Parecer GEOT nº 102 DE 30/09/2019

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 30 set 2019

ICMS. Incidência e obrigatoriedade de emissão de NF nas operações com gado, acobertadas por TTA ou GTA. Arts. 3º, 4º, 6º e 79 do RCTE-GO; 1º, § 7º e 6º, XLIII do Anexo IX do RCTE-GO; IN nº 913/08-GSF.

I - RELATÓRIO

(...), apresenta nova consulta acerca da incidência do ICMS e da obrigatoriedade de emissão de nota fiscal nas operações acobertadas pela Guia de Trânsito Animal – GTA ou pelo Termo de Transferência Animal TTA.

Aduz que a partir de janeiro de 2016 produtores rurais de todas as regiões do Estado começaram a ser autuados pela emissão de GTA ou TTA sem a emissão da respectiva Nota Fiscal; que, segundo esta Secretaria, para fruição da isenção tributária na comercialização do gado, há a exigibilidade de emissão da nota fiscal para cada operação, conforme o art. 1º, § 7º do Anexo IX do Decreto nº 4.852, de 29 de dezembro de 1997, que regulamentou o Código Tributário do Estado de Goiás – RCTE-GO.

Ressalta que o entendimento das entidades representativas do setor produtivo, coordenado pela FAEG, é de que a GTA e o TTA possuem como principal função o controle de rebanho para fins sanitários. E o objeto das autuações é a desconsideração da isenção em razão da não emissão de nota fiscal. Portanto, não haveria a ocorrência do fato gerador do ICMS, não haveria a obrigatoriedade de emissão de nota fiscal para a operação, tampouco a exigência de recolhimento do imposto, nos termos do art. 113 do RCTE-GO.

Acrescenta que a FAEG empreendeu várias ações em diversas instâncias no sentido de corrigir essa distorção, contra argumentando a aplicação das autuações aos produtores rurais de Goiás, entre elas a formalização de consulta por meio do processo 201700004028578, visando a nulidade dos autos lavrados, tendo sido o entendimento da orientação tributária, expresso no Parecer nº 153/2017-GEOT, favorável à manutenção das autuações; que, em 06/11/2017, encaminhou pedido de reconsideração do aludido parecer, não obtendo resposta da gestão anterior.

Relata, mais, que foi publicada, em 10/07/2018, a Lei nº 20.063, de 04 de maio de 2018, que previa, em seu art. 3º,  a remissão dos créditos tributários e não tributários da Receita Estadual e da Agência Goiana de Defesa Agropecuária -AGRODEFESA, inscritos ou não-inscritos, ajuizados ou não-ajuizados, cujos fatos geradores tivessem ocorrido até a data de publicação da Lei, independentemente do valor, e que estivessem relacionados à aplicação de penalidade pelo transporte de gado bovino desacompanhado de nota fiscal, embora acompanhado de Guia de Trânsito de Animal – GTA; que, no entanto, fora publicada, em 31/08/2018, a Lei nº 20.255, de 30 de agosto de 2018, que revogou o art. 3º da Lei nº 20.063/2018, retornando aos produtores as autuações.

Por fim, solicita nova apreciação da matéria e reabertura de diálogo referente ao tema em questão, objetivando solução que não penalize o Estado nem os milhares de produtores.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Verifica-se que nenhum fato novo foi acrescentado à presente consulta, cujo objeto fora exaustivamente analisado no Parecer nº 153/2017-GEOT.

É premissa básica, na questão tributária, que as mercadorias devem estar acobertadas por documento fiscal idôneo para que possam circular. O fato é notório para aqueles que se dedicam à atividade produtiva ou comercial.

Do mesmo modo, é incontroverso que essa circulação de mercadorias, ressalvadas as hipóteses previstas em lei, configuram fato gerador do ICMS.

De fato, a GTA e o TTA são documentos de controle sanitário. Todavia, ao contrário do que afirma a Consulente, não constituem o fundamento das autuações, que se baseiam na inexistência do documento fiscal. A guia e o termo são instrumentos indicadores da ocorrência da operação e servirão de subsídios para a verificação da regularidade do evento tributário.

