Resposta à Consulta nº 260 DE 27/10/2020
Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 27 out 2020
ICMS – OBRIGAÇÃO PRINCIPAL – ESTOQUE – PERDAS – TRATAMENTO TRIBUTÁRIO. As diferenças havidas nos estoques em função de perecimento, deterioração, extravio, roubo, furto e outros sinistros configuram saída de mercadoria, todavia, ao se determinar a obrigatoriedade de estornar o crédito, a legislação vigente, quer seja a Lei qualificada, a Lei estadual ou o Estatuto regulamentar, implicitamente, está reconhecendo que tais eventos não são alcançados pela tributação do ICMS, ainda que a desoneração seja implicitamente reconhecida, subsistem as obrigações acessórias pertinentes.
A empresa acima indicada, estabelecida na Rua ..., nº ..., ..., ... – MT, inscrita no CNPJ sob o nº ... e no Cadastro de Contribuintes do Estado sob o nº ..., efetua consulta sobre o tratamento tributário conferido às perdas de mercadorias no estoque.
A consulente expõe que atua como distribuidora de alimentos em MT, sendo credenciada como substituta tributária, e solicita esclarecimentos acerca dos procedimentos no caso de perda de mercadoria no estoque.
A consulente alude ao artigo 325 do RICMS/MT, que veda a emissão de documento fiscal sem que ocorra a circulação de mercadorias, e que, no seu entendimento, deverá haver somente ajuste interno de estoque e estorno do crédito na apuração do imposto.
Ao final, apresenta os questionamentos colacionados a seguir:
· É correto emitir uma Nota Fiscal de CFOP 5927 para dar baixa no estoque?
· E quanto ao estorno dos créditos de ICMS na entrada destas mercadorias, qual procedimento e código de ajuste para estorno deste crédito?
É a consulta.
Preliminarmente, cumpre informar que, em consulta ao Sistema de Gerenciamento do Cadastro de Contribuintes desta SEFAZ/MT, constata-se que a consulente está cadastrada neste Estado, tendo declarado como CNAE principal 4639-7/01 – Comércio atacadista de produtos alimentícios em geral, e está enquadrada no Regime de Apuração e Recolhimento Normal do ICMS, previsto no artigo 131 do RICMS/2014.
Ainda no que tange às informações cadastrais da consulente, verifica-se que apresenta o credenciamento ativo adiante indicado, registrado no Sistema de Registro e Controle da Renúncia Fiscal – RCR, disponibilizado para consulta pública no endereço eletrônico https://www.sefaz.mt.gov.br/rcr-fe/consultacredenciados, para a fruição de benefícios, nos moldes da Lei Complementar (estadual) nº 631/2019: MT029048 Crédito outorgado – estabelecimento comercial atacadista – operações internas. Art. 2°, II, a Anexo XVII – RICMS/MT; e MT029049 Crédito outorgado – estabelecimento comercial atacadista – operações interestaduais. Art. 2°, II, b Anexo XVII - RICMS/MT.
Em síntese, pelos relatos da consulente, a dúvida refere-se ao tratamento tributário em relação às perdas de mercadorias no estoque e, principalmente, aos procedimentos para os registros da baixa do estoque e do código a ser utilizado para o ajuste do estorno do crédito.
A propósito das diferenças havidas nos estoques em função de perecimento, deterioração, extravio, roubo, furto e outros sinistros, a legislação do ICMS é econômica, referindo-se expressamente a esses eventos quando cuida do estorno de crédito. Nesse sentido, são os comandos do artigo 21 da Lei Complementar n° 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Complementar do ICMS), no artigo 26, inciso IV, da Lei n° 7.098, de 30 de dezembro de 1998 (Lei que consolida as normas do ICMS neste Estado), e no artigo 123, inciso IV, do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.212, de 20 de março de 2014 (RICMS/2014). É oportuna a reprodução dos citados preceitos:
Lei Complementar n° 87/96
Art. 21 O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto de que se tiver creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
(...)
IV – vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se.
(...)
Lei n° 7.098/98
Art. 26 O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto do qual se creditou sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
(...)
