Consulta de Contribuinte nº 84 DE 22/06/2023

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 22 jun 2023

ICMS – ENERGIA ELÉTRICA – ALÍQUOTA – BASE DE CÁLCULO – LC Nº 194/2022 – O Estado de Minas Gerais regulamentou o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei Complementar Federal nº 194, de 23 de junho de 2022, por meio do Decreto nº 48.456, de 1º de julho de 2022, e do Decreto nº 48.482, de 3 de agosto de 2022, para dar cumprimento à referida lei complementar, no que concerne, dentre outros, a incidência, alíquota e base de cálculo do imposto nas operações com energia elétrica.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a distribuição de energia elétrica (CNAE 3514-0/00).

Informa que, em 23 de junho de 2022, foi publicada a Lei Complementar (LC) nº 194/2022, que alterou dispositivos da Lei nº 5.172/1966 (Código Tributário Nacional – CTN) e da Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir) para, entre outras questões, classificar a energia elétrica como bem essencial e indispensável, limitando a alíquota do ICMS ao patamar das operações em geral e determinando a não incidência do imposto sobre serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica.

Menciona que, conforme previsto em seu art. 15, a Lei Complementar nº 194/2022 entrou em vigor na data de sua publicação (23/06/2022), no entanto, até o momento, não foi identificada qualquer orientação do Estado de Minas Gerais relacionada à aplicação da referida lei.

Alega que busca a confirmação sobre a correta interpretação da legislação tributária no que se refere ao momento de aplicação das alterações promovidas pela Lei Complementar nº 194/2022, à alíquota de ICMS incidente nas operações envolvendo o consumo de energia elétrica, e ao alcance da não incidência do ICMS sobre serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica.

 Explica que, conforme a Constituição Federal (CF/1988), compete à lei complementar estabelecer as normas gerais em matéria de legislação tributária (art. 146, III, alínea “a”); no que se refere ao ICMS, as normas gerais para a cobrança são disciplinadas pelo CTN e a Lei Kandir; e a LC nº 194/2022 alterou as referidas leis para determinar que alíquota das operações envolvendo energia elétrica não pode ser fixada em patamar superior à alíquota aplicável às operações em geral.

Argumenta que, tendo em vista que a Lei Complementar nº 194/2022 é uma norma hierarquicamente superior à Lei Estadual nº 6.763/1975, as alterações promovidas no CTN e na Lei Kandir teriam revogado tacitamente todos os dispositivos da legislação mineira que estabelecem alíquotas de ICMS superiores a 18% (dezoito por cento) para operações com energia elétrica.

Entende que, estariam revogadas a alíquota de 30% (trinta por cento) prevista para as operações com energia elétrica para consumo residencial e a alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) prevista para as operações com energia elétrica para consumo da classe comercial, serviços e outras atividades.

Ressalta que o princípio da anterioridade (art. 150, III, alíneas “b” e “c” da CF/1988) afasta a cobrança imediata de tributos apenas no caso de instituição ou majoração e, portanto, não se aplica ao presente caso, em que houve uma redução do tributo devido.

Defende que a Lei nº 6.763/1975 já possui a previsão de uma alíquota de ICMS genérica, a ser aplicada se não houver outra expressamente prevista (art. 12, I, alínea d.1 da Lei nº 6.763/1975), a partir de 23/06/2022, data de início de vigência da LC nº 194/2022, assim, a alíquota de ICMS incidente sobre as operações com energia elétrica para consumo residencial e para consumo da classe comercial, serviços e outras atividades teria passado para 18% (dezoito por cento).

Alega que, quanto à previsão de não incidência do ICMS sobre “serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica”, a dúvida paira sobre quais componentes da Tarifa de Energia (TE), da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e da Tarifa do Sistema de Transmissão (TUST) se enquadram como serviços de distribuição, transmissão e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica, para fins de aplicação do art. 3º, alínea “x” da Lei Kandir, incluída pela LC nº 194/2022, bem como as implicações no Convênio ICMS 115/2003 do CONFAZ.

Participa que a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica – ABRADEE, para maiores esclarecimentos a respeito, em 28/06/2022 enviou ao Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ e à Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL a correspondência ABRADEE/B24.00 CT2022-0055, requerendo:

i. Ao CONFAZ, visando à simplificação e à harmonização das exigências legais, que avalie e proponha as medidas necessárias para que os Estados e o Distrito Federal implementem em suas legislações: (i) a definição das alíquotas do ICMS aplicáveis as operações com energia elétrica, observando a limitação imposta pela Lei Complementar nº 194/2022; e (ii) a previsão de não incidência do ICMS considerando os componentes dos serviços de distribuição, transmissão e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica;

 ii. À ANEEL, visando a possibilitar o fiel cumprimento da legislação tributária pelas concessionárias de serviço público de distribuição, que defina quais componentes da Tarifa de Energia (TE) e da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) se enquadram como serviços de distribuição, transmissão e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica e republique as tarifas com a devida discriminação, para que seja possível a sua correta aplicação;

Afirma que até o momento, não há uma definição sobre a questão, seja por parte do CONFAZ ou da ANEEL.

