Lei nº 17557 DE 21/07/2022

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 22 jul 2022

Dispõe sobre a criação do Programa Estadual de Regularização de Terras, nos casos em que especifica.

O Governador do Estado de São Paulo:

Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte lei:

Art. 1º Fica criado o Programa Estadual de Regularização de Terras, que autoriza a Fazenda do Estado a transigir e a celebrar acordos, judicialmente ou administrativamente, para fins de alienação, com vistas a prevenir demandas ou extinguir as que estiverem pendentes, em todas as fases dos seguintes processos:

I - discriminatórios;

II - reivindicatórios;

III - regularização de posses em terras devolutas.

Parágrafo único. Os acordos e transações previstos no "caput" deste artigo abrangerão os imóveis em processos descritos nos incisos I, II e III, não podendo implicar a transmissão, ao transigente ou a terceiros, de quaisquer áreas na posse da Administração Pública estadual.

Art. 2º A área objeto dos acordos e transações a que se refere esta lei, não poderá ultrapassar o limite estabelecido no § 1º do artigo 188 da Constituição Federal , salvo naquelas ações discriminatórias ajuizadas e sem o trânsito em julgado declarando devolutas as terras, em respeito ao § 2º do artigo 1.245 da Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil.

§ 1º Aplica-se o disposto no "caput" deste artigo aos casos em que houver multiplicidade de ações discriminatórias contra o mesmo particular.

§ 2º As áreas ocupadas insuscetíveis de regularização por excederem o limite previsto no "caput", poderão ser objeto de titulação parcial até esse limite, conforme dispõe a Lei Federal nº 11.952, de 25 de junho de 2009.

§ 3º Quando houver condomínio, com mais de um proprietário, registrado na matrícula do imóvel, cada condômino poderá requerer a titulação, obedecidos os requisitos desta lei.

§ 4º O acordo ou transação de que trata o § 2º deste artigo será precedido de estudo da regularidade dominial do imóvel a ser realizado pelo Estado, mediante prévia remuneração, pelo particular interessado, dos serviços a serem realizados, com base em tabela de preços dos serviços técnicos, constante de portaria.

§ 5º O ocupante de imóvel que não seja objeto de ação discriminatória e cujas circunstâncias, histórico dominial e localização indiquem a possibilidade de a área de terra ser considerada devoluta, poderá requerer acordo ou transação com a Fazenda do Estado, ficando sujeito à homologação extrajudicial.

Art. 3º Os acordos e transações a que se refere o programa instituído por esta lei, terão por objeto a alienação onerosa de terras devolutas ou presumivelmente devolutas, à pessoa natural e jurídica, mediante pagamento de preço, definido com base em percentual incidente sobre o valor da terra nua, no importe do valor médio por hectare, referente à respectiva região administrativa, constante da tabela oficial do Instituto de Economia Agrícola - IEA, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios - APTA, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento.

§ 1º O percentual a que se refere o "caput" deste artigo, nunca inferior a 10% (dez por cento), será calculado de acordo com as hipóteses e os parâmetros previstos no anexo desta lei, observada a fase processual da ação discriminatória ou da ação reivindicatória, de modo que deverá ser majorado o percentual de acordo com o estágio da fase processual nas respectivas ações judiciais, e reduzido de acordo com o critério da ocupação mansa e pacífica no tempo.

§ 2º O pagamento do preço de que trata o "caput" deste artigo poderá ser feito à vista, com prazo de até 90 (noventa) dias após a homologação, com desconto de 10% (dez por cento), em até 120 (cento e vinte) parcelas mensais e consecutivas, ou em até 10 (dez) parcelas anuais consecutivas, corrigindo-se monetariamente o saldo pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, a cada 12 (doze) meses, ou por índice que venha a substituí-lo.

§ 3º O valor da parcela não poderá ser inferior a 20 (vinte) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPs.

§ 4º Ocorrendo atraso no pagamento de parcela, serão cobrados juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, calculados "pro rata die", e, em caso de atraso superior a 30 (trinta) dias, multa de 2% (dois por cento) sobre o valor da parcela em atraso.

§ 5º Existindo débito pendente, não serão aceitos pagamentos das parcelas subsequentes.

§ 6º A falta de pagamento de 3 (três) parcelas mensais consecutivas ou de 1 (uma) anual, independentemente de notificação ou aviso, acarretará a resolução expressa do instrumento firmado.

§ 7º Ocorrendo qualquer condição resolutiva constante do instrumento, fica a Fazenda do Estado autorizada a adotar as medidas administrativas e judiciais cabíveis, inclusive aquelas necessárias à imissão na posse do imóvel e cancelamento dos registros imobiliários em nome do interessado.

§ 8º A alienação de terras presumivelmente devolutas de que trata o "caput" deste artigo fica condicionada ao prévio reconhecimento, pelo ocupante adquirente, da dominialidade pública do imóvel.

