Resposta à Consulta nº 1640 DE 18/07/2013
Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 18 jul 2013
ICMS - TEMPLOS DE QUALQUER CULTO - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA - VENDA DE PRODUTOS RELIGIOSOS (BÍBLIAS, HINÁRIOS, VÉUS E OUTROS)
RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA N° 1640/2013, de 18 de Julho de 2013
ICMS - TEMPLOS DE QUALQUER CULTO - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA - VENDA DE PRODUTOS RELIGIOSOS (BÍBLIAS, HINÁRIOS, VÉUS E OUTROS).
I. A imunidade instituída pela Constituição Federal de 1988 (artigo 150, inciso VI, "b") proíbe a incidência de impostos que repercutam diretamente sobre o patrimônio, a renda e os serviços dos templos religiosos, dentre os quais, em regra, não se insere o ICMS (imposto de repercussão indireta), que incide sobre as aquisições ou as vendas de mercadorias realizadas pelos templos.
II. Todavia, entende-se como albergada pela imunidade do templo a operação de repasse (ou venda), aos fiéis e às igrejas de mesma doutrina, de produtos religiosos, quando:
(i) seja efetuada diretamente pelo templo (igreja);
(ii) seja efetuada graciosamente ou, na hipótese de venda, que o valor cobrado seja igual (ou inferior) ao "preço de custo" ou ao "custo de reposição" (preço de aquisição atualizado) do produto; e
(iii) os produtos em questão sejam essenciais à prática do próprio culto e devam ser utilizados dentro das edificações do templo (estabelecimento físico).
Relato
1) A Consulente, entidade religiosa sem fins lucrativos, informa que "toda a aquisição de artigos de fé (Bíblias, livros de canto, véus, impressos de organização interna, vestes batismais) é feita através da sede localizada [...] na Capital de São Paulo, em grandes volumes, para fins de redução do custo (pois [...] a sua receita é constituída, unicamente de ofertas e coletas voluntárias de seus fiéis) armazenados em seu depósito em SP, e, na medida das necessidades são remetidos, com a cobrança de preço atualizado, às demais Igrejas da mesma Fé e Doutrina, localizadas em quase todos os Municípios brasileiros e no exterior para serem distribuídos aos membros de cada região, sem interesse comercial".
1.1) Informa, ainda, que, apesar de todas as igrejas da "mesma fé" estarem vinculadas a "decisões espirituais tomadas de forma unificada" e a um estatuto idêntico, sua organização administrativa é descentralizada, com registro e "CNPJ" próprios em cada Município.
2) Expõe que está amparada pela imunidade tributária do artigo 150, inciso VI, "b", da Constituição Federal/1988, argumentando, "no que tange à tributação das Bíblias e Hinários distribuídos aos seus membros sem interesse comercial (principais materiais objeto de distribuição), [...] que tal atividade também está amparada pela imunidade prevista artigo 150, inciso VI, "d", da Constituição Federal de 1988".
3) Afirma que "não é contribuinte do ICMS no Estado de São Paulo, conforme as Respostas às Consultas números 602/86 e 1144/89 [...] dispensada, portanto, da emissão de documentos fiscais no transporte de Bíblias, Hinários e véus etc, do Depósito Nacional, localizado junto a sua sede, para outras Igrejas da mesma Fé e Doutrina".
4) Relata que as "bíblias, hinários, véus e livros de endereço dos templos e outros são distribuídos aos fiéis por preço atualizado e sem fins comerciais, dentro das Igrejas", destacando que efetua as remessas desses produtos "acompanhados de documento interno, denominado ‘Declaração de Trânsito’ [...] do depósito nacional localizado junto a sua sede na Capital de São Paulo para outras Igrejas da mesma Fé e Doutrina, localizadas em outros Estados e no exterior".
5) Em seguida, alega que "algumas unidades federadas têm resistido a aceitar o documento de trânsito, e exigindo emissão da Nota Fiscal Eletrônica", indagando:
5.1) "As operações de envio de bíblias, hinários, véus e livros de endereço dos templos e outros materiais acima mencionados destinados à atividade fim da [Consulente], do depósito da Consulente, localizado na cidade de São Paulo, para as demais Igrejas da mesma Fé e Doutrina localizadas neste Estado e em outros Estados e no Distrito Federal e ainda no exterior para serem distribuídos a sua irmandade, por preço atualizado e sem interesses comerciais, podem ser feitas sem documento fiscal, na condição de não contribuintes do ICMS"?
