreendido entre às 08h e 18h, em dias úteis, para a jurisdição da ocorrência do fato, ou alternativamente, por opção da ofendida, para outro juizado, conforme previsto no art. 15 da lei nº 11.340/2006;

II - nos feriados, pontos facultativos e demais casos, ao plantão criminal.

Art. 12. Será ainda de preenchimento obrigatório o questionário de avaliação de risco, disponibilizado à requerente que, não sabendo efetuar o correto preenchimento, deverá lhe ser prestado auxilio e, de preenchimento facultativo, o consentimento de intimação via "whatsapp", bem como eventuais instrumentos tecnológicos que vierem a ser implantados.

§ 1º Quanto ao preenchimento do requerimento deverá ser observado:

a) a qualificação da requerente, com preenchimento correto do número de CPF;

b) a qualificação do requerido, devendo ser informado o endereço onde seja possível citá-lo, inclusive endereço comercial, além de pontos de referência;

c) se o agressor possui registro de porte ou posse de arma de fogo, a fim de subsidiar pedido de suspensão da posse ou restrição do porte de armas e, na hipótese de existência, juntar aos autos essa informação, bem como notificar a ocorrência à instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão do porte, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 (Estatuto do Desarmamento), nos termos do art. 12, VI-A e art. 22, I, da lei nº 11.340/2006;

d) no teor da descrição dos fatos deverá constar, de maneira sucinta, além do previsto no art. 6 e seus incisos, o contexto de violências às quais a vítima foi submetida, se houver.

Art. 13. Deverá ser anexado, se possível, para envio conforme descrito no art. 12 desta instrução normativa, cópia da seguinte documentação:

I - cédula de identidade ou outro documento com foto da requerente e do requerido;

II - cédula de identidade, certidão de nascimento ou qualquer outro documento dos dependentes menores;

III - comprovante atualizado de residência;

IV - espelho(print) de mensagens em que se observe o número de telefone que a enviou, arquivos de áudio e/ou vídeo, fotos relacionadas ao fato;

V - quaisquer outros documentos ou mídias conexos ao fato que ensejou o requerimento.

CAPÍTULO VII

DA IMEDIATA OITIVA DA VÍTIMA PELA AUTORIDADE POLICIAL

Art. 14. Nos delitos de ação penal pública incondicionada, e nos casos de crime de ameaça com uso de arma de fogo, após o acolhimento da vítima pela equipe plantonista, a vítima será encaminhada à autoridade policial, que tomará por termo suas declarações.

§ 1º A partir da declaração colhida, e indicada a capitulação legal pela autoridade policial, será efetuado o registro da ocorrência e expedidas guias para exames periciais e demais providências adequadas ao caso.

§ 2º Estando a vítima acompanhada de testemunhas, deverá ser procedida às suas oitivas, também de imediato.

§ 3º Não havendo testemunhas presentes naquele ato ou não sendo possível suas oitivas, deverá a autoridade policial plantonista encaminhar as peças/procedimentos para a equipe do expediente, que deverá proceder à intimação de possíveis testemunhas, a fim de serem ouvidas, fazendo ainda constar no termo de declarações, se possível, nomes, telefones e os respectivos lugares onde podem ser encontradas.

§ 4º Não havendo testemunhas, consignar no termo de declarações.

§ 5º Expedir ofícios solicitando provas indiciárias que subsidiem a investigação, a fim de evitar seu perecimento.

Seção I

Dos Crimes Contra d Dignidade Sexual

Art. 15. Tratando-se de crimes contra a dignidade sexual, sem prejuízo do descrito no artigo anterior, deverá ainda a autoridade policial plantonista:

I - encaminhar a vítima ao IML, a fim de se submeter a exame de corpo de delito e/ou sexológico;

II - encaminhar a vítima para a confecção de retrato falado no ICRIM, nos casos de autoria desconhecida;

III - providenciar a coleta de provas que subsidiem a investigação, como roupas usadas pela vítima no momento do crime, ou objetos que tenham relação com a prática deste, a fim de serem encaminhados para exames periciais;

IV - encaminhar a vítima, via ofício, para uma das Unidades de referência na saúde, para profilaxias para mulheres em situação de violência sexual, como exames preventivos, contracepção de emergência, profilaxia para HIV, DST's, e para atendimento multidisciplinar pelo CRAMSV (Centro de Referência de Atendimento à Mulher em situação de violência), caso a vítima manifeste interesse.

V - nas situações em que a vítima relatar que houve estupro, em razão de estar impossibilitada de oferecer resistência ou de consentir (como no caso de estar entorpecida por drogas lícitas ou ilícitas), providenciar seu encaminhamento para coleta de material e/ou realização de exame toxicológico, a fim de verificar se há presença de substância psicotrópica ou alcoólica, ou outro vestígio, para que seja possível avaliar a possibilidade de prática de estupro de vulnerável.

VI - expedir ofícios solicitando imagens de segurança de residências, estabelecimentos comerciais, CIOPS e outros, que deverão ser encaminhados para o Cartório Central da unidade policial no primeiro dia útil subsequente;

VII - No caso de vítimas menores de idade, já expedir a guia para atendimento psicossocial, no IPTCA, para o primeiro dia útil seguinte;

Seção II

Do Crime de Descumprimento de Medida Protetiva de Urgência

Art. 16. Caracterizado o de crime de descumprimento de medida protetiva de urgência e não sendo caso de prisão em flagrante, estando presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, a autoridade policial deverá encaminhar a representação pela cautelar via peticionamento eletrônico no processo em que foi decretada a cautelar protetiva de urgência, conforme legislação em vigor.

Parágrafo único. Em situações de flagrante delito, a autoridade policial deverá representar pela conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva, nas hipóteses legais.

Art. 17. Para a autuação em flagrante ou mesmo representação pela prisão preventiva do acusado, deverá a autoridade policial observar:

I - A decisão concessiva da medida protetiva e sua vigência;

II - A data em que foi citado o requerido.

III - se há pedido de desistência protocolizado pela vítima e homologado pelo juízo competente.

Seção III

Do Crime de Feminicídio em sua Forma Tentada

Art. 18. Os crimes de feminicídio em sua modalidade tentada, fora do horário de expediente ou na impossibilidade de atendimento pela equipe do Departamento de Feminicídio, terão atendimento inicial e acolhimento pelo Plantão Especializado da Mulher, que adotará as providências adequadas que o caso requer para posterior encaminhamento ao setor competente, cabendo à Superintendência de Homicídios promover investigações preliminares, relativas a diligências externas, como levantamento de local do crime.

CAPÍTULO IV

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 19. Situações fáticas não abrangidas nesta instrução normativa poderão ser apresentadas no plantão especializado, que deverá adotar, após avaliação da autoridade policial, todas as medidas legais que o caso requer.

Art. 20. Os procedimentos indicados nesta Instrução Normativa não afastam em quaisquer hipóteses outras medidas legais necessárias ao pronto e eficiente atendimento às vítimas que ingressarem no plantão especializado.

Art. 21. Revogam-se as instruções normativas anteriores que tratam do mesmo assunto.

Art. 22. Esta instrução entra em vigor na data de sua publicação.

São Luís/MA, 04 de junho de 2020.

Leonardo Diniz

Delegado Geral de Polícia Civil