Solução de Consulta COTRI nº 6 DE 04/11/2021

Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 05 nov 2021

Processo: 00040-00012000/2021-46.

ICMS. Leilão de bens da Administração Pública. 1- A disciplina a que faz referência o artigo 247-A do RICMS relaciona-se exclusivamente às hipóteses de declaração normativa de ausência de responsabilidade solidária do leiloeiro, nas exatas circunstâncias que aponta. 2- Contribuinte da operação. Deverá ser apurado face ao enquadramento em qualquer das previsões contidas no artigo 12 do RICMS.

I - Relatório

1. Leiloeira oficial, estabelecida no Distrito Federal apresenta consulta envolvendo o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Sobre a Prestação de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), regulado pelo Decreto nº 18.955 , de 22 de dezembro de 1997, Regulamento do ICMS - RICMS.

2. Relata que, em determinada data do corrente ano, realizou leilão eletrônico, pela internet, "(.....) para a alienação de bens móveis inservíveis e/ou de manutenção antieconômica e veículos de propriedade do Distrito Federal".

3. Aponta que, "(.....) induzida pela responsabilidade solidária do leiloeiro, os valores relativos ao ICMS foram imputados aos arrematantes e estão retidos com a leiloeira, para recolhimento em nome do contribuinte direto, caso a presente consulta entenda devido".

4. Apresenta detalhadamente diversos argumentos, cogitações e dispositivos da legislação tributária, para concluir que a operação a que se refere essa Consulta não é passível de tributação pela "ausência de contribuinte do imposto". Destaca-se dentre essas cogitações "(.....) que o art. 247-A do Decreto nº 18.955/1997 reconhece a inexistência de responsabilidade solidária do leiloeiro, não por uma benesse àquele profissional, mas pela inexistência de crédito tributário naquelas hipóteses pontualmente indicadas".

5. Ao final, apresenta seus questionamentos, transcritos ipsis litteris a seguir:

1º) As hipóteses listadas no art. 247-A do RICMS/1997 configuram hipóteses de não exigência do ICMS?

2º) Em havendo crédito tributário de ICMS em leilão público de bens de pessoa jurídica de direito público, quem é o contribuinte direto? Em sendo devido o recolhimento, qual é o código de receita do ICMS?

II - Análise

6. Ab initio, registre-se o fato de a Autoridade Fiscal promover a análise da matéria consultada plenamente vinculada à legislação tributária.

7. A Consulta apresentou-se regular quanto à admissibilidade prévia, realizada pelos órgãos preparadores do feito nos termos despachados nos autos, porém é mister fazer novo juízo de admissibilidade no órgão consultivo, tendo em vista iniciar-se a fase de análise do mérito da matéria arguida.

8. A matéria envolve aplicação da responsabilidade solidária ao leiloeiro por ocasião de seus trabalhos na venda de bens da Administração Pública, apuração do sujeito passivo e pedido relacionado a informações de códigos de receita, em caso de constatação da necessidade de recolhimento de impostos em relação às situações que aponta.

9. Parte da situação questionada tem como fundamento normativo a seguinte disciplina do RICMS:

Art. 247. As obrigações tributárias referidas neste Capítulo serão observadas nas operações de circulação de mercadorias realizadas por intermédio de leiloeiros oficiais, cuja responsabilidade tributária pelo pagamento do ICMS relativo à operação de saída da mercadoria está prevista no inciso I do art. 28 da Lei 1.254/1996 .

Art. 247-A. O disposto neste Capítulo não se aplica às operações em que ocorra leilão:

I - de energia elétrica;

II - realizado pela internet;

III - de bens de pessoa jurídica de direito público, exceto na hipótese do § 3º do art. 150 da Constituição Federal;

IV - de bens de pessoa jurídica de direito privado não contribuinte do imposto, exceto quando houver habitualidade ou volume que caracterize intuito comercial;

10. Observe que o artigo 247 do RICMS faz referência ao inciso I do art. 28 da Lei 1.254/1996 , que prevê:

Art. 28. Fica atribuída a responsabilidade solidária pelo pagamento do imposto e acréscimos legais devidos pelo contribuinte ou responsável:

I - ao leiloeiro, em relação às saídas de mercadorias decorrentes de arrematação em leilões;

(.....)

11. Por sua vez, o dispositivo constitucional a que faz referência o inciso III do artigo 247-A do RICMS, estipula que:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(.....)

VI - instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

(.....)

§ 3º As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.

