Parecer GEOT nº 176 DE 14/09/2021

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 14 set 2021

ICMS. Insumos. Tratamento tributário de partes e peças usadas na linha de produção.

I – RELATÓRIO

(...), inscrita no CNPJ/MF sob o nº (...) e no CCE/GO sob o nº (...), com sede na (...), solicita esclarecimentos acerca do tratamento tributário de partes e peças usadas na linha de produção.

Informa que atua no ramo de indústria e comércio de móveis, predominantemente de madeira, estando cadastrada sob o CNAE 31.01-2-00 – Fabricação de móveis com predominância de madeira.

Relata que no processo de fabricação utiliza brocas, fresas e serras que são ferramentas de corte imprescindíveis utilizadas em equipamentos apropriados que se consomem e se inutilizam durante o processo pelo contato direto com as matérias-primas, sendo necessária sua reposição em intervalos de tempo.

Em seguida, elabora as seguintes perguntas:

1 – A aquisição de partes e peças que serão aplicadas em reposição ou manutenção de máquinas e equipamentos do parque industrial de uma empresa é considerado material de uso e consumo? Tem direito a benefícios fiscais tais como redução da base de cálculo ou isenção?

2 – A aquisição de partes e peças que serão aplicadas na primeira montagem de máquinas e equipamentos do parque industrial na fase pré-operacional, compõem o ativo imobilizado?

3 – Os materiais citados constituem ferramentas de corte e desbaste imprescindíveis para a fabricação do produto final, sendo assim a consulente poderá classificar essas peças como compra de matérias-primas e consequentemente aproveitar o crédito do ICMS destacado em suas notas fiscais de aquisição?

4 – Sendo positiva a resposta anterior, poderá o fornecedor excluir da base de cálculo do ICMS o valor do IPI, mediante declaração expressa da consulente quanto ao uso e aplicação dos materiais adquiridos?

5 – Na aquisição de peças de alto custo (fresas, brocas e serras) para reposição ou manutenção de máquinas e equipamentos industriais, a consulente poderá classificar essas operações como compra para uso e consumo ou ativo imobilizado e qual CFOP utilizar, o de número 1.556/2.556 – Compra de material para uso ou consumo, ou o 1.551/2.551 – Compra de bem para o ativo imobilizado?

6 – Na aquisição de peças de alto custo (fresas, brocas e serras) para reposição ou manutenção de máquinas e equipamentos industriais, provenientes de outros estados da federação, para serem utilizados na fabricação de seus produtos, estaria a consulente isenta do ICMS diferencial de alíquotas, conforme artigo 6º, XCII, Anexo IX do RCTE, quando considerada compra para o ativo imobilizado?

II – FUNDAMENTAÇÃO

A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, em consonância com a Constituição Federal (artigo 155, II, §2º, I), assegura ao contribuinte do ICMS o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

No tocante ao contribuinte industrial, as entradas de mercadorias ou produtos que, utilizados no processo industrial, não forem nele consumidos ou não integrem o produto final na condição de elemento indispensável a sua composição, são consideradas entradas que não possuem relação com saídas futuras, não podendo se falar em princípio da não-cumulatividade do imposto e, portanto, não dão direito ao aproveitamento de crédito.

Nesse sentido, foi editada a Instrução Normativa nº 990/10-GSF, de 9 de abril de 2010, que dá interpretação aos termos “produto intermediário” e “material de embalagem” para fins de aproveitamento de créditos de ICMS pelo estabelecimento industrial ou extrator mineral ou fóssil, da qual destacamos os dispositivos abaixo para solução dos questionamentos apresentados:

(...)

Art. 2º Para os efeitos desta instrução, deve ser observado o seguinte:

I - a expressão “linha de produção” compreende:

a) a linha principal de produção, correspondente aos processos que atuam sobre a matéria-prima ou produtos intermediários nela aplicados, na sequência dos eventos da produção, até a obtenção do produto acabado;

b) as linhas de produção auxiliares à principal que objetivam fornecer partes integrantes do produto acabado à linha principal ou exercer sobre estas partes quaisquer operações com a finalidade de aperfeiçoá-las;

(...)

Art. 3º Considera-se produto intermediário a mercadoria integrada ou consumida no processo industrial.

§ 1º Considera-se integrada ao produto em fabricação a mercadoria adquirida para emprego em processo industrial que venha a se incorporar ao produto final por meio de combinação química ou por adjunção física.