IV – vier a perecer, deteriorar-se, extraviar-se ou for objeto de sinistro, furto ou roubo;
(...)
RICMS/2014
Art. 123 O contribuinte procederá ao estorno do imposto de que se creditou, sempre que as mercadorias adquiridas para a comercialização, industrialização ou prestação de serviços: (cf. caput do art. 26 da Lei n° 7.098/98)
(...)
IV – perecerem, deteriorarem-se, extraviarem-se ou forem objeto de sinistro, furto ou roubo;
(...)
No plano físico, não se pode negar que tais eventos implicam saída da mercadoria do estabelecimento como ratificam as inferências adiante destacadas pertinentes a essas ocorrências.
- As mercadorias que forem objeto de roubo, furto ou extravio não mais são localizadas no estabelecimento, portanto, houve saída.
- A mercadoria perecida não existe mais, por conseguinte, o que não é (o que não existe) também não pode estar no estabelecimento.
- A mercadoria deteriorada não se presta mais à finalidade com a qual deu entrada no estabelecimento; pode até se revestir com qualidades de outra mercadoria (subproduto, sucata, insumo para fabricação de outro produto) mas não é mais a mercadoria cuja entrada foi originalmente registrada. Tecnicamente, a mercadoria registrada saiu do estabelecimento.
- As mercadorias objeto de sinistros tais como incêndio, inundação e outras ocorrências que provoquem perdas, dependendo das consequências, podem não mais existir (como as perecidas) ou podem ter perdido a finalidade à qual se destinavam (como as deterioradas). Qualquer que seja o resultado, como já alinhavado, a mercadoria que deu entrada não está mais no estabelecimento.
À luz da legislação tributária, corroborando o entendimento de que os eventos em comento materializam saída de mercadoria, o RICMS, repetindo o Convênio SINIEF s/n°, de 15 de dezembro de 1970, arrola no seu Anexo II, que cuida dos Códigos Fiscais de Operações e Prestações – CFOP, no Grupo “das Saídas de Mercadorias, Bens ou Prestação de Serviços”, dentro do Subgrupo que designou como “Outras Saídas de Mercadorias ou Prestações de Serviços, o código 5.927, assim descrito:
DAS SAÍDAS DE MERCADORIAS, BENS OU PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
(...)
5.900 – OUTRAS SAÍDAS DE MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS
(...)
5.927 – Lançamento efetuado a título de baixa de estoque decorrente de perda, roubo ou deterioração
Classificam-se neste código os registros efetuados a título de baixa de estoque decorrente de perda, roubo ou deterioração das mercadorias.
(...)
Não é demais lembrar que os CFOP são previstos pelo Convênio SINIEF, de 15 de dezembro de 1970, atendidas as atualizações que lhe foram carreadas por Ajustes SINIEF celebrados, anotando-se, especificamente quanto ao CFOP 5.927, que este foi acrescentado pelo Ajuste SINIEF 7/2001, com efeitos a partir de 1°/01/2003.
Ademais, o mencionado Convênio SINIEF s/n°, em seu artigo 5°, na redação dada pelo Ajuste SINIEF 3/94, oferece a definição para o CFOP:
Art. 5º O Código Fiscal de Operações e Prestações – CFOP e o Código de Situação Tributária – CST, constantes de anexos deste Convênio, serão interpretados de acordo com as Normas Explicativas, também apensas, e visam aglutinar em grupos homogêneos nos documentos e livros fiscais, nas guias de informação e em todas as análises de dados, as operações e prestações realizadas pelos contribuintes do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI e do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS.
Portanto, também para a legislação tributária, os eventos em discussão configuram saída de mercadoria. Todavia, ao se determinar a obrigatoriedade de estornar o crédito, a legislação vigente, quer seja a Lei qualificada, seja a Lei estadual ou seja o Estatuto regulamentar, implicitamente, está reconhecendo que tais eventos não são alcançados pela tributação do ICMS.