5.2) "Em caso negativo, qual o procedimento que a [Consulente] deve adotar para cumprimento das obrigações acessórias da legislação do ICMS, neste Estado"?
Interpretação
1) Note-se, de início, que, conforme já entendido por este órgão consultivo a respeito da imunidade conferida aos templos de qualquer culto, o referido dispositivo constitucional (artigo 150, VI, "b", e § 4º, da CF/1988) proíbe, tão somente, a cobrança de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços dessas entidades. Nesses termos, a imunidade constitucional referida é prevista apenas para as hipóteses em que os impostos recaem diretamente no patrimônio, na renda e nos serviços desses templos.
2) Convém destacar, no caso em concreto, o balizamento que a doutrina faz entre impostos diretos e indiretos. Na acepção de Ricardo Lobo Torres (in "Tratado de direito constitucional financeiro e tributário", volume III: os direitos humanos e a tributação: imunidade e isonomia - Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 244):
"[...] os templos não pagam os impostos diretos, mas estão sujeitos à incidência dos indiretos, quer como compradores, quer como vendedores de mercadorias. [...]".
3) Com efeito, o ICMS, imposto classificado como "indireto", afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre o patrimônio, a renda e serviços. Dessa maneira, o ICMS, em regra, não é alcançado pela imunidade prevista no artigo 150, VI, "b", da Constituição Federal/1988.
4) Entretanto, diante da situação fática apresentada, cabe verificar com mais cautela a existência ou não dos pressupostos essenciais à aplicação da imunidade em tela, considerando que a distribuição, pela Consulente, de bíblias, hinários e véus (entre outros produtos), pelo preço de aquisição atualizado, aos fieis e igrejas de sua doutrina, parece estar de todo vinculada à prática do culto.
5) Diante disso, constate-se que a Consulente é uma entidade de cunho religioso que, por finalidade estatutária, não visa lucro, de modo que não se encontra inserida num contexto de atividade típica de sociedades empresárias que praticam atos de comércio (cujo objetivo precípuo é o lucro). Nesse quesito, é necessário fazer menção que a operação relativa à circulação de mercadorias — hipótese de incidência do ICMS — é aquela inserida no ciclo mercantil que destina bens da produção ao consumo, mediante a agregação de valor econômico.
6) Assim considerado, é condição essencial para afastar a incidência do ICMS na situação sob análise que as referidas mercadorias de caráter religioso, embora sejam vendidas aos fiéis e igrejas pela Consulente, não sejam alcançadas pelo intuito de lucro que confere às operações mercantis seu lineamento peculiar; isto é, que o templo não possua a prerrogativa de auferir renda com a venda de produtos religiosos aos seus fiéis ou igrejas de mesma doutrina.
7) Dessa forma, para que a operação de repasse (ou venda), aos fiéis e às igrejas de mesma doutrina, de produtos religiosos, não se sujeite ao ICMS, mantendo-se albergada pela imunidade que se irradia do próprio templo, é necessário que:
(i) seja efetuada diretamente pelo templo (igreja);
(ii) seja realizada graciosamente ou, na hipótese de venda, que o valor cobrado seja igual ou inferior ao "preço de custo" ou ao "custo de reposição" (preço de aquisição atualizado) do produto; e
(iii) os produtos em questão sejam essenciais à prática do próprio culto e devam ser utilizados dentro das edificações do templo (estabelecimento físico).
8) Na hipótese apresentada na consulta em análise, em sendo atendidos os requisitos expostos no item 7 precedente, a venda (ou repasse) de produtos religiosos aos fiéis e às igrejas de mesma doutrina pelo preço de reposição do produto (assim entendido como preço de aquisição atualizado), efetuada diretamente pela própria igreja está inserida na imunidade detida pela Consulente, com fulcro no artigo 150, VI, "b", da Constituição Federal/1988.
9) Restrita a essas situações, a Consulente não se caracteriza como contribuinte do ICMS e não está obrigada à inscrição no Cadastro de Contribuintes desse imposto estadual. Nesse caso, para realizar a movimentação de seus bens e de produtos diversos pode se valer de documentos internos próprios, ressalvados eventuais documentos previstos por outras esferas de governo.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.