Consulta nº 63 DE 12/08/2022
Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 12 ago 2022
ICMS. FABRICAÇÃO DE ESTRUTURAS METÁLICAS.
A consulente, cadastrada com a atividade principal de fabricação de estruturas metálicas, informa que no desenvolvimento de seus objetivos sociais realiza o projeto, a fabricação e a montagem de estruturas metálicas, as quais são aplicadas, por exemplo, em edifícios, usinas termoelétricas, estádios, arenas, galpões, obras de infraestrutura, plataformas, pontes etc.
Expõe que sua dúvida diz respeito à tributação da atividade de montagem de estruturas metálicas, principalmente sob o enfoque da definição de construção civil. Para exemplificar no que consiste essa atividade, faz referência ao seu portfólio, que pode ser acessado no link http://brafer.com/, e também anexa notas fiscais de venda, que demonstram terem as peças por ela fabricadas valores individuais específicos, e de prestações de serviço, bem como o projeto de uma estrutura metálica, com a devida ART - Anotação de Responsabilidade Técnica.
Destaca-se, por fim, que os documentos fiscais anexados pela consulente demonstram que as peças por ela fabricadas possuem valores individuais específicos, existindo base de cálculo para efeitos de pagamento de ICMS.
Esclarece que constrói, mediante contrato de empreitada global, estruturas metálicas para os diversos setores antes mencionados, que são fabricadas fora do canteiro de obra, conforme projetos específicos e, posteriormente, transferidas até os locais onde, sob sua supervisão e responsabilidade técnica, são montadas e incorporadas aos imóveis.
Aduz que a montagem de estruturas metálicas se equipara aos serviços prestados mediante utilização de concreto armado, pois tais estruturas são calculadas e projetadas por engenheiros civis que utilizam os mesmos conhecimentos e processos de cálculo, salientando que, no caso do concreto, é usual sua classificação como construção civil, com afastamento da incidência de ICMS, sob o pressuposto que o objeto contratual implica, preponderantemente, numa obrigação "de fazer", isto é, de realizar, de produzir, de construir a obra.
Para reforçar essa assertiva de que se está diante de hipótese de incidência de ISS, destaca o fato de que os materiais, equipamentos e demais produtos fornecidos pelo prestador de serviço integrarão definitivamente o conjunto da obra a ser produzida, materializando, dessa forma, sua definição como construção civil.
Relata ainda que, dependendo de decisão puramente empresarial, a estrutura metálica pode ser executada integralmente no local da obra, como a de concreto, ressaltando não haver dúvidas que, neste caso, não é considerada industrialização, tanto a fabricação da estrutura metálica quanto a estrutura de concreto armado.
Observa também, relativamente à atividade de montagem de estruturas, com o fim de corroborar sua definição como construção civil, que: (1) é realizada no local da obra; (2) executada mediante utilização de equipamentos típicos da construção civil, tais como andaimes, guindastes, plataformas; (3) está sujeita a normas de segurança do trabalho aplicáveis à construção civil; (4) o responsável técnico pela montagem é engenheiro civil; e (5) os trabalhadores não são os mesmos que executaram a fabricação da estrutura metálica na fábrica, mas trabalhadores típicos de obras de construção, os quais são, em geral, contratados no local da obra.
Reforça que a característica da sua atividade é a obrigação de fazer, e não uma obrigação de fornecimento, não havendo se falar em produção em escala, e sim de serviço customizado, em razão da exclusividade de cada projeto, pressuposto legal e específico de construção civil.
Quanto à legislação envolvida, faz referência ao disposto nos artigos 392 e 393 do Regulamento do ICMS e no subitem 7.02 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar Federal nº 116/2003.
Destaca também ter o STF - Supremo Tribunal Federal analisado o aparente conflito ente o ICMS e o ISS, a partir do precedente consubstanciado na ADI nº 4.389/DF-MC, tendo definido que devem ser avaliados, nas hipóteses que envolvem confecção por encomenda, dois critérios básicos para efeitos de delimitar o campo de incidência dos referidos impostos: (1) verificar se a venda se destina a quem promoverá nova circulação do bem e (2) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a preponderância entre o dar e o fazer, mediante averiguação do uso de elementos de industrialização.
À vista desses critérios, assinala que o STF concluiu que "só haverá incidência do ISS nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no segundo item o fazer preponderar sobre o dar".
