Solução de Consulta nº 14 DE 06/08/2020

Norma Municipal - Belo Horizonte - MG - Publicado no DOM em 06 ago 2020

ISSQN – BASE DE CÁLCULO – PREÇO DO SERVIÇO – HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA – NÃO-INCIDÊNCIA.

Não incide o ISSQN sobre os honorários de sucumbência costumeiramente recebidos pelos advogados, por constituírem verbas a que fazem jus ex lege, e não em razão de vínculo negocial de Direito Privado outrora estabelecido com os seus respectivos clientes.
- Não existindo prestação de serviços alguma a justificar o recebimento dos honorários de sucumbência, não podem tais importâncias ser havidas como a contraprestação ou preço a que alude o art. 7º, caput, da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

CONSULTA

Formula-nos a consulente, no que concerne ao ISSQN, sucinto questionamento acerca do regime jurídico fiscal aplicável aos honorários de sucumbência por ela habitualmente recebidos em Juízo. Noutras palavras, pergunta-nos se os ditos valores sofreriam ou não a incidência do imposto, e, por fim, de que maneira e a que título deveriam eles ser informados no Simples Nacional.

RESPOSTA

Preliminarmente, em fiel cumprimento ao disposto no art. 1º, § 5º, I e III, do Decreto Municipal nº 17.190, de 14 de outubro de 2019, cumpre-nos afiançar que, nesta data, não se encontra a consulente sob qualquer ação fiscal, tampouco chegou ao nosso conhecimento a eventual existência de litígio, quer na esfera administrativa, quer na judicial, envolvendo o objeto da presente consulta. Desconhecemos outrossim haver a consulente adotado, até a presente data, quaisquer procedimentos com o escuso e deliberado propósito de evadir-se de legítima tributação pelo ISSQN.

PARECER CONCLUSIVO

Reza o art. 7º da Lei Complementar n° 116, de 31 de julho de 2003, verbis:

“Art. 7º. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.

§ 1º. Quando os serviços descritos pelo subitem 3.04 da lista anexa forem prestados no território de mais de um Município, a base de cálculo será proporcional, conforme o caso, à extensão da ferrovia, rodovia, dutos e condutos de qualquer natureza, cabos de qualquer natureza, ou ao número de postes, existentes em cada Município.

§ 2º. Não se incluem na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza:

I – o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar;

II – (VETADO)

§ 3º. (VETADO)” (Grifei)

Como se depreende da leitura da cabeça do referido dispositivo, a base de cálculo do ISSQN restou definida, em sede de lei complementar à Constituição, como sendo o preço do serviço contratualmente avençado entre prestador e tomador. É dizer: o valor a cujo recebimento fará jus o prestador do serviço, a título de contraprestação, pelo fornecimento da utilidade que, contratualmente, obrigou-se a entregar a um terceiro qualquer.

Noutras palavras, para se ter como juridicamente configurada a prestação de serviço sujeita à incidência do ISSQN torna-se imperiosa a existência prévia de um negócio jurídico bilateral e sinalagmático, por meio do qual, no momento oportuno, nascerá então para o prestador o direito subjetivo ao recebimento de um determinado preço, tal como outrora avençado com o tomador do respectivo serviço.

Veja-se o art. 1º da mesma Lei Complementar nº 116/2003:

“Art. 1º. O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.”

Assim se extrai do magistério de toda a doutrina brasileira, mesmo dos autores que interpretam de maneira mais alargada a expressão “prestação de serviços”. Leia-se por todos, nesse particular aspecto, o escólio de Bernardo Ribeiro de Moraes:

“Para nós, o ISS é um imposto sobre a circulação. O ISS recai sobre a circulação (venda) de serviços, sobre a circulação de bens imateriais. A fundamentação do que afirmamos é facílima:

a) a Emenda Constitucional n. 18, de 1965, que previu o ISS, classificou-o no capítulo que trata dos ‘impostos sobre a produção e a circulação’. Assim, o ISS somente pode ser classificado como uma das hipóteses admitidas: ou sore a ‘produção’ ou sobre a ‘circulação’;

b) a base de cálculo do ISS é o ‘preço do serviço’, elemento inexistente na produção (quando se obtêm valores), mas que aparece na circulação (quando se obtem preços);

c) o contribuinte do ISS é o ‘prestador do serviço’, o que indica uma capacidade contributiva em razão de um fornecimento de serviço a terceiro, mediante remuneração. Isso se dá somente na fase de troca ou permuta, ou melhor, na fase de circulação de riquezas (venda);

(...)

O segundo pressuposto da hipótese de incidência tributária relativa ao ISS é a existência da prestação de serviços, os quais não estejam compreendidos na competência tributária da União ou dos Estados e sejam definidos em lei complementar.

O ISS foi previsto no sistema tributário nacional como um imposto sobre a circulação, mais propriamente sobre a circulação de serviços de qualquer natureza (...).

O objeto do ISS, já vimos, é bastante vaso, abrangendo os serviços de qualquer natureza, inclusive atividades de ‘prestação de serviços’ propriamente ditas. (...)

(...)

Conforme se verifica, o ISS recai sobre ‘serviços de qualquer natureza’, abrangendo inúmeras atividades relacionadas com a circulação de bens imateriais. O ISS grava a venda de serviços. A quem presta serviços, como autonomia, está vendendo bens imateriais, está vendendo serviços.” (MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e Prática do ISS. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 80, 97 e 99 – Grifei)

Definitivamente, os honorários de sucumbência não se subsomem ao conceito de preço estabelecido no art. 7º, caput, da Lei Complementar nº 116/2003!

A uma, por constituírem verbas a que os advogados têm direito ex lege, i.e., tão-somente por força do que dispõe o art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). A duas, contrariamente ao que ocorre com os honorários convencionais, por serem os honorários de sucumbência valores devidos aos advogados por pessoas com as quais não vieram a estabelecer qualquer contrato de prestação de serviços. A três, porque os honorários de sucumbência são fixados a posteriori, exclusivamente pelo magistrado da causa, observados apenas os valores máximo e mínimo legalmente estabelecidos, sem qualquer participação dos advogados beneficiados.

Ipso facto, inexistindo prestação de serviços, inexistirá também “preço” a ser tributado pelo ISSQN!

Por fim, quanto ao procedimento a ser adotado pela consulente no ambiente do Simples Nacional, deverá ela dispensar aos honorários de sucumbência o tratamento de valores não sujeitos à incidência do ISSQN. Quanto à incidência dos demais tributos federais porventura devidos, não cabe a este órgão fazendário pronunciar-se a respeito.

Belo Horizonte, 6 de agosto de 2020.