Parecer Normativo SET nº 2 de 03/04/2002
Norma Estadual - Rio de Janeiro - Publicado no DOE em 04 abr 2002
Fixa entendimento quanto às hipóteses em que é admissível a apreensão de mercadorias
Senhor Superintendente,
Cumpre abordar neste parecer a questão da apreensão de mercadorias, com o objetivo de definir as hipóteses em que tal procedimento se legitima, e assim oferecer um ato normativo que trate dessa matéria, freqüentemente discutida. Em verdade, este trabalho pode ser caracterizado como uma compilação das conclusões a que chegaram representantes desta Secretaria e da Procuradoria Geral do Estado, manifestadas em pareceres que abordaram minuciosamente a questão, e por fim, convergiram para um entendimento comum.O artigo 203, do Decreto-lei nº 5/75, indica os casos em que mercadorias podem ser apreendidas:
"Art. 203. Poderão ser apreendidos:
I - quando na via pública, se não tiverem sido pagos os tributos respectivos;
b) as mercadorias ou quaisquer outros bens móveis colocados à venda;
II - em qualquer caso, os objetos ou mercadorias:
a) cujo detentor não exiba à fiscalização documento fiscal que comprove sua origem, e que, por lei ou regulamento, deva acompanhar o objeto ou a mercadoria;
b) quando transitarem, ainda que acompanhados de documentos fiscais, sem que, no entanto, possa ser identificado o seu destinatário, nos casos em que a lei ou regulamento o exigir;
c) se houver anotações falsas nos livros e documentos fiscais com eles relacionados, inclusive quanto ao preço, origem e destino;
d) se o detentor, remetente ou destinatário não estiver inscrito na repartição competente quando a isso obrigado; e
e) se existirem indícios veementes de fraude, face à lei ou regulamento fiscal;
III -.............................................................................................................
Parágrafo único - Havendo prova ou fundada suspeita de que mercadorias, objeto de sonegação ou fraude fiscal, se encontram em residência particular, a busca e apreensão das mesmas será promovida pelos meios regulares sem prejuízo das medidas acautelatórias, a fim de evitar sua remoção clandestina."
Tais hipóteses tem de ser entendidas sem ofensa ao disposto na Súmula 323, do Supremo Tribunal Federal, que assim dispõe:
"É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos."
Note-se que a Súmula 323 não está vedando a apreensão de mercadorias, mas afastando a possibilidade de se utilizar tal procedimento para coagir o contribuinte a pagar tributo. Não implica, portanto, admitir que circulem mercadorias em situação irregular, como é o caso de ausência de documentação fiscal própria (o que inclui o comprovante de recolhimento do tributo devido na operação, quando este deva obrigatoriamente acompanhar o trânsito da mercadoria), inconsistência nos dados declarados nos documentos fiscais que acompanhem a mercadoria, impossibilidade de identificação do contribuinte responsável pelo tributo devido na operação e presença de indícios veementes de fraude - casos, portanto, em que se justifica a apreensão da mercadoria, de modo que não se permita o seu trânsito irregular.
Corroboram este entendimento as seguintes decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:
"ICM. Apreensão de mercadoria. Consoante o disposto na alínea "a" do inciso II do art. 203 do Decreto-lei nº 5, de 1975, é lícita a apreensão, pela autoridade fiscal, de mercadoria em trânsito desacompanhada de documento fiscal idôneo. Tal apreensão não se confunde com a que é feita com a finalidade de obrigar o contribuinte a pagar tributo devido. É a esta hipótese que se refere a Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal."(Ac. na apelação cível nº 1986.001.3729, 5ª Câmara Cível, relator Desembargador Narciso Pinto, decisão unânime, em 23.12.86)
"Apreensão de mercadoria. Cod. Tributário Estadual. Art. 203. Mandado de segurança. No Estado do Rio de Janeiro, a apreensão de mercadorias só pode ser feita nos termos do art. 203 do Decreto-lei nº 5/75." (Ac. na apelação cível nº 1986.001.4170, 4ª Câmara Cível, relator Des. Fernando Whitaker, decisão unânime, em 30.11.86)