Em corroboração, cita-se o catálogo de hipóteses determinativas de estorno de crédito, encartadas nos artigos citados, sempre tendo como fundamento uma operação ou prestação (posterior à entrada da mercadoria ou ao recebimento de serviço, geratrizes do crédito) que tipifique hipótese de vedação de aproveitamento de crédito, em sua maioria, por ser esta operação ou prestação isenta ou não tributada.
Nesse diapasão, quanto à obrigação principal pertinente ao ICMS, conclui-se que:
1) As hipóteses que tipificam perda de mercadoria, afetando negativamente os estoques, configuram saídas de mercadoria, conforme arrolamento de CFOP reproduzidos pelo Anexo II do Regulamento do ICMS deste Estado, a partir de catálogo oferecido pelo Convênio SINIEF, de 15/12/1970.
2) A legislação tributária prevê a obrigatoriedade de estorno de crédito quando verificados os eventos descritos no inciso IV do artigo 123 do RICMS/2014, que regulamenta o inciso IV do artigo 26 da Lei n° 7.098/98, que tem como fundamento de validade o inciso IV do artigo 21 da LC n° 87/96.
3) Ao classificar os eventos como hipóteses determinativas de estorno de crédito, o inciso IV do artigo 123 do RICMS/2014 (e os correlatos legais que o validam, repitam-se, art. 26, inciso IV, da Lei n° 7.098/98 e artigo 21, inciso IV, da LC n° 87/96), implicitamente reconhece que o perecimento, a deterioração, o extravio, o furto, o roubo o sinistro de mercadoria não são alcançados pela tributação do ICMS.
No entanto, ainda que a desoneração seja implicitamente reconhecida, subsistem as obrigações acessórias pertinentes, seja quanto à emissão de documentos fiscais, seja quanto ao registro do estorno do crédito nos livros fiscais ou na Escrituração Fiscal Digital, conforme for o enquadramento da consulente, às quais se reportam os questionamentos especificados nos quesitos 1 e 2 da consulta formulada.
Assim, nos termos do art. 995, II e § 3º, do RICMS/2014, c/c o disposto no artigo 98 do Regimento Interno da Secretaria de Estado de Fazenda – SEFAZ, aprovado pelo Decreto n° 182, publicado em 19 de julho de 2019, a consulta será desmembrada para resposta pela área com atribuições regimentais, qual seja, a Coordenadoria de Documentos e Declarações Fiscais – CDDF da Superintendência de Informações da Receita Pública – SUIRP.
Cabe ressalvar que o entendimento exarado na presente Informação tem aplicação até que norma superveniente disponha de modo diverso, nos termos do parágrafo único do artigo 1.005 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 2.212/2014.
Importa também registrar que não produzirá os efeitos legais previstos no artigo 1.002 e no parágrafo único do artigo 1.005 do Regulamento do ICMS/2014 a consulta respondida sobre matéria que esteja enquadrada em qualquer das situações previstas nos incisos do caput do artigo 1.008 do mesmo Regulamento.
Por fim, alerta-se, que, em sendo o procedimento adotado pela consulente diverso do aqui indicado, deverá, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da ciência da presente, regularizar suas operações, inclusive com recolhimento de eventuais diferenças de imposto, ainda sob os benefícios da espontaneidade, com acréscimo de correção monetária, juros e multa de mora, calculados desde o vencimento da obrigação até a data do efetivo pagamento.
Após o transcurso do prazo assinalado, a consulente ficará sujeita ao lançamento de ofício, para exigência de eventuais diferenças, nos termos do artigo 1.004 do RICMS/2014.
É a informação, ora submetida à superior consideração, com a ressalva de que os destaques apostos nos dispositivos da legislação transcrita, bem como nos questionamentos da consulente, não existem nos originais.
Coordenadoria de Redação, Divulgação e Interpretação de Normas da Receita Pública da Superintendência de Normas da Receita Pública, em Cuiabá – MT, 27 de outubro de 2020.
Adriana Roberta Ricas Leite
FTE
De acordo.
À consideração superior.
Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
Coordenadora da CRDI/SUNOR
APROVADA.
José Elson Matias dos Santos
Superintendente de Normas da Receita Pública