§ 9º Os recursos arrecadados com a alienação onerosa de que trata o "caput" deste artigo serão prioritariamente destinados a políticas públicas de saúde, educação e desenvolvimento social e econômico do Estado, priorizando investimentos nos respectivos municípios onde houver a regularização fundiária.

Art. 4º Os acordos e transações a que se refere o programa instituído por esta lei, serão formalizados por escritura pública, termo de consolidação de domínio ou outro instrumento cabível, identificando-se e descrevendo-se as áreas, preço, condições, detalhes e especificidades do negócio jurídico, de acordo com a legislação aplicável e com a regulamentação da presente lei.

§ 1º A Fazenda do Estado renunciará ao direito de discriminar ou reivindicar as terras alienadas ao particular transigente, desde que devidamente homologado o negócio jurídico.

§ 2º Vetado.

§ 3º Na hipótese de acordo ou transação celebrada após o trânsito em julgado da sentença na fase declaratória da ação discriminatória, a Fazenda do Estado poderá expedir termo de consolidação de domínio em nome do particular transigente, desde que sua área esteja regularmente descrita e caracterizada.

§ 4º Vetado.

§ 5º O instrumento de acordo ou transação lavrado deverá dispor sobre:

1. o prazo e forma de imissão na posse das áreas, devendo se iniciar e estar concluída no intervalo de 30 (trinta) a 45 (quarenta e cinco) dias, contados da celebração do negócio jurídico;

2. com relação ao prazo das parcelas a que alude o § 2º do artigo 3º desta lei, não pode o pagamento da primeira parcela, mensal ou anual, exceder a 15 (quinze) dias, contados da celebração do negócio jurídico.

Art. 5º O instrumento de acordo ou transação a que se refere o programa instituído por esta lei, celebrado com a Fazenda do Estado, não importará a extinção de eventuais ônus ou gravames relativos à área alienada ao particular transigente, nem o eximirá de eventuais ações reipersecutórias de terceiros.

Art. 6º A proposta de acordo ou transação a que se refere o programa instituído por esta lei, deverá ser apresentada em até 18 (dezoito) meses da data de publicação desta lei e será autuada e instruída pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo "José Gomes da Silva" - ITESP.

Art. 7º O interessado instruirá o requerimento com a seguinte documentação, pertinente à demonstração de seu pedido, podendo haver outras exigências definidas em regulamento:

I - comprovação da ocupação da área;

II - certidão imobiliária atualizada;

III - cópia da contestação apresentada na ação discriminatória ou reivindicatória;

IV - comprovação de que vem cumprindo a função social da propriedade rural por meio do Certificado de Cadastro do Imóvel Rural - CCIR, e de acordo com o regulamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA;

V - comprovação de que ocupa a área de modo manso e pacífico, por si ou seus sucessores, pelo ocupante histórico, pelo atual possuidor do imóvel, facultado unir a sua posse direta ou indireta à do antecessor, contada conforme as regras do Código Civil , artigos 1.207 e 1.243 , para efeitos desta lei;

VI - comprovação de que promove exploração direta ou indireta da área rural, por meio do declarado junto ao INCRA/ITR/CCIR.

Parágrafo único. Autuado o requerimento, a Fundação ITESP solicitará à Procuradoria Geral do Estado, em caráter preliminar:

1. cópia da réplica da Fazenda do Estado à contestação;

2. manifestação sobre a legitimidade do interessado para o acordo, eventuais interesses de terceiros e outras questões pertinentes, discutidas judicialmente ou não.

Art. 8º Competirá à Fundação ITESP:

I - a análise, medição e demarcação da área objeto do acordo ou transação, que serão previamente remuneradas pelo particular transigente, com base em tabela de preços dos serviços técnicos, constante de regulamentação;

II - o estudo da regularidade dominial do imóvel, nos termos do § 4º do artigo 3º desta lei;

III - o cálculo do preço, de acordo com o disposto no § 1º do artigo 3º, bem como no anexo desta lei;

IV - a prestação de outros esclarecimentos técnicos de interesse para o exame do assunto.

Parágrafo único. Os serviços de medição e de demarcação referidos no inciso I do "caput" deste artigo poderão ser dispensados, se houver conferência e concordância por parte da Fundação ITESP, em relação à planta e ao memorial descritivo do levantamento topográfico georreferenciado, na forma da lei, apresentados pelo particular transigente.

Art. 9º No exame de cada caso, a Fundação ITESP, além das condições e critérios estabelecidos no programa instituído por esta lei, levará em conta os seguintes fatores:

I - quanto à ação judicial;

II - a situação jurídica do título de domínio de cada imóvel.

Art. 10. Com o parecer da Diretoria Executiva da Fundação ITESP e manifestação do Secretário da Justiça e Cidadania sobre os aspectos estabelecidos no programa instituído por esta lei, o processo será encaminhado à Procuradoria Geral do Estado para exame de viabilidade jurídica.