Veja-se o que dispõe a legislação tributária:

REGULAMENTO DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO – RCTE-GO

Art. 3º Fato gerador é a situação definida em lei que dá nascimento à obrigação tributária.

Parágrafo único. A caracterização do fato gerador independe da natureza jurídica da operação ou da prestação que o constitua.

Art. 4º O ICMS tem como fato gerador a (Lei nº 11.651/91, art. 11 e 12):

I - operação relativa à circulação de mercadoria;

(...)

§ 3º Presume-se:

I - saída deste Estado e a este destinada, a mercadoria:

a) encontrada em situação fiscal irregular, permitida a aplicação da alíquota própria, caso seja inequivocamente conhecido o destino da mercadoria;

(...)

Art. 6º Ocorre o fato gerador do ICMS, no momento (Lei nº 11.651/91, art. 13):

I - da saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo contribuinte;

(...)

Art. 79. O imposto não incide sobre (Lei nº 11.651/91, art. 37):

(...)

s) de saída interna de mercadoria ou bem, que constitua mera movimentação física, especialmente nas situações a seguir citadas, desde que retorne ao remetente:

(...)

t) de saída interna de produto agropecuário em estado natural, para fim de beneficiamento ou outro tratamento, tais como: classificação, imunização, secagem, acasalamento, cruzamento, engorda, criação, com o objetivo de conservação ou melhoria, desde que deva retornar ao estabelecimento de origem dentro do prazo:

1. de 90 (noventa) dias, a contar da data da respectiva saída;

2. estabelecido em termo de acordo de regime especial, quando tais saídas forem realizadas com habitualidade pelo contribuinte ou houver necessidade de prazo superior ao previsto no item 1 desta alínea;

(...)

Art. 85. A concessão de benefício fiscal não dispensa o sujeito passivo do cumprimento das obrigações acessórias previstas na legislação tributária (Lei nº 11.651/91, art. 43).

(...)

Art. 86. Quando o benefício fiscal for concedido sob condição e esta não for atendida, o contribuinte perde o direito ao benefício e fica obrigado ao pagamento do imposto acrescido das cominações legais cabíveis, desde a data da ocorrência do fato gerador em que tenha havido a utilização do benefício, ressalvada a disposição em contrário.

(...)

Art. 88. O sujeito passivo da obrigação tributária, além do pagamento do imposto, é obrigado ao cumprimento das prestações, positivas ou negativas, estabelecidas na legislação tributária (Lei nº 11.651/91, art. 64).

§ 1º O contribuinte do imposto e as demais pessoas sujeitas ao cumprimento de obrigação tributária, relacionada com o ICMS, são obrigados a (Lei nº 11.651, art. 64, § 2º):

(...)

II - emitir documento fiscal;

(...)

Art. 113. Documento fiscal é o impresso ou o formulário que, confeccionado ou emitido eletronicamente com autorização da administração tributária e revestido de formalidade legal, se destina a registrar e comprovar a ocorrência de operação de circulação de mercadoria, de prestação de serviço de transporte e de comunicação, e de outras hipóteses previstas na legislação tributária.

(...)

Art. 117. A mercadoria ou serviço, em qualquer hipótese, deve estar sempre acompanhado de documento fiscal (Lei nº 11.651/91, art. 66).

Parágrafo único. Está em situação fiscal irregular a mercadoria ou serviço desacompanhado de documentação fiscal exigida ou acompanhado de documentação fiscal inidônea.

(...)

Art. 148. Quando a operação ou prestação estiver no campo da não-incidência prevista na legislação, for amparada por benefício fiscal ou, ainda, quando estiver atribuída a outra pessoa a responsabilidade pelo pagamento do imposto, essa circunstância deve ser mencionada no documento fiscal, indicando-se o dispositivo pertinente da legislação, vedado o destaque do imposto (Convênio SINIEF SN/70, art. 9º).”     (g.n.)

ANEXO IX DO RCTE-GO

Art. 1º Os benefícios fiscais, a que se referem os arts. 83 e 84 deste regulamento, são disciplinados pelas normas contidas neste anexo.

(...)

