Parecer GEOT nº 145 DE 29/10/2020
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 29 out 2020
IPVA. Isenção para CFC. Revogação do benefício. Dispensa de encargos moratórios e prazo para pagamento. Leis nºs 19.616/2017 e 20.815/2020; art. 130, parágrafo único do CTE-GO.
I - RELATÓRIO
(...) solicita sejam expurgados do cálculo para pagamento do IPVA 2019, devido pelos Centros de Formação de Condutores em face da Lei nº 20.815, de 23 de julho de 2020, as multas, os juros e demais custas e concedido, de maneira pontual, um prazo pré-estabelecido para o referido pagamento.
Relata que a publicação da Lei nº 20.815/2020, revogatória da Lei nº 19.616 de 05 de abril de 2017, que trata da isenção de IPVA para veículos de Centros de Formação de Condutores, impactou abruptamente nas despesas operacionais destes últimos, podendo, inclusive, ocorrer o fechamento de muitos permissionários visto que a cobrança de juros e multas são desproporcionais.
Alega que não houve desrespeito à norma atual e que o imposto relativo aos períodos anteriores foi devidamente pago; que não pode os Centros de Formação ser penalizados por uma lei posterior, promulgada em 23/07/2020, não havendo falar em perda de prazo para pagamento vez que somente em agosto/2020 a categoria foi cientificada da obrigatoriedade de pagamento do IPVA do ano de 2019.
Acrescenta que, no atual momento de pandemia e crise financeira no País, as atividades e receitas não se encontram em pleno funcionamento junto ao DETRAN-GO, tornando-se oneroso o cumprimento das obrigações tributárias acumuladamente para os exercícios de 2019 e 2020.
Em face das considerações, solicita sejam expurgados do cálculo para pagamento do IPVA 2019 as multas, os juros e demais custas e concedido, de maneira pontual, um prazo pré-estabelecido para o referido pagamento, extensivamente aos veículos que já foram de propriedade dos CFCs e que foram vendidos/substituídos, juntamente com os veículos que já estão isentos do pagamento do tributo.
II - FUNDAMENTAÇÃO
A isenção a que se refere o requerente foi instituída pela Lei nº 19.616 de 05 de abril de 2017, com alterações conferidas pelas Leis nºs 19.701/17, 19.867/17, 20.011/18 e 20.441/19, para utilização até o exercício de 2020.
Por força de decisão liminar no processo judicial nº 5085283.57.2019.8.09.0051, em trâmite na 4ª Vara da Fazenda Pública do Estado de Goiás, a Lei nº 19.616/17, considerada não consonante com requisitos pré-estabelecidos na Lei Complementar nº 101/00 - Lei de Responsabilidade Fiscal, teve seus efeitos suspensos a partir de 15/07/2019. Posteriormente, foi revogada pelo legislativo estadual, com sanção do executivo, a partir de 1º de janeiro de 2019, por meio da Lei nº 20.815, de 23 de julho de 2020.
Ilustre-se o excerto abaixo, do Parecer nº 005978/2015-PTR/CCOn, da Procuradoria Tributária da PGE:
“não tem o administrador público liberdade em deixar de aplicar uma norma legal ao singelo argumento de conter ela vícios que a tornem inconstitucional, sem que antes haja manifestação, ainda que cautelar, do órgão jurisdicional competente e pelos instrumentos constitucionais adequados, o que se aplica à autoridade fiscal, ainda que esta desenvolva “atividade vinculada de lançamento de ofício”, vez que inexiste controle de constitucionalidade corretivo, realizado pela própria Administração, consistente na recusa à aplicação da lei ou ato normativo que viole a Constituição.”
Semelhantes são as disposições seguintes da Lei nº 16.469, de 19 de janeiro de 2009, a respeito dos processos apreciados pelo Conselho Administrativo Tributário – CAT:
“Art. 6º Compete ao Conselho Administrativo Tributário -CAT- apreciar:
(...)
§ 4º Não será proferida decisão que implique afastamento da aplicação de lei sob alegação de inconstitucionalidade, ressalvadas as hipóteses em que esta tenha sido declarada pelo Supremo Tribunal Federal -STF- em:
I - ação direta de inconstitucionalidade;”
Enquanto não sobrevenha declaração de inconstitucionalidade da lei ou enquanto não revogada, ela permanece formalmente válida e juridicamente eficaz. Assim, resta claro que não cabia à autoridade fiscal denegar a isenção, ao tempo em que o contribuinte fruiu o benefício legalmente amparado.
Dispõe a Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional – CTN:
“Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda:
(...)
III - que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no artigo 178.
(...)
Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104. (Redação dada pela Lei Complementar nº 24, de 1975)” (g.n.)