§ 2º Considera-se consumido no processo de industrialização o produto individualizado que, embora não se integre ao produto em fabricação, seja consumido de forma direta e integral no referido processo, observado o seguinte:

I - é produto individualizado aquele que goza de autonomia, atua de forma específica no processo produtivo e não faz parte de uma estrutura maior, estável e duradoura, não se constituindo, dessa forma, parte, peça, componente ou acessório de máquina, ferramenta ou equipamento;

II - é consumido de forma direta no processo de industrialização o produto individualizado cuja participação no referido processo dê-se por meio de contato físico direto com o produto em fabricação em qualquer ponto da linha de produção da mercadoria;

III - é consumido de forma integral no processo de industrialização o produto individualizado que:

a) sofra esgotamento instantâneo em decorrência de sua utilização no referido processo;

b) desde o início de sua utilização dentro da linha de produção, vai sofrendo, gradativamente, perda de suas propriedades físicas ou químicas, em decorrência do cumprimento de sua função no processo industrial, de forma que fique impossibilitada sua recuperação ou restauração.

§ 3º Revogado

§ 4º Não se considera consumido no processo de industrialização o produto individualizado que, embora satisfaça as condições do caput deste artigo, esteja compreendido no ativo imobilizado do estabelecimento.

Observa-se que as mercadorias ou os produtos que não sejam integrados ao produto em fabricação (artigo 3º, § 1ª) só serão produtos intermediários se forem consumidos no processo de industrialização, nos termos do parágrafo 2º do artigo 3º transcrito, devendo atender, de forma concomitante, as disposições dos três incisos.

Por outro lado, um produto ou mercadoria será matéria prima quando nele se iniciar o processo industrial que resulta no produto final, seja pela agregação de outros produtos ou por transformação física ou química.

Vejamos ainda o que diz o dicionário Michaelis, encontrável no endereço eletrônico https://michaelis.uol.com.br/:matéria-primasf

1 Substância bruta principal, insumo básico a partir do qual se fabrica determinado produto ou bem.

2 FIG Aquilo a partir do qual se inicia alguma coisa que ainda se encontra em estado bruto; base, fundamento.

No que concerne ao aproveitamento do crédito por empresa que não iniciou suas atividades, durante a aquisição dos bens destinados ao ativo imobilizado, faz-se necessária a leitura do artigo 58 do Código Tributário Estadual, CTE, o qual, reproduzindo a regra da Lei Complementar nº 087/96, dispõe:

Art. 58. É assegurado ao sujeito passivo, nos termos do disposto na legislação tributária, o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações ou prestações resultantes:

I - de entrada de mercadoria, real ou simbólica, no seu estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo imobilizado;

(... )

§ 6º A apropriação do crédito decorrente da entrada de bem destinado ao ativo imobilizado é feita à razão de 1/48 (um quarenta e oito avos) por mês, proporcionalmente aumentada ou diminuída, pro rata die, se o período de apuração for superior ou inferior a um mês, devendo ser observado o seguinte:

I - a apropriação do crédito é o resultado da multiplicação da razão de 1/48 (um quarenta e oito avos) pelo resultado da divisão entre as operações ou prestações tributadas e o total das operações ou prestações ocorridas no período de apuração, equiparando-se às tributadas as saídas e as prestações com destino ao exterior;

II - a primeira apropriação deve ocorrer no mês de entrada do bem no estabelecimento;

III - o saldo remanescente do crédito passível de apropriação deve ser cancelado, quando:

a) ocorrer o final do quadragésimo oitavo mês, contado da data da entrada do bem no estabelecimento;

b) houver a alienação do bem antes de completado o quadragésimo oitavo mês;

IV - o crédito deve ser escriturado, conforme dispuser o regulamento:

a) juntamente com os demais créditos, na forma dos incisos I e II deste parágrafo;

b) integralmente, em livro próprio ou de outra forma.

O assunto já foi tratado por essa Gerência, por meio do Parecer nº 998/2008 – GEOT, de onde transcrevemos trechos que ajudam na solução da presente consulta, em que pese as modificações posteriores trazidas pela adoção da escrituração fiscal digital:

Parecer nº 998/2008 – GEOT

(...)

Ao estabelecer que a parcela do crédito a ser apropriada deve ser obtida levando-se em consideração a existência de operações tributadas realizadas pelo contribuinte no período de apuração, a regra do artigo 58, § 6º, inciso I, CTE, abrangeu apenas os casos em que a empresa, já em atividade, adquire bens para o seu ativo imobilizado; não tratando, portanto, das hipóteses em que a empresa, em fase pré-operacional, adquire os bens a serem integrados ao seu ativo imobilizado, nem trata dos casos em que os bens não são imobilizados imediatamente (dependendo de montagem).

