Lei nº 22612 DE 11/04/2024
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 11 abr 2024
Dispõe sobre a Declaração Estadual de Direitos de Liberdade Econômica e sobre a atuação do Estado como agente normativo regulador, bem como suplementa, na administração pública direta, autárquica e fundacional do Estado de Goiás, a Lei federal nº 13.874/2019, para ampliar o alcance das garantias fundamentais à livre iniciativa, ao livre exercício de atividade econômica e à proteção dos valores sociais do trabalho.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE GOIÁS, nos termos do art. 10 da Constituição Estadual, decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I - DO OBJETO E DO ÂMBITO DE APLICAÇÃO
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a Declaração Estadual de Direitos de Liberdade Econômica e sobre a atuação do Estado como agente normativo regulador, bem como suplementa, na administração pública direta, autárquica e fundacional do Estado de Goiás, a Lei federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, para ampliar o alcance das garantias fundamentais à livre iniciativa, ao livre exercício de atividade econômica e à proteção dos valores sociais do trabalho.
CAPÍTULO II - DA DECLARAÇÃO ESTADUAL DE DIREITOS DE LIBERDADE ECONÔMICA
Art. 2º São princípios que norteiam o disposto nesta Lei:
I - a liberdade como uma garantia no exercício de atividades econômicas;
II - a presunção de boa-fé do particular;
III - a intervenção subsidiária, mínima e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas; e
IV - o reconhecimento da vulnerabilidade do particular perante o Estado.
Art. 3º Para os fins do disposto nesta Lei, consideram-se atos públicos de liberação de atividade econômica a licença, a autorização, a inscrição, o registro, o alvará e os demais atos exigidos com qualquer denominação, inclusive nos âmbitos ambiental, sanitário e de edificação, por órgão ou entidade da administração pública na aplicação de legislação, também como condição prévia para o exercício de atividade econômica, inclusive o início, a instalação, a operação, a produção, o funcionamento, o uso, o exercício ou a realização, nos âmbitos público ou privado, de atividade, serviço, estabelecimento, profissão, instalação, operação, produto, equipamento, veículo, edificação e outros.
Art. 4º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, de direito público ou privado, de fato ou de direito, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômico do Estado, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal:
I - desenvolver atividade econômica de baixo risco, para a qual se valha exclusivamente de propriedade privada própria ou de terceiros consensuais, sem a necessidade de quaisquer atos públicos de liberação da atividade econômica, ressalvada a obrigatoriedade de inscrição cadastral;
II - desenvolver atividade econômica em qualquer horário ou dia da semana, inclusive feriados, sem que para isso esteja sujeito a cobranças adicionais de tributos, tarifas ou encargos pelo Estado, observadas:
a) as normas de proteção à saúde e ao meio ambiente, incluídas as de combate à poluição sonora e à perturbação do sossego público;
b) as restrições advindas de contrato, de regulamento condominial ou de outro negócio jurídico, bem como as decorrentes das normas de direito real, incluídas as de direito de vizinhança;
c) a legislação trabalhista; e
d) as disposições de órgãos reguladores de funcionamento e horários especiais para determinadas atividades econômicas;
III - receber tratamento isonômico de órgãos e de entidades da administração pública ou de quem em nome dela agir, quanto ao exercício de atos de liberação da atividade econômica, hipótese em que o ato de liberação estará vinculado aos mesmos critérios de interpretação adotados em decisões administrativas análogas anteriores, observado o disposto em regulamento;
IV - gozar de presunção de boa-fé nos atos praticados no exercício da atividade econômica, para os quais as dúvidas de interpretação dos direitos civil, empresarial, econômico e urbanístico serão resolvidas de forma a preservar a autonomia privada, exceto se houver expressa disposição legal em contrário;
V - ter acesso público, amplo e simplificado aos processos e aos atos de liberação de atividade econômica, observadas as disposições da Lei federal nº 13.709 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD), de 14 de agosto de 2018;
VI - ter a garantia de que, nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica que se sujeitam ao disposto nesta Lei, apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o particular será cientificado expressa e imediatamente do prazo máximo estipulado para a análise de seu pedido e de que, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei ou decreto; e
VII - arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital, conforme técnica e requisitos estabelecidos em regulamento, hipótese em que se equiparará a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público.
§ 1º Excetuam-se do disposto nesta Lei as autorizações a título precário de uso de área pública, e é obrigatório em tais casos o cumprimento das normas de localização e observância dos produtos ou das mercadorias que poderão ser comercializados no local, conforme a legislação estadual em vigor.
§ 2º Os atos e as decisões administrativas referentes a atos de liberação da atividade econômica deverão permanecer disponíveis para acesso na página eletrônica do respectivo órgão ou entidade, para a garantia da transparência, da publicidade e da segurança administrativa, conforme o inciso IV do art. 3º da Lei federal nº 13.874, de 2019.