Embora a Exposição de Motivos nº 59/19-GSE, de 10/09/19, que acompanhou a proposta ao Executivo de revogação do benefício, tenha sugerido que a lei revogadora produzisse efeitos a partir de 1º de janeiro de 2020, em atenção ao princípio da anterioridade, a Lei nº 20.815/2020 retroagiu seus efeitos a 1º de janeiro de 2019, data-fim da isenção.
A Lei, como citado acima, cumpre-se. Desse modo, igualmente não resta dúvida quanto ao nascimento da obrigação tributária de pagar o IPVA 2019, a partir da publicação da Lei nº 20.815/2020, retroativamente a 1º de janeiro de 2019, ainda que em nome da não-surpresa e da segurança jurídica para o contribuinte não tenha sido observado o princípio da anterioridade. De acordo com o art. 91, IV do CTE-GO, ocorre o fato gerador do IPVA na data em que ocorrer a perda da isenção.
Deve-se, nesse contexto, buscar uma solução moderadora, contudo esteada nos permissivos da legislação tributária.
Na esfera estadual, a norma mestra que regula os tributos é a Lei nº 11.651, de 26 de dezembro de 1991, que instituiu o Código Tributário Estadual – CTE-GO, de onde se pode extrair os principais fundamentos que norteiam as ações/decisões da autoridade fiscal goiana. Dessa forma, vislumbra-se a possibilidade de atendimento à solicitação do requerente no dispositivo a seguir:
“Art. 130. Nenhum procedimento intentar-se-á contra o sujeito passivo que agir de conformidade com instruções escritas de órgãos competentes da Secretaria da Fazenda, exceto quando se tratar de falta de pagamento de tributo.
Parágrafo único. Na hipótese deste artigo, o pagamento far-se-á sem qualquer acréscimo, ainda que de caráter moratório.” (g.n.)
Dispõe o art. 106 do CTE-GO que as infrações relacionadas com o IPVA são punidas com as multas ali especificadas, entre elas a relativa à não quitação do imposto no prazo previsto no calendário de pagamento. No caso em análise, não se pode dizer que houve uma infração, vez que o imposto relativo ao ano de 2019 só veio a ser exigível para os beneficiários da isenção a partir da publicação da Lei nº 20.815/2020, ou seja, no exercício seguinte ao vencimento do aludido imposto.
Desse modo, parece correto que o IPVA 2019 seja exigido nos termos do parágrafo único do art. 130 do CTE-GO, sem acréscimos moratórios, vale dizer, o tributo principal apenas corrigido monetariamente até a data do pagamento, com o fito de trazer ao presente o valor a que o Estado teria direito no vencimento original, conforme exigência do art. 168 do CTE-GO: “O tributo não pago no vencimento deve ser atualizado monetariamente em função da variação do poder aquisitivo da moeda.”
Quanto ao prazo para pagamento solicitado, não há previsão normativa para tal. Todavia, com base na analogia prevista no art. 108 do CTN, presume-se aplicável o prazo de 20 (vinte) dias contados da ciência ao contribuinte da decisão proferida nestes autos, a exemplo do empregado no processo de consulta, conforme o art. 50 da Lei nº 16.469/2009, que prescreve: “Nenhum procedimento fiscal, salvo no caso de ocorrência das situações previstas no art. 49, pode ser iniciado contra o sujeito passivo consulente, em relação à matéria objeto da consulta, no período entre a protocolização do Processo de Consulta e 20 (vinte) dias contados da data que o consulente tiver ciência da resposta.”
III – CONCLUSÃO
Com base no exposto, firma-se e seguinte entendimento:
O IPVA 2019, devido pelo contribuinte em face da Lei nº 20.815/2020, revogadora da Lei nº 19.616/2017, que trata da isenção de IPVA para veículos de Centros de Formação de Condutores, pode ser exigido, nos termos do parágrafo único do art. 130 do CTE-GO, sem acréscimos moratórios, ou seja, o tributo principal apenas corrigido monetariamente até a data do pagamento, com o fito de trazer ao presente o valor a que o Estado teria direito no vencimento original, conforme exigência do art. 168 do CTE-GO.
Quanto ao prazo para pagamento sem acréscimos moratórios, com base na analogia prevista no art. 108 do CTN, presume-se aplicável o prazo de 20 (vinte) dias contados da ciência ao contribuinte da decisão proferida nestes autos, a exemplo do empregado no processo de consulta, conforme o art. 50 da Lei nº 16.469/2009.
É o parecer.
GERÊNCIA DE ORIENTAÇÃO TRIBUTÁRIA, aos 29 dias do mês de outubro de 2020.
Documento assinado eletronicamente por OLGA MACHADO REZENDE, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 29/10/2020, às 14:36, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.
Documento assinado eletronicamente por ELIZABETH DA SILVA FERNANDES FARIAS, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 29/10/2020, às 15:33, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.