§ 7º No caso de benefício fiscal concedido por meio de lei estadual, cuja fruição esteja condicionada à origem ou ao destino da mercadoria ou da operação, a origem ou o destino devem ser comprovados por meio de documento fiscal idôneo que acompanhe a mercadoria ou a operação, sendo que a ausência do referido documento fiscal impede a utilização do benefício, exceto nas situações em que a legislação tributária dispense a emissão de documento fiscal.

(...)

Art. 6º São isentos do ICMS:

(...)

XLIII - a saída interna de gado asinino, bovino, bufalino, caprino, equino, muar, ovino e suíno destinado a criar, recriar ou engorda, realizada entre produtores agropecuários, desde que acobertada por nota fiscal e demais documentos de controle exigidos, ficando mantido o crédito, observado o seguinte (Convênio ICMS 139/92):”     (g.n.)

INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 913/08-GSF, DE 20 DE AGOSTO DE 2008.

Art. 1º A operação realizada por produtor agropecuário, inclusive o autorizado a emitir a sua própria nota fiscal, com gado bovino ou bufalino deverá ser acobertada por Nota Fiscal Eletrônica - NF-e, emitida por intermédio de órgão fazendário.

§ 1º A emissão da NF-e poderá ocorrer, via internet, no endereço www.sefaz.go.gov.br da Secretaria da Fazenda de Goiás.

§ 2º A emissão da NF-e por intermédio do órgão fazendário não se aplica ao produtor agropecuário credenciado a emitir a sua NF-e.

(...)

Art. 3º O trânsito de gado bovino e bufalino deve ser acompanhado do Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica – DANFE.”

Como se vê, o ICMS tem como fato gerador a operação relativa à circulação de mercadoria e sua caracterização independe da natureza jurídica da operação que o constitua. Ocorre o fato gerador do ICMS no momento da saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo contribuinte. No presente caso, de acordo com a definição conferida pelo art. 2º, parágrafo único, II do RCTE-GO, considera-se mercadoria o semovente, ou seja, o gado.

O sujeito passivo da obrigação tributária, além do pagamento do imposto, é obrigado ao cumprimento das prestações, positivas ou negativas, estabelecidas na legislação, entre elas a emissão de documento fiscal. A mercadoria, em qualquer hipótese, deve estar acompanhada de documento fiscal. As exceções são as exclusivas relacionadas no art. 183 do RCTE- GO. Conforme a IN nº 913/08-GSF, toda operação realizada por produtor agropecuário com gado bovino ou bufalino deverá ser acobertada por Nota Fiscal Eletrônica - NF-e, emitida por intermédio de órgão fazendário ou pelo produtor autorizado a emitir a sua própria nota fiscal.

A GTA e o TTA não são documentos hábeis para acobertar a mercadoria no que diz respeito ao ICMS, vez que não possuem natureza tributária. Contudo, sua emissão indica que foi realizada uma operação com gado. Se essa operação não está acobertada por documento fiscal, ou seja, se a mercadoria está em situação fiscal irregular, presume-se que é saída deste estado e a este destinada, sendo devido o imposto.

O RCTE-GO, em seu art. 79, prevê a não incidência do ICMS na saída interna de mercadoria ou bem que constitua mera movimentação física, desde que retorne ao remetente, assim como na saída interna do gado para fins de acasalamento, cruzamento, engorda e criação, desde que retorne ao estabelecimento de origem dentro do prazo de 90 dias ou em prazo estabelecido em termo de acordo de regime especial. Concede, ainda, no art. 6º, XLIII, do Anexo IX, a isenção na operação de saída interna de gado destinado a cria, recria ou engorda, realizada entre produtores agropecuários, desde que acobertada por nota fiscal e demais documentos de controle exigidos. Em nenhuma das situações está dispensada a emissão da nota fiscal correspondente.

Nos termos do art. 111 do Código Tributário Nacional, interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção e sobre dispensa do cumprimento de obrigação acessória. O Parecer nº 153/2017-GEOT destaca: “para a fruição de benefícios fiscais há a exigibilidade de emissão da nota fiscal para cada operação, sendo irrelevante se esta condição está expressa ou não no dispositivo do benefício fiscal, conforme preconiza o art. 1º, § 7º, do Anexo IX, do RCTE".