Parágrafo único. Se o feito estiver em termos, o acordo será firmado pelo Secretário da Justiça e Cidadania e pelo Procurador Geral do Estado.

Art. 11. Vetado.

Art. 12. Fica revogado o artigo 9º da Lei Estadual nº 4.925, de 19 de dezembro de 1985.

Art. 13. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, 21 de julho de 2022

RODRIGO GARCIA

Fernando José da Costa

Secretário da Justiça e Cidadania

Francisco Matturro

Secretário de Agricultura e Abastecimento

Cauê Macris

Secretário-Chefe da Casa Civil

Publicada na Subsecretaria de Gestão Legislativa da Casa Civil, em 21 de julho de 2022.

VETO PARCIAL AO PROJETO DE LEI Nº 277, DE 2022

São Paulo, 21 de julho de 2022

A-nº 020/2022

Senhor Presidente

Tenho a honra de levar ao conhecimento de Vossa Excelência, para os devidos fins, nos termos do artigo 28, § 1º, combinado com o artigo 47, inciso IV, da Constituição do Estado, as razões de veto parcial ao Projeto de lei nº 277, de 2022, aprovado por essa nobre Assembleia, conforme Autógrafo nº 33.263.

De iniciativa parlamentar, a medida objetiva criar o "Programa Estadual de Regularização de Terras", que autoriza a Fazenda do Estado a transigir e a celebrar acordos, judicial ou administrativamente, para fins de alienação, com vistas a prevenir demandas ou extinguir as que estiverem pendentes, em qualquer fase de ações discriminatórias, reivindicatórias e de regularização de posses em terras devolutas (artigo 1º).

De acordo com o "caput" do artigo 2º, a área objeto dos acordos e transações não poderá ultrapassar o limite estabelecido no § 1º do artigo 188 da Constituição Federal , salvo naquelas ações discriminatórias ajuizadas e sem o trânsito em julgado declarando devolutas as terras, dispondo a proposta, ainda, sobre normas procedimentais para que os acordos sejam celebrados.

Associo-me aos objetivos do Legislador, por considerar que a medida poderá contribuir para a resolução dos litígios relacionados às terras devolutas estaduais e, assim, favorecer o desenvolvimento econômico de importantes regiões do Estado.

Todavia, por não se compatibilizarem integralmente com a ordem jurídica vigente, deixo de sancionar os §§ 2º e 4º do artigo 4º e o artigo 11 da proposta, pelas razões adiante expostas.

Ao dispor sobre a exclusão do "particular transigente do polo passivo" e a consequente "exclusão da área transigida do objeto da ação", em razão da "homologação do acordo ou transação judicial", o § 2º do artigo 4º da proposição invade a competência privativa da União em matéria processual, conforme previsto no mencionado artigo 22, I, da Constituição Federal.

Padece do mesmo vício o § 4º do artigo 4º, ao estabelecer que o particular transigente arcará com as despesas processuais, "excluídos honorários advocatícios e custas de sucumbência".

A isso cabe acrescentar que a fixação dos ônus sucumbenciais, bem como a exclusão, ou não, de uma das partes do processo judicial inserem-se no âmbito das atribuições da autoridade judiciária, não sendo lícito, à lei estadual, pretender interferir na atividade jurisdicional, em obediência ao princípio da separação de poderes.

Finalmente, considerando que o poder regulamentar constitui atributo de natureza administrativa, privativo do Chefe do Poder Executivo, nos termos do artigo 47, inciso III, da Constituição Estadual, não cabe ao legislador determinar seu exercício, conforme previsto no artigo 11 do projeto de lei, tendo em vista que a imposição de prazo para a regulamentação da lei não observa o princípio da harmonia entre os poderes do Estado e implica violação da Constituição da República (artigo 2º) e da Carta Paulista (artigo 5º).

Nesse sentido, em julgamento realizado no dia 4 do mês corrente, na ADI nº 4052, que tem por objeto dispositivos e expressões normativas da Constituição do Estado de São Paulo, todos na redação dada pela EC nº 24/2008 , o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade formal das expressões "no prazo nelas estabelecido, não inferior a trinta nem superior a cento e oitenta dias" e "ressalvados os casos em que, nesse prazo, houver interposição de ação direta de inconstitucionalidade contra a lei publicada", inscritas no referido artigo 47, inciso III.

Fundamentado nestes termos o veto parcial que oponho ao Projeto de lei nº 277, de 2022, e fazendo-o publicar no Diário Oficial em obediência ao disposto no § 3º do artigo 28 da Constituição do Estado, restituo o assunto ao oportuno reexame dessa ilustre Assembleia.

Reitero a Vossa Excelência os protestos de minha alta consideração.

Rodrigo Garcia

GOVERNADOR DO ESTADO

Sua Excelência o Senhor Deputado Carlão Pignatari

Presidente da Assembleia Legislativa do Estado.

Publicada na Subsecretaria de Gestão Legislativa da Casa Civil, em 21 de julho de 2022.