Tendo em vista a necessidade de se conferir interpretação da norma jurídica de forma a manter a sua coerência interna, entendemos que a regra do artigo 58, § 6º, inciso I, do CTE, em casos como o que ora se discute, deve ser interpretada no sentido de permitir que a consulente exerça o direito ao crédito em discussão no período(mês) em que iniciar as suas atividades, desde que ocorram saídas tributadas ou não tributadas com manutenção de crédito.

Assim, quando, em fase pré-operacional, a consulente adquirir partes e peças para a montagem de um bem a ser imobilizado, acompanhadas de diversas notas fiscais emitidas por um ou mais fornecedores, deve registrar as respectivas notas fiscais em seu livro Registro de Entradas, sem crédito, bem como deve escriturar referidas notas no livro de Controle de Crédito de ICMS do Ativo Permanente -CIAP, modelo “C”, na forma do artigo 352, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c” e “d”, do  RCTE (sem apropriação da parcela mensal).

(...)

Quanto ao exercício do direito de apropriar-se dos créditos relativos ao imobilizado, a consulente deve, no mês em que iniciar a sua atividade e promover saídas tributadas, requerer ao Delegado Fiscal da sua circunscrição autorização para creditar-se das parcelas não apropriadas por ocasião da entrada do bem, partes e peças para montagem de bem, em seu estabelecimento, na forma do artigo 52 c/c artigo 58 do RCTE. Neste caso, entendemos que a referida autoridade poderá autorizar a consulente a apropriar-se do crédito seguindo o critério previsto no artigo 58, § 6º, inciso I, do CTE.

Finalmente, consignamos que deve ser considerado como termo inicial para a contagem do prazo prescricional, previsto no artigo 58, § 6º, inciso III, alínea “a’, do CTE, a data de início das atividades da consulente. Esta afirmativa funda-se no entendimento de que, nos termos da norma tributária, o exercício do direito de apropriação da parcela do crédito está condicionado à ocorrência de saídas tributadas e estas somente ocorrerão após o início da atividade industrial. Afinal, não é juridicamente admissível que se inicie a contagem de um prazo prescricional, para o exercício de um direito, antes da efetivação (implementação) das condições impostas pela própria lei para que se exercite este mesmo direito.

III – CONCLUSÃO

Com base nas considerações acima e na legislação indicada, podemos concluir, respondendo às questões apresentadas, na ordem:

1 – As partes e peças a serem aplicadas em reposição ou manutenção de máquinas e equipamentos do parque industrial são consideradas material de uso e consumo e não são produtos intermediários pois, embora possam ser individualizadas, não gozam de autonomia, pois fazem parte de uma estrutura maior, (artigo 3º, § 2º inciso I), não havendo benefício fiscal específico para a aquisição de produtos que se destinem ao uso e consumo.

2 – Sim, as partes e peças que serão aplicadas na primeira montagem de máquinas e equipamentos do parque industrial na fase pré-operacional podem ser consideradas integrantes do ativo imobilizado e poderão ter seus créditos aproveitados na forma da legislação.

3 – Os materiais que constituem ferramentas de corte e desbaste imprescindíveis para a fabricação do produto final não podem ser considerados matéria-prima, e como respondido na primeira questão, tão pouco são produtos intermediários, sendo considerados de uso e consumo, e por isso sujeitos ao diferencial de alíquotas.

4 – Prejudicada.

5 – Conforme respondido na primeira questão, as brocas, fresas e serras, são material de uso e consumo, devendo ser utilizado o CFOP  1.556/2.556 – Compra de material para uso ou consumo.

6 – O benefício da isenção do ICMS diferencial de alíquotas previsto no artigo 6º, XCII, Anexo IX do RCTE está previsto para bem destinado ao ativo imobilizado, o que não é o caso aqui consultado, conforme resposta anterior.

É o parecer.

GERÊNCIA DE ORIENTAÇÃO TRIBUTÁRIA, aos 14 dias do mês de setembro de 2021.

Documento assinado eletronicamente por MARCELO BORGES RODRIGUES, Auditor (a) Fiscal da Receita Estadual, em 29/10/2021, às 17:28, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.

Documento assinado eletronicamente por DENILSON ALVES EVANGELISTA, Gerente, em 29/10/2021, às 20:54, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.