§ 3º Ficam dispensados o reconhecimento de firma e a autenticação de cópia dos documentos expedidos no país que sejam destinados a fazer prova em órgãos e entidades da administração estadual direta e indireta, salvo dúvida fundada acerca da autenticidade do documento.
§ 4º A aprovação tácita prevista no inciso VI do caput deste artigo não se aplica quando a titularidade da solicitação for de agente público ou de seu cônjuge, companheiro ou parente em linha reta ou colateral, por consanguinidade ou afinidade, até o 3º (terceiro) grau, dirigida à autoridade administrativa ou política do próprio órgão ou entidade da administração pública em que desenvolver suas atividades funcionais.
§ 5º Os prazos a que se refere o inciso VI do caput deste artigo serão definidos individualmente pelo órgão ou pela entidade da administração pública solicitados no momento do pedido, observados os parâmetros uniformes do próprio órgão ou da entidade, e não ultrapassarão 60 (sessenta) dias para atos relacionados a atividade de médio risco e 120 (cento e vinte) dias para atos relacionados a atividade de alto risco, salvo na hipótese de legislação que preveja prazos administrativos superiores, ocasião em que a administração observará a normatização específica incidente.
§ 6º Na contagem dos prazos previstos no § 5º deste artigo, não se computará o tempo em que a administração necessitar diligenciar, perante o particular, a complementação da instrução do processo ou existirem obstáculos que, excepcional e motivadamente, dificultarem ou impedirem a análise do pedido formulado.
Art. 5º Serão consideradas atividades econômicas de baixo risco as assim regulamentadas por decreto estadual.
Art. 6º As atividades econômicas de baixo risco serão fiscalizadas em momento posterior, de ofício ou em razão de denúncia, a fim de averiguar se o estabelecimento está em conformidade com as normas pertinentes ao ramo da atividade econômica.
§ 1º O primeiro ato de fiscalização da atividade será orientador e assinalará, por meio de notificação, prazo para a adequação de eventuais inconformidades constatadas, exceto na ocorrência de risco iminente à saúde pública, reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização e outra condição relevante de risco constatada pelo agente público, caso em que caberá à administração pública o ônus de demonstrar, de forma expressa e excepcional, a imperiosidade da eventual restrição.
§ 2º O critério da dupla visita deve ser observado para a lavratura de autos de infração e a aplicação de penalidades decorrentes do exercício de atividade considerada de baixo risco, exceto na ocorrência de risco iminente à saúde pública, reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização e outra condição relevante de risco constatada pelo agente público.
§ 3º Considera-se observado o critério da dupla visita quando, no ato da fiscalização, houver auto de infração ou notificação preexistente, emitido pelo Estado ou outra autoridade competente que aponte expressamente a irregularidade encontrada.
§ 4º O critério da dupla visita não afasta o dever de adequação à legislação vigente.
Art. 7º O particular que, por si ou por seu representante, fizer declarações falsas ou omitir dolosamente circunstâncias relevantes na autodeclaração estará sujeito à aplicação de multa pelo órgão responsável pelo licenciamento, sem prejuízo a outras sanções previstas em lei.
§ 1º A multa será graduada de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida, a condição econômica do declarante, a reincidência do infrator e/ou as circunstâncias agravantes ou atenuantes e será aplicada mediante procedimento administrativo, conforme disposto em decreto.
§ 2º O valor da multa não será inferior a 0,1% (um décimo por cento) nem superior a 10% (dez por cento) do faturamento bruto dos exercícios financeiros a partir de quando a infração houver sido praticada.
CAPÍTULO III - DAS GARANTIAS DE LIVRE INICIATIVA
Art. 8º É dever da administração pública e das demais entidades que se vinculam a esta Lei, no exercício de regulamentação de norma pública pertencente à legislação sobre a qual versa, exceto se em estrito cumprimento à previsão explícita em lei, evitar o abuso do poder regulatório de maneira a, indevidamente:
I - criar reserva de mercado ao favorecer, na regulação, grupo econômico ou profissional, em prejuízo aos demais concorrentes;
II - redigir enunciados que impeçam a entrada de novos competidores nacionais ou estrangeiros no mercado;
III - exigir especificação técnica que não seja necessária para atingir o fim desejado;
IV - redigir enunciados que impeçam ou retardem a inovação e a adoção de novas tecnologias, processos ou modelos de negócios, ressalvadas as situações consideradas em regulamento como de alto risco;
V - aumentar os custos de transação sem demonstração de benefícios;
VI - criar demanda artificial ou compulsória de produto, serviço ou atividade profissional, inclusive de uso de cartórios, registros ou cadastros;
VII - introduzir limites à livre formação de sociedades empresariais ou de atividades econômicas; e
VIII - restringir o uso e o exercício da publicidade e da propaganda sobre um setor econômico, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei.