"Apreensão de mercadoria. Mandado de segurança. Se a ordem visou liberar mercadorias apreendidas, porque transportadas com infração às normas fiscais, inexiste, de parte do impetrante, direito líquido e certo de vê-las liberadas, e, de parte da autoridade impetrada, ilegalidade ou abuso de poder. Improvimento do apelo."(Ac. na apelação cível nº 1986.001.2323, 2ª Câmara Cível, decisão unânime, relator Des. Sampaio Peres, em 30.11.86)
"ICM. APREENSÃO DE MERCADORIA - MANDADO DE SEGURANÇA. Autuação fiscal. Apreensão de mercadorias. Mandado de segurança. Importa em ilegalidade e violação de direito líquido e certo do impetrante a apreensão de mercadorias encontradas no recinto de um condomínio cujos imóveis representam garantia mais do que suficiente da ação fiscal. Tal apreensão não se admite como meio de coerção para liquidação do alegado débito fiscal e só se justifica se caracterizado o risco de tal prejuízo ou se contra o autuado há forte suspeita de desvio de bens, em face de repetidas e graves infrações anteriores ou, ainda, se a mercadoria está sendo transportada e pode ser desviada de seu destino. A não ser em tais hipóteses, só pode a apreensão fazer-se por período muito breve, para ensejar o levantamento necessário à redação do auto de infração. É o que resulta da doutrina e jurisprudência consagradas, esta prestigiada no item nº 323 da jurisprudência dominante do E. Supremo Tribunal Federal." (Ac. na ap. cível nº 1986.001.4810, 3ª Câmara Cível, relator Des. Paulo Pinto, decisão unânime, em 18.06.87)
Está, assim, perfeitamente caracterizada a distinção entre a apreensão com vistas à regularização da circulação da mercadoria, da que é utilizada como meio coercitivo para o pagamento do tributo. E a diferença entre ambas as hipóteses é clara: no primeiro caso, faltam elementos capazes de conferir legitimidade ou mesmo legalidade ao transporte da carga, da qual não se tem sequer a certeza de que não corresponderia a produto de ilícito penal, e assim sendo, justifica-se a sua apreensão, para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis pela mesma e adoção das medidas administrativas que se façam necessárias, de acordo com o que for apurado; no segundo, a documentação apresentada permite conhecer a natureza da operação, identificar o contribuinte responsável pelo cumprimento das obrigações tributárias e, conseqüentemente, adotar as medidas administrativas necessárias para assegurar o recebimento do tributo, que, neste caso, deverá ser exigido mediante lavratura de auto de infração, sem prejuízo do livre trânsito da mercadoria ou bem.
CONCLUSÃO
Não vemos incompatibilidade alguma entre o disposto na legislação estadual atinente à apreensão de mercadoria ou bem e as decisões dos tribunais superiores quanto à matéria. Essas decisões, em verdade, permitem melhor interpretar os objetivos e a extensão da legislação tributária, impedindo que tal procedimento se transforme em instrumento coercitivo para o pagamento de tributos, mas admitindo a apreensão sempre que não se puder comprovar, por meio de documentação fiscal idônea, a regularidade quanto à circulação da carga transportada.
Por fim, podemos resumir a questão da seguinte forma:
1 - o bem ou mercadoria que esteja circulando sem a documentação fiscal exigida pela legislação deve ser apreendido para as devidas averiguações, com base no artigo 203, do Decreto-lei nº 5/75;
2 - identificado o titular do bem ou mercadoria e verificada a legitimidade da operação, o fisco deve liberar a carga apreendida imediatamente após constituir o crédito tributário exigível, mediante a lavratura de auto de infração;
3 - somente no caso em que, por força da legislação tributária, o bem ou mercadoria tenha que obrigatoriamente circular acompanhada do comprovante do pagamento do imposto, poderá o fisco reter a carga transportada até o momento em que seja satisfeita a correspondente obrigação principal; do contrário, terá de liberá-la após a adoção das providências descritas nos itens 1 e 2, acima;
4 - na hipótese de o bem ou mercadoria ser abandonado ou, ainda, se se tornar impossível a identificação de seu titular - o que, conseqüentemente, torna inviável regularizar a circulação da carga transportada - deverá o fisco proceder à sua alienação, na forma e nos prazos previstos no artigo 204, do Decreto-lei nº 5/75.
À consideração de V.Sª.
CT, 03 de abril de 2002
Alberto da Silva Lopes
Coordenador de Tributação
Aprovo.
Publique-se.
SET, 03 de abril de 2002
Leonardo de Andrade Costa
Superintendente Estadual de Tributação