No seu entender, deve-se compreender como preponderância o que predomina na relação de aquisição entre o comprador e o vendedor, ou seja, se é o serviço prestado, em que subsidiariamente haja fornecimento de algum material a ele inerente, ou se o que se está adquirindo é um bem industrializado na forma solicitada, em que subsidiariamente possa haver uma prestação de serviço como o de instalação, por exemplo.
Ainda, transcreve julgados do STJ - Superior Tribunal de Justiça , retratando que, na construção civil sob o regime de empreitada global, quando a empresa construtora utiliza peças pré-moldadas por ela fabricadas, para serem montadas em edificação específica, sem comercializá-las individualmente, inexiste base de cálculo para incidência do ICMS, bem como do Tribunal de Justiça do Paraná , cuja ementa traduz que a fabricação, transporte e aplicação de materiais pré-moldados e de estruturas metálicas em edificação específica não se submete ao ICMS.
Por fim, questiona se a montagem de estruturas metálicas se classifica como obra de construção civil, estando submetida ao ISS e não ao ICMS.
RESPOSTA
A consulente, com sede no Centro Industrial de Araucária, tem por objeto social, segundo consta em seu estatuto (fls. 18), "projeto, fabricação e montagem de estruturas metálicas; construções metálicas e equipamentos industriais; construções civis em estruturas metálicas, alvenaria e concreto armado", dentre outras.
A fabricação de estruturas metálicas, ainda que realizada por encomenda de adquirente consumidor final, segundo suas especificações, constitui atividade de industrialização, e não de prestação de serviços.
Esse entendimento se fundamenta em firme jurisprudência do STF - Supremo Tribunal Federal, a partir do precedente consubstanciado na Medida Cautelar na ADI nº 4.389/ DF, mencionada pela consulente, com publicação no DJe de 25.5.2011.
O STF orienta, para fins de resolução do aparente conflito entre a incidência do ICMS e do ISS, nos casos em que encomendante (adquirente) seja consumidor final, que se deve investigar se a atividade desenvolvida envolve elementos de industrialização, isto é, "produção em larga escala, uso de maquinário pesado e talento humano mitigado e a presença de fatores de produção organizados para a exploração de atividade econômica finalisticamente concentrada no fornecimento de mercadorias. Se houver atividade industrial, deverá incidir o ICMS (após a circulação) e o IPI." .
Na hipótese em que empregados elementos de industrialização para a transformação de materiais em novos produtos, haverá a incidência de ICMS. (Precedentes: Consulta nº 99, de 21 de julho de 2016 e nº 7, de 7 de fevereiro de 2017, dentre outras).
Esclarecido que a atividade de fabricação de estruturas metálicas constitui industrialização mesmo quando produzidas em conformidade com especificações do adquirente, cabe analisar o fornecimento dessas estruturas na situação em que produzidas e aplicadas em projetos estruturais de construção civil desenvolvidos pela consulente, em que as peças são produzidas em seu estabelecimento e enviadas ao local da obra, prontas para posterior montagem, instalação e fixação à obra.
Entende-se que essa atividade se amolda à execução de obras de construção civil, previstas nos itens 7.02 ou 7.05 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar Federal nº 116, de 31 de julho de 2003, cuja redação contida em ambos expressamente excepciona da incidência do ISS o valor das mercadorias produzidas pelo executor da construção fora do local da obra:
"7.02 - Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS).
7.05 - Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS).
...
Art. 7º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.
...
§ 2º Não se incluem na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza:
I - o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar;"
Nesse mesmo sentido dispõe a Lei Complementar Federal nº 87/1996, na parte final do inciso V do art. 3º, ao prever a incidência do ICMS, nas hipóteses de prestações de serviço de qualquer natureza definidos na Lista anexa à LC nº 116/2003 em que empregadas mercadorias na sua consecução, quando ressalvada tal incidência na própria lei complementar que dispõe sobre o ISS:
"Art. 3º O imposto não incide sobre:
...
V - operações relativas a mercadorias que tenham sido ou que se destinem a ser utilizadas na prestação, pelo próprio autor da saída, de serviço de qualquer natureza definido em lei complementar como sujeito ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, ressalvadas as hipóteses previstas na mesma lei complementar;".
Frisa-se que essa matéria foi objeto de análise pelo STF, por ocasião do julgamento do Agravo Regimental ao Recurso Extraordinário nº 603.497/MG, de relatoria da Ministra Rosa Weber, ocorrido em 29 de junho de 2020, tendo sido legitimada a incidência de ICMS sobre os materiais produzidos fora do local da obra por seu executor.