Com dúvida sobre a interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

1 – É correto o entendimento de que a Lei Complementar nº 194/2022 revogou tacitamente todos os dispositivos da legislação mineira que estabelecem alíquotas de ICMS superiores a 18% (dezoito por cento) para operações com energia elétrica, de modo que a partir de 23/06/2022 as operações com energia elétrica para consumo residencial e para consumo da classe comercial, serviços e outras atividades (exceto para os imóveis das entidades religiosas, das entidades beneficentes educacionais, de assistência social ou de saúde, inclusive filantrópicas, e dos hospitais públicos e privados) passaram a se sujeitar à alíquota geral de 18% (dezoito por cento)?

2 – Quais componentes da Tarifa de Energia (TE), da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e da Tarifa do Sistema de Transmissão (TUST) se enquadram como serviços de distribuição, transmissão e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica, para fins de aplicação da norma de não incidência prevista no art. 3º, alínea “x” da Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir), incluída pela LC nº 194/2022?

3 – Para efeitos da aplicação do Convênio ICMS 115/2003 do CONFAZ, como a companhia deve proceder em relação aos componentes referidos no questionamento anterior?

4 – Caso seja confirmado o entendimento do primeiro questionamento, poderia a companhia corrigir as contas de energia elétrica a partir de 23/06/2022 até a implantação da nova alíquota por meio de item de desconto, haja vista a complexidade e custo dos refaturamentos nos termos do Convênio ICMS 30/2004?

ESPOSTA:

Em preliminar, observa-se que o Estado de Minas Gerais regulamentou o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei Complementar Federal nº 194 de 23 de junho de 2022 por meio do Decreto nº 48.456, de 1º de julho de 2022 e do Decreto nº 48.482 de 3 de agosto de 2022,  para dar cumprimento à referida lei complementar, no que concerne, dentre outros, a incidência, alíquota e base de cálculo do imposto nas operações com energia elétrica.

Ressalte-se que pesa sobre a referida lei complementar ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.195 do Distrito Federal (DF), sendo certo que, por se tratar de ação referente ao controle concentrado de constitucionalidade, as decisões proferidas possuem o condão de vincular o Poder Executivo, nos termos do disposto no § 2º do art. 102 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/1988).

Neste sentido, a medida cautelar concedida em 09/02/2023 na ADI nº 7.195, suspendeu os efeitos da LC nº 194/2022 no que tange a inclusão do inciso X ao art. 3º da LC nº 87/1996, ocasionando a revogação por este estado do retromencionado Decreto nº 48.482/2022 pelo Decreto nº 48.572 de 10 de fevereiro de 2023, com efeitos a partir de 10/02/2023.

Cumpre mencionar que a aplicação dos citados decretos estaduais está vinculada à eficácia da Lei Complementar Federal nº 194/2022, conforme expressamente previstos no art. 3º do Decreto 48.456/2022 e no art. 2º do Decreto 48.482/2022, logo, havendo decisões judiciais que afete a aplicação dessas normas poderá ocasionar a necessidade de revisão das orientações prestadas na presente consulta.

Entretanto, em não tendo sido declarado inconstitucional a regulamentação prevista no Decreto nº 48.482/2022 e Decreto nº 48.457/2022, os termos daquela regulamentação devem ser observados enquanto perdurar sua vigência.

Feitos estes esclarecimentos, passa-se a responder os questionamentos formulados.

1 – Observadas as preliminares, esclareça-se que, em vista o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei Complementar Federal nº 194/2022, foi publicado o Decreto nº 48.456/2022 que estabeleceu a alíquota do ICMS nas operações internas com combustíveis, energia elétrica e nas prestações internas de serviço de comunicação, ajustando percentuais de redução de base de cálculo do imposto.

Nos termos da alínea “c” do art. 1º c/c art. 4º, ambos do referido Decreto, ficou estabelecida em 18% (dezoito por cento) a alíquota do ICMS na operação interna com energia elétrica para consumo residencial e para consumo da classe comercial, serviços e outras atividades, produzindo efeitos retroativos a partir de 23 de junho de 2022.

Saliente-se que foram ressalvadas as alíquotas estabelecidas para as operações com energia elétrica em percentuais inferiores a 18% (dezoito por cento), previstas nas alíneas “b.14” e “d.4” do inciso I do caput e no § 18, todos do art. 42 do RICMS/2002.

A alíquota prevista na citada alínea “d.4” foi revogada em 15/09/2022, havendo acréscimo da alínea “l” desse art. 42, para vigência nesta mesma data, conforme alterações promovidas pelo Decreto nº 48.506, de 14/09/2022.

Vale acrescentar que permanecem vigentes, dentre outros, os benefícios fiscais da isenção nas saídas internas de energia elétrica para consumo em imóveis das entidades filantrópicas, educacionais, de assistência social ou de saúde, pelos órgãos da Administração Pública direta deste Estado, suas fundações e autarquias, bem como o fornecimento de energia elétrica a templos de qualquer culto religioso, desde que observada literalmente as condições previstas, respectivamente, nos itens 79 e 207, ambos, da Parte 1 do Anexo I do RICMS/2002.