12. Repare-se que o artigo 247-A do RICMS não está a tratar da definição de fato gerador do imposto, mas sim de responsabilidade solidária. Logo, as literais hipóteses lá previstas, relativas a afastamento da responsabilidade solidária do leiloeiro, de per si, não implicam inexistência de fato gerador do imposto, e consequentemente ausência de tributação. Nessa ótica, deve ficar claro que tal norma regula a dispensa da responsabilidade solidária nas situações numerus clausus que menciona, não se estendendo para o disciplinamento da definição do fato gerador do tributo, que encontra amparo em outros dispositivos da legislação.

13. Assim, para que seja verificado se resta hipoteticamente a responsabilidade solidária do leiloeiro nas operações que descreve é preciso fazer leitura, não só dos dispositivos contidos no regulamento do imposto, mas também da Lei nº 1.254/1996 e especialmente dos dispositivos da Constituição federal mencionados.

14. Em relação à eventual ausência da solidariedade baseada no inciso III do artigo 247-A do RICMS, convém observar que a carta maior sacramentou a vedação de tributação dos entes federados entre si. No entanto, a regra não se mostra absoluta, pois em seu parágrafo 3º do artigo 150 resolveu estipular exceções a essa vedação. Dentre elas, especificou a possibilidade de tributação em relação ao patrimônio, à renda e serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados.

15. Note-se que exatamente nesse ponto a operação de alienação onerosa, via leilão público, de mercadorias e bens, usados ou não, inservíveis para a Administração Pública poderá assumir feições de exploração de atividade econômica, considerando que envolve uma espécie de arrecadação financeira mediante entrega de bens ou mercadorias a terceiros arrematantes, operação essa potencialmente regida pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, quais sejam, normas aplicáveis à circulação jurídica de mercadorias.

16. Registre-se assim que, com a interpretação sistêmica das normas tributárias, chega-se à conclusão que a responsabilidade tributária solidária, previstas no artigo 247 do RICMS e no inciso I do artigo 28, observadas à luz do parágrafo 3º do artigo 150 da Constituição Federal , deverá ser verificada concretamente caso a caso, podendo eventualmente ser afastada, tal como previsto, para as exatas circunstâncias listadas no artigo 247-A do RICMS.

17. Noutro giro, o fato gerador do ICMS em relação a leilões é a saída da mercadoria arrematada, conforme está previsto na lei nº 1.254/1996 :

Art. 5º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

(.....)

XVIII - da saída da mercadoria arrematada em leilão.

18. Já em relação ao sujeito passivo, a Lei nº 5.172 , de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional- CTN) estipulou que:

Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

(.....)

19. Nos termos definidos no regulamento do imposto, será contribuinte do imposto:

Art. 12. Contribuinte do imposto é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior (Lei nº 1.254 , de 8 de novembro de 1996, art. 22 ).

§ 1º É também contribuinte:

I - a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou intuito comercial:

(.....)

c) adquira, em licitação pública, mercadoria ou bem importados do exterior, apreendidos ou abandonados;

(.....)

§ 2º A condição de contribuinte independe de encontrar-se a pessoa regularmente constituída ou estabelecida, inclusive para os efeitos do art. 20, bastando que configure unidade econômica que pratique as operações ou prestações definidas neste Regulamento como fatos geradores do imposto (Lei nº 1.254 , de 08 de novembro de 1996, art. 22 , § 2º).

20. Observe-se que, no caso em análise, não há que se cogitar em coincidência do sujeito passivo com o sujeito ativo, porque o Distrito Federal não assume a qualificação de arrematante ou adquirente dos bens públicos leiloados.

21. Também no caso em apreço, note-se que o contribuinte do imposto não será definido pela alínea "c" do item I do parágrafo 1º do artigo 12 do RICMS, em razão de a operação objeto da consulta não se tratar de mercadoria ou bem importados do exterior, apreendidos ou abandonados. Será definido pelo cotejamento entre as hipóteses abstratas de configuração do sujeito passivo definidas pelo caput do artigo 12 conjugada com seu parágrafo 2º, do mesmo regramento normativo, face a cada caso concreto de arrematação de bens.

22. Assim, se o arrematante qualificado como pessoa física ou jurídica realizar, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operação de circulação de mercadoria, definida nos termos legais, caracterizar-se-á o fato gerador do ICMS, sendo, portanto, passível de tributação.

23. Dessa forma, a título exemplificativo, se o arrematante for pessoa física ou jurídica que não realize com habitualidade operação com circulação de mercadoria nem adquira bens em volume que caracterizem intuito comercial não será enquadrado como sujeito passivo nessa operação de arremate em leilão, consequentemente, não haverá tributo a ser recolhido.