A Ministra Relatora, no que diz respeito ao alcance da autorização para dedução do valor dos materiais da base de cálculo do ISS (art. 7º, §2º, I), mencionando ser do STJ - Superior Tribunal de Justiça a tarefa de uniformizar a interpretação de normas dispostas em leis federais, registra que as decisões desse Tribunal evidenciam "a adoção da exegese restritiva da cláusula de dedução, limitada às mercadorias produzidas fora do local da prestação do serviço e comercializadas por contribuinte do ICMS", e não a posição mais favorável aos contribuintes, que seria a de que o abatimento alcançaria todos os gastos com materiais imprescindíveis à prestação do serviço, conforme defendido por parte da doutrina.
Para fundamentar sua conclusão, fez menção e transcreveu a seguinte ementa do STJ:
"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONSTRUÇÃO CIVIL. ISS. BASE DE CÁLCULO. PREÇO TOTAL DO SERVIÇO. ABATIMENTOS. INVIABILIDADE. CONCRETAGEM. SÚMULA 167/STJ.
1. O ISS incide sobre o preço total do serviço de construção civil. Os insumos adquiridos de terceiros pelo construtor e utilizados na obra compõem a base de cálculo do tributo municipal.
2. Entendimento sumulado no que se refere à concretagem (Súmula 167/STJ).
3. Sujeitam-se ao ICMS e são excluídas da base de cálculo do ISS somente as mercadorias produzidas fora do local da prestação do serviço e comercializadas pela contribuinte. Precedentes do STJ. 4. Agravo Regimental não provido. (AgRg nos EDcl no REsp 973.432/MG, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 02/12/2008).".
Para a Ministra Rosa Weber, conforme exposto em seu voto, essa interpretação mais restritiva dada pelo STJ não se mostra ofensiva à Constituição da República, tendo respaldo na doutrina de Kiyoshi Harada :
"Conforme prescreve o inciso I, do § 2º, não se inclui na base de cálculo do ISS o valor dos materiais fornecidos pelo prestador de serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços (execução de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica, e serviços de reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas e pontes, portos ou congêneres), porque nessas hipóteses o valor dos materiais fica sujeito ao ICMS.".
Conclui a Relatora, no final de seu voto:
"...a este Supremo Tribunal Federal não incumbe revisar a exegese perfilhada pelo Superior Tribunal de Justiça, mas apenas verificar se, ao acolhê-la, aquela Corte não incorreu em ofensa à Carta da República, violando o arquétipo constitucional do Imposto sobre Serviços. E, no caso dos autos, não vislumbro ofensa alguma à Carta Magna".
Por seu turno, o Tribunal de Justiça do Paraná, em julgamento ocorrido em 16 de junho de 2021 (Processo: 0002242-11.2018.8.16.0185), observando ter o STF se manifestado sobre o tema quando do julgamento do RE 603497/MG, antes examinado, consignou na ementa:
"APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ISS. CONSTRUÇÃO CIVIL. EXECUÇÃO DE OBRA POR EMPREITADA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA, EXTINGUINDO INTEGRALMENTE A EXECUÇÃO FISCAL.COBRANÇA DO IMPOSTO SOBRE O VALOR DOS MATERIAIS PRODUZIDOS FORA DO LOCAL DA OBRA. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 7º, § 2º, INCISO I, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 116/2003 E ITEM 7.02 DA LISTA ANEXA DA MESMA LEI. MATERIAIS SUJEITOS A ICMS. SENTENÇA CORRETA NESTE PONTO....".
Pelas razões expostas, responde-se à consulente, fabricante de estruturas metálicas e, como tal, contribuinte do ICMS, que ao executar obras de construção civil, nos termos descritos nos itens 7.02 ou 7.05 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar Federal nº 116/2003, nas quais utiliza estruturas produzidas em seu estabelecimento industrial, incide ICMS sobre o valor das respectivas mercadorias.
Por seu turno, na hipótese em que fabrica e efetua a montagem das estruturas, segundo projeto estrutural de responsabilidade do adquirente, incidirá ICMS sobre o valor das peças montadas (fabricação mais serviço de instalação), conforme dispõe o inciso IV do art. 2º da Lei Estadual nº 11.580/1996 ("fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios"), introduzido na legislação paranaense em conformidade como o disposto no inciso IV do art. 2º da Lei Complementar Federal nº 87/1996.