2 – Conforme indicado nas preliminares, em vista do disposto no inciso X do art. 3º da Lei Complementar Federal nº 87, de 13 de setembro de 1996, alterado pelo art. 2º da Lei Complementar Federal nº 194, de 23 de junho de 2022, foi publicado o Decreto nº 48.482 de 3 de agosto de 2022, que regulamentou a não incidência do ICMS sobre a parcela do valor relativo aos serviços de transmissão, serviços de distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica, dentre outras providências, estabelecendo efeitos retroativos a 23/06/2022, nos termos  do seu art. 4º.

Considerando a medida cautelar concedida na ADI nº 7.195, que suspendeu os efeitos da LC nº 194/2022 no que tange à mencionada inclusão do inciso X ao art. 3º da LC nº 87/1996, bem como a decorrente publicação, por parte do Estado de Minas Gerais, do Decreto nº 48.572/2023, com efeitos a partir de 10/02/2023, que revogou o retromencionado Decreto nº 48.482/2022, a base de cálculo (BC) do ICMS continua sendo composta por todas as rubricas debitadas do consumidor da energia elétrica, da mesmo forma que era procedida anteriormente à vigência deste decreto.

Entretanto, durante o período compreendido entre 23/06/2022 e 09/02/2023, não comporão a BC do ICMS os valores correspondentes aos serviços de transmissão e distribuição e aos encargos setoriais componentes do valor total cobrado do consumidor final.

Para que se apure tal BC, reproduz-se o entendimento da área técnica especializada desta Secretaria de Estado de Fazenda, que deverá ser observado, conforme abaixo:

(...) a remuneração dos serviços de transmissão está associada ao componente tarifário TUSD FIO A, a remuneração do serviço de distribuição está associada ao componente tarifário TUSD FIO B, a parcela do valor das operações com energia elétrica destinadas ao pagamento de encargos está associada aos componentes tarifários TUSD ENCARGOS e TE ENCARGOS.

Com exceção das componentes de custo TUSD OUTROS e TE OUTROS, que atuam como um fator redutor das tarifas TE e TUSD aplicadas na cobrança do consumidor final, ou seja, reduzem a parcela a ser considerada na base de cálculo do ICMS e, simetricamente, reduzem também a parcela que não irá compor a referida base tributável, as demais parcelas TUSD PERDAS, TE ENERGIA, TE TRANSPORTE e TE PERDAS estão associadas ao pagamento pela energia gerada e consumida no sistema.

Desta forma, para cumprimento do disposto no artigo 3º da Lei Complementar 194/22, deve ser afastada a incidência do ICMS sobre as componentes de custo: TUSD FIO A, TUSD FIO B, TUSD ENCARGOS e TE ENCARGOS, situação que, na prática, produzirá uma alteração na base de cálculo do ICMS. Por sua vez, as componentes de custo: TUSD PERDAS, TE ENERGIA, TE TRANSPORTE e TE PERDAS, serão mantidas na base de cálculo do ICMS.

No caso das componentes de custo TUSD OUTROS e TE OUTROS, como estas componentes afetam o valor total das tarifas, sua exclusão deve ocorrer nas mesmas proporções das demais parcelas a serem excluídas, ou seja, devem reduzir da mesma forma, proporcionalmente, o que compõe e o que não compõe a base de cálculo do ICMS.

3 e 4 – A princípio, cumpre observar que os Convênios ICMS nº 115/2003 e 30/2004 foram inseridos no RICMS/2002, cite-se arts. 54 a 57-P da Parte 1 do Anexo V; arts. 40-A a 40-H da Parte 1 do Anexo VII; e arts. 45 a 53-N da Parte 1 do Anexo IX, todos do citado regulamento.  

Neste caso, para a emissão de documentos e escrituração das operações com energia elétrica deverá observar a legislação tributária vigente à época de ocorrência do respectivo fato gerador, inclusive quanto à indicação correta da alíquota aplicável, a base de cálculo e o valor da operação.

Caso a Consulente não tenha observado os Decretos nº 48.456/2022 e 48.482/2022 no período de suas vigências, ocasionando incorreções na emissão de seus documentos fiscais de saídas, concernentes à indicação da alíquota ou do valor da base de cálculo, poderá utilizar por analogia, no que couber, o procedimento previsto para a hipótese do inciso I do art. 52-I da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002.

Cumpre informar, ainda, que a Consulente poderá utilizar os procedimentos relativos à denúncia espontânea, observando o disposto nos arts. 207 a 211-A do Decreto nº 44.747, de 3 de março de 2008, que estabeleceu o Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos (RPTA), caso não tenha adotado os procedimentos acima expostos.

Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 22 de junho de 2023.

Jorge Odecio Bertolin
Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação

(*) Consulta reformulada para exclusão de referência a documento interno da SEF/MG.