24. Nesse sentido, para a situação questionada, apenas concretamente e caso a caso poderá ser apurada a eventual existência de fato gerador, caracterização do contribuinte, além do quantum devido.

25. Avançando na análise dos questionamentos, eis que surge pedido de orientações sobre códigos de receita aplicáveis ao casos que menciona.

26. Há de ser observado que a dúvida, objeto do processo de consulta formal, deve consistir na ausência de convicção entre duas ou mais interpretações e/ou aplicações da legislação tributária do Distrito Federal, no tocante a uma determinada situação de fato, sendo de todo oportuno lembrar que tal dúvida não pode ser confundida, em nenhum momento, com questionamentos de natureza meramente procedimental. Nesses termos, o parecer administrativo fiscal, originado em razão da demanda da consulta tributária, materializa-se por meio de um procedimento tributário de caráter preventivo, envolvendo determinado fato de duvidoso enquadramento tributário.

27. Ocorre que a inicial, quanto a determinada parte do último questionamento, não demonstrou a existência da possibilidade de interpretação conflitante de normas tributárias da legislação do Distrito Federal, ou dúvidas sobre sua aplicação, desaguando para o mero pedido de orientação.

28. Nesse ponto, para ajuda envolvendo orientações procedimentais, deverá o Consulente utilizar o canal de Atendimento Virtual, onde o contribuinte poderá reapresentar o pedido acessando o serviço no endereço eletrônico https://www.receita.fazenda.df.gov.br/, devendo selecionar no tópico "Assunto" e no "Tipo de Atendimento" as opções que se ajustam à sua demanda. A orientação será procedida pelos órgãos incumbidos de tratar dos aspectos procedimentais, nos termos das competências fixadas no Regimento Interno da Secretaria de Estado de Economia, Portaria nº 140 de 16 de maio de 2021, conforme previsão contida no Decreto nº 39.610 de 1º de janeiro de 2019.

29. Note-se que refoge às atribuições institucionais desse órgão consultivo manifestar-se acerca de pedido de orientações gerais, cuja análise está concretamente submetida à competência de outros órgãos desta Subsecretaria de Receita.

III - Resposta

30. Diante do exposto, em resposta às indagações apresentadas, informa-se:

I) A disciplina a que faz referência o artigo 247-A do RICMS relaciona-se exclusivamente à declaração normativa de ausência de responsabilidade solidária do leiloeiro, nas exatas circunstâncias que aponta, não configurando, por si só, hipóteses de não exigência do ICMS;

II) O contribuinte da operação deverá ser concretamente apurado face às circunstâncias de cada arrematação, caso haja enquadramento em qualquer das previsões contidas no artigo 12 do RICMS. Quanto ao pedido de orientação relativo a códigos de receita, por assumir feições de orientação procedimental, a resposta encontra-se prejudicada pela via eleita.

31. Saliente-se que, independentemente de comunicação formal ao Consulente e aos demais sujeitos passivos, as considerações, os entendimentos e as respostas definitivas ofertadas ao presente caso poderão ser modificados a qualquer tempo, em decorrência de alteração na legislação superveniente.

32. Nos termos do disposto no art. 80 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011 (Regulamento do Processo Administrativo Fiscal - RPAF), a presente Consulta é eficaz, aplicando-se a esta o disposto no inciso III do art. 81 e caput do art. 82, ambos do PAF.

À consideração de V - S.ª.

Brasília/DF, ___ de ____ de 2021.

GERALDO MARCELO SOUSA

Auditor Fiscal da Receita do Distrito Federal Ao Coordenador de Tributação da COTRI.

De acordo.

Encaminhamos à aprovação desta Coordenação o Parecer supra.

Brasília/DF, ___ de _______ de 2021.

ZENÓBIO FARIAS BRAGA SOBRINHO

Gerente

Aprovo o Parecer supra e assim decido, nos termos do que dispõe a alínea a do inciso I do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 1, de 10 de janeiro de 2018 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 8, de 11 de janeiro de 2018, pp. 5 e 6).

A presente decisão será publicada no DODF e terá eficácia normativa após seu trânsito em julgado.

Esclareço que o Consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Estado de Fazenda no prazo de trinta dias, contado de sua publicação no DODF, conforme dispõe o art. 78, II, combinado com o caput do art. 79 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011.

Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565 , de 25 de junho de 2014.

Brasília/DF, ___ de _______ de 2021.

FLORISBERTO FERNANDES DA SILVA

Coordenação de Tributação Coordenador