Lei nº 18023 DE 22/10/2020
Norma Estadual - Santa Catarina - Publicado no DOE em 23 out 2020
Proíbe a utilização de bórax na confecção de gelecas, slimes e produtos similares, destinados a crianças.
O Governador do Estado de Santa Catarina
Faço saber a todos os habitantes deste Estado que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica proibida a utilização de bórax na confecção de gelecas, slimes e produtos similares, destinados a crianças.
Art. 2º (Vetado)
I - (Vetado)
II - (Vetado)
III - (Vetado)
Art. 3º (Vetado)
Art. 4º A fiscalização e a aplicação do disposto nesta Lei serão realizadas pelos órgãos competentes.
Art. 5º O Poder Executivo regulamentará esta Lei.
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Florianópolis, 22 de outubro de 2020.
CARLOS MOISÉS DA SILVA
Juliano Batalha Chiodelli
Rogério Luiz de Siqueira
Maria Elisa da Silveira De Caro
André Motta Ribeiro
MENSAGEM Nº 549
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE, SENHORAS E SENHORES DEPUTADOS DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO
No uso da competência privativa que me é outorgada pelo § 1º do art. 54 da Constituição do Estado, comunico a esse colendo Poder Legislativo que decidi vetar os arts. 2º e 3º do autógrafo do Projeto de Lei nº 244/2019, que "Proíbe a utilização de bórax na confecção de gelecas, slimes e produtos similares, destinados a crianças", por serem inconstitucionais, com fundamento no Parecer nº 518/2020, da Procuradoria-Geral do Estado (PGE).
Estabelecem os dispositivos vetados:
Arts. 2º e 3º
"Art. 2º O descumprimento desta Lei acarretará ao infrator:
I - advertência, com notificação dos responsáveis para a regularização, no prazo máximo e improrrogável, de 5 (cinco) dias;
II - multa em caso de descumprimento ou da não regularização dentro do prazo estipulado no inciso I deste artigo, ensejará o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), sem prejuízo de aplicação das sanções de natureza civil, penal ou outras definidas em legislação específica;
III - multa em dobro, conforme previsto no inciso II deste artigo, em caso de reincidência.
Art. 3º Os valores arrecadados em decorrência da aplicação de multa serão revertidos para o Fundo Estadual para Reconstituição de Bens Lesados (FRBL)."
Razões do veto
O art. 2º do PL nº 244/2019 está eivado de inconstitucionalidade formal, uma vez que estabelece medidas diversas e menos severas do que aquelas contidas na norma geral sobre proteção sanitária editada pela União (Lei federal nº 6.437, de 20 de agosto de 1977), de observância obrigatória pelos demais entes da Federação, e de inconstitucionalidade material, uma vez que indiretamente mitiga a proteção à saúde das crianças, ao estabelecer penalidades mais brandas do que as contidas na referida Lei federal e na Lei nº 6.320, de 20 de dezembro de 1983 (Código Sanitário do Estado de Santa Catarina), ofendendo, assim, o disposto nos incisos XII e XV do caput e §§ 1º a 4º do art. 24, no art. 196 e no inciso I do caput do art. 203, todos da Constituição da República, e nos incisos XII e XV do caput e §§ 1º a 3º do art. 10, no art. 153 e no inciso I do caput do art. 157, todos da Constituição do Estado.
Já o art. 3º do PL nº 244/2019, ao direcionar as receitas provenientes das multas decorrentes do poder de polícia sanitário ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados (FRBL) e não ao Fundo Estadual de Saúde, contraria o disposto nas Leis federais nº 6.437, de 1977, e nº 4.320, de 17 de março de 1964, e nas Leis nº 6.320, de 1983, nº 5.254, de 27 de setembro de 1976, e nº 15.694, de 21 de dezembro de 2011.
Nesse sentido, a PGE recomendou vetá-los, manifestando-se nos seguintes termos:
Acerca da competência para legislar sobre a matéria, vislumbra-se que assuntos inerentes à saúde e referentes à infância e juventude são de competência concorrente entre União e Estados (artigos 24, XII e XV, e §§ 1º a 4º da CRFB e artigo 10º, XII e XV, e §§ 1º a 3º da CE).
Neste ponto, oportuno esclarecer que a Lei Federal nº 6.437, de 20 de agosto de 1977, que configura infrações à legislação sanitária federal, estabelece as sanções respectivas, restando ao Estado a competência legislativa suplementar. Ocorre que o projeto de lei em questão exorbita esta suplementariedade, ao estabelecer em seu artigo 2º sanções diversas e menos severas que as insculpidas no artigo 2º da Lei Federal nº 6.437/1977.
[.....]
Além disso, as sanções previstas no projeto de lei destoam daquelas insculpidas no Código Sanitário do Estado de Santa Catarina (Lei Estadual nº 6.320, de 20 de dezembro de 1983)
[.....].
De todos os dispositivos colacionados, resta nítida a discrepância entre as sanções trazidas no projeto de Lei em análise e as penalidades que já eram previstas na legislação federal e estadual atinentes ao tema, caracterizando inconstitucionalidade formal, por violação à repartição de competências instituída pela Carta Magna.