CAPÍTULO IV - DA ANÁLISE DE IMPACTO REGULATÓRIO
Art. 9º As propostas de edição e de alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados editadas por órgão ou entidade da administração pública estadual, incluídas as autarquias e as fundações públicas, serão precedidas, sempre que for possível, da realização de análise de impacto regulatório, que conterá informações e dados sobre os possíveis efeitos do ato normativo, para verificar a razoabilidade do seu impacto econômico.
§ 1º O Poder Executivo poderá editar regulamento sobre o conteúdo e a metodologia da análise de impacto regulatório, sobre os quesitos mínimos a serem objeto de exame e sobre as hipóteses em que a referida análise poderá ser dispensada.
§ 2º A análise de impacto regulatório de que trata o caput deste artigo será disponibilizada no sítio eletrônico oficial do órgão ou da entidade por ela responsável, em local de fácil acesso, também com a informação sobre as fontes de dados utilizadas para a análise, preferencialmente em formato de planilha de dados, sem prejuízo à divulgação em outros locais ou formatos de dados.
CAPÍTULO V - DO CONSELHO CONSULTIVO DE LIBERDADE ECONÔMICA - CCLE
Art. 10. Fica instituído o Conselho Consultivo de Liberdade Econômica - CCLE, órgão técnico de caráter não vinculativo, que tem por atribuição, entre outras, apoiar o Poder Executivo na definição das atividades de baixo risco, conforme o inciso I do art. 4º e o art. 5º desta Lei.
Art. 11. Compete ao CCLE:
I - apoiar o Poder Executivo na definição e/ou na alteração das atividades de baixo risco;
II - colaborar na elaboração de normas complementares para o cumprimento do disposto nesta Lei;
III - apresentar ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo as propostas de melhoria da legislação estadual referente à liberdade econômica;
IV - identificar as dificuldades burocráticas enfrentadas pelas atividades econômicas e produtivas e formular estratégias para simplificar, desburocratizar e reduzir o tempo e o custo regulatório dessas atividades, para fortalecer o empreendedorismo em todas as esferas de governo;
V - elaborar e encaminhar ao Chefe do Poder Executivo relatório com a avaliação do tempo médio e do custo econômico regulatório por atividade, bem como o mapeamento métrico com os indicadores e as indicações para que sejam adotadas as medidas corretivas ou de aperfeiçoamento necessárias;
VI - desenvolver métricas e indicadores para a elaboração do relatório tratado no inciso V do caput deste artigo;
VII - realizar e coordenar estudos técnicos, oficinas e encontros para a discussão de temas relacionados à liberdade econômica;
VIII - emitir parecer opinativo, mediante solicitação do Chefe do Poder Executivo, acerca de temas relacionados à liberdade econômica;
IX - manter ouvidoria destinada ao recebimento de reclamações e de denúncias sobre a inobservância, por parte das autoridades estaduais ou municipais, das normas relacionadas à liberdade econômica;
X - analisar o impacto regulatório dos projetos normativos de que trata o inciso II do caput deste artigo;
XI - elaborar o seu regimento interno e as suas normas de atuação; e
XII - encarregar-se de outras competências relacionadas à execução desta Lei.
§ 1º O CCLE será composto pelos seguintes membros:
I - 1 (um) representante da Secretaria-Geral de Governo - SGG;
II - 1 (um) representante da Diretoria-Executiva do Instituto Mauro Borges - IMB, da SGG;
III - 1 (um) representante da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás;
IV - 2 (dois) representantes do Fórum das Entidades Empresariais de Goiás - Fórum Empresarial;
V - 1 (um) representante da Ordem dos Advogados do Brasil; e
VI - 1 (um) representante do Sistema S.
§ 2º A participação no CCLE é considerada atividade relevante e não remunerada.
§ 3º O CCLE terá a direção alternada entre as cadeiras dos membros indicados anualmente, e não haverá cumulação ou reeleição até que todas as cadeiras indicadas passem pela direção.
CAPÍTULO VI - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 12. Os direitos tratados nesta Lei devem ser compatibilizados com as normas de segurança nacional, de segurança pública, ambientais, sanitárias ou de saúde pública.
Parágrafo único. As normas específicas, federais ou estaduais, que tratem de atos públicos de liberação ambiental, sanitária, de saúde pública ou de proteção contra incêndio deverão prevalecer em caso de conflito com o disposto nesta Lei.
Art. 13. Os direitos de que trata esta Lei não se aplicam às normas de direito tributário e não prejudicam a incidência dos tributos estaduais e as regras estabelecidas na legislação tributária estadual.
Art. 14. O disposto nesta Lei não se aplica ao direito tributário, ao direito financeiro, bem como aos serviços públicos previstos na Constituição do Estado de Goiás e já regulados por lei específica.
Art. 15. O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de 90 (noventa) dias do início de sua vigência.
Art. 16. Esta Lei entra em vigor 45 (quarenta e cinco) dias após a sua publicação.
Goiânia, 11 de abril de 2024; 136º da República.
RONALDO CAIADO
Governador do Estado