Ademais, da análise das penalidades cominadas, também se constata violação aos dispositivos que tratam da proteção da saúde (art. 196 da CF e art. 53 da CE) e da infância e juventude (art. 203, I, da CF e art. 157, I, da CE). Isto porque, ao estabelecer penalidades mais brandas e com valores baixos, não se está protegendo a saúde das crianças, e sim estimulando os fabricantes à continuidade do uso de substância tóxica nos produtos. Deste modo, há inconstitucionalidade material no projeto.
Em relação ao artigo 3º do projeto de lei, também se verifica ilegalidade, pois direciona as multas decorrentes do poder de polícia sanitário ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados - FRBL, quando deveria destiná-las ao Fundo de Saúde.
Os Fundos especiais, disciplinados nos arts. 71 a 74 da referida Lei nº 4.320/1964, instrumento que estatui normas de direto financeiro para a elaboração e controle dos orçamentos públicos, podem ser entendidos como uma forma de gestão autônoma, cujos recursos devem ser aplicados em uma ou mais finalidades específicas, definidas em lei própria. Eis o conceito de fundo especial trazido pela lei:
"Art. 71. Constitui fundo especial o produto de receitas especificadas que por lei se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção de normas peculiares de aplicação."
A Lei Estadual nº 15.694, de 21 de dezembro de 2011, que institui o Fundo para Reconstituição de Bens Lesados - FRBL, assim dispõe em seus artigos 1º a 3º:
"Art. 1º Fica instituído, no Estado de Santa Catarina, o Fundo para Reconstituição de Bens Lesados - FRBL, previsto no art. 13 da Lei federal nº 7.347, de 24 de julho de 1985.
[.....]
Art. 2º O FRBL destina-se a ressarcir a coletividade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, à economia popular, a bens e direitos de valor artístico, histórico, estético, turístico e paisagístico, à ordem urbanística, à ordem econômica, ao patrimônio público ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
[.....]
Art. 3º Constituem receitas do Fundo:
I - as indenizações decorrentes de condenações e acordos judiciais por danos causados aos bens e direitos descritos no artigo anterior e as multas aplicadas em razão do descumprimento de ordens ou de cláusulas naqueles atos estabelecidas;
II - os valores decorrentes de medidas compensatórias, quando convertidas em medidas indenizatórias, estabelecidas em acordo extrajudicial ou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e de multas pelo descumprimento de cláusulas estabelecidas nesses instrumentos; (Redação dada pela Lei nº 16.520/2014)
III - as doações de pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras;
IV - os valores decorrentes de sanções administrativas aplicadas pelo órgão estadual de defesa do consumidor;
V - os rendimentos decorrentes de depósitos bancários e aplicações financeiras, observadas as disposições legais pertinentes;
VI - o valor dos honorários advocatícios fixados em ações civis públicas interpostas e vencidas pelo Ministério Público; e
VII - as transferências orçamentárias provenientes de outras entidades públicas."
Por sua vez, a Lei Estadual nº 5.254, de 27 de setembro de 1976, que cria o Fundo Estadual de Saúde, assim estabelece:
"Art. 1º Fica criado o Fundo Estadual de Saúde - FES, cujo objetivo é apoiar em caráter supletivo os programas de trabalho relacionados com a saúde individual e coletiva e com o meio ambiente, desenvolvidos ou coordenados pela Secretaria da Saúde.
Art. 2º Constituem recursos financeiros do Fundo Estadual de Saúde:
[.....]
VII - as receitas arrecadas em razão do exercício do Poder de Polícia Sanitária, afeta à Secretaria de Estado da Saúde;".
Da leitura dos dispositivos supra, percebe-se que as multas decorrentes de poder de polícia afetos à área sanitária devem ser direcionados ao Fundo de Saúde Estadual, porque a lei criadora deste fundo expressamente estabelece esta vinculação.
Oportuno frisar que tal modelo de destinação também é encontrado na esfera federal, conforme estabelece o artigo 33 da já mencionada Lei Federal nº 6.437/1977 [.....].
Além disso, somente a lei criadora do fundo pode regular seus aspectos elementares, não sendo possível que legislação esparsa e com outro objeto modifique as cláusulas constitutivas de um fundo público, sob risco de deturpação da gênese, função e objetivos do fundo.
Por todo o exposto, conclui-se que o projeto de lei em análise padece de vícios formal e material de inconstitucionalidade frente ao disposto nos artigos 24, XII e XV, e §§ 1º a 4º da CF e artigo 10, XII e XV, e §§ 1º a 3º da CE, artigos 196 da CF e art. 53 da CE e art. 203, I, da CF e art. 157, I, da CE. Ademais, contraria a legislação federal (Leis Federais nº 6.437/1977 e nº 4.320/1964) e a legislação estadual (Leis Estaduais nº 6.320/1983, 5.254/1976 e 15.694/2011).
Essas, senhores Deputados, são as razões que me levaram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais submeto à elevada apreciação dos senhores Membros da Assembleia Legislativa.
Florianópolis, 22 de outubro de 2020.
CARLOS MOISÉS DA SILVA
Governador do Estado