Desse modo, a ausência do referido documento fiscal impede a utilização do benefício de que trata o art. 6º, XLIII, do Anexo IX do RCTE-GO. Em síntese, todas as situações, seja de não incidência, seja de isenção implicam a exigência de documento fiscal idôneo.

Sobre a utilização da GTA e do TTA nas autuações realizadas, foi a seguinte a análise do Parecer nº 153/2017-GEOT:

“Quanto à alegação de que o Fisco estadual está utilizando GTA e TTA para realizar autuações, esclarecemos que o art. 445, inciso III, do RCTE, dispõe que, sem prejuízo de outras atribuições e competências funcionais, o fisco estadual pode apreender mercadoria, livro, documento, programa, arquivo magnético e outros objetos, com a finalidade de comprovar infração à legislação tributária ou para efeito de instruir o processo administrativo tributário. Assim como o art. 455, do RCTE, dispõe sobre o movimento real tributável, realizado pelo sujeito passivo, em determinado período, que pode ser apurado por meio de levantamento fiscal, nos moldes indicados nos dispositivos do mesmo.

A SEFAZ/GO celebrou convênio, dentre outros, para troca de informações, via sistema informatizado, com a Agrodefesa, permitindo, assim, que não haja necessidade de apreensão de documentos e programas, bem como de arquivo magnético, podendo, a fiscalização tributária desta Secretaria utilizar essas informações para instruir o devido processo administrativo tributário, assim o fazendo com o uso da GTA e do TTA sem a respectiva emissão de nota fiscal; em momento algum dando a entender que os documentos sanitários estejam substituindo documentos fiscais, cuja emissão é obrigatória.

Assim, o Fisco estadual está legalmente amparado quanto à utilização de malha fiscal com arquivo de emissão de GTA e de TTA comparando com o arquivo de emissão de nota fiscal, sendo que a emissão, apenas dos documentos sanitários sem o respectivo documento fiscal correspondente, pode ser passível de infração à legislação tributária, tendo o Auditor-Fiscal da Receita Estadual o dever legal de verificar o fato e, se for o caso, efetuar o lançamento tributário, sob pena de responsabilização administrativa, civil e criminal.”

III – CONCLUSÃO

Com base no exposto, conclui-se:

O entendimento expresso no Parecer nº 153/2017-GEOT está conforme a legislação tributária vigente, sendo ratificado na presente consulta. Vale evidenciar os seguintes tópicos:

1) Conforme arts. 3º, 4º e 6º do RCTE-GO, a saída interna do rebanho, ainda que para propriedade do mesmo contribuinte, constitui fato gerador do ICMS;

2) As hipóteses de não incidência de que trata o art. 79 do RCTE-GO, estão condicionadas ao retorno do gado ao remetente, nos prazos fixados no dispositivo correspondente;

3) Consoante o art. 117 do RCTE-GO e a Instrução Normativa nº 913/08-GSF, a mercadoria, em qualquer hipótese, deve estar acompanhada de documento fiscal. A operação realizada por produtor agropecuário com gado bovino ou bufalino deverá ser acobertada por Nota Fiscal Eletrônica - NF-e, emitida por intermédio de órgão fazendário ou pelo produtor credenciado. A ausência do documento fiscal idôneo caracteriza situação fiscal irregular, sujeitando-se o rebanho à incidência do imposto;

4) A isenção estatuída no art. 6º, XLIII, do Anexo IX do RCTE-GO é condicionada a que a operação esteja acobertada por nota fiscal e demais documentos de controle exigidos, sendo que a ausência do referido documento fiscal impede a utilização do benefício, conforme preceitua o art. 1º, § 7º, do Anexo IX do RCTE-GO;

5) Nos termos do art. 111 do Código Tributário Nacional, interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção e sobre dispensa do cumprimento de obrigação acessória. A administração tributária, na sua tarefa de fiscalização, deve agir em estrita observância da legislação tributária, especialmente do Código Tributário Estadual – CTE-GO e seu Regulamento – RCTE-GO;

6) A GTA e o TTA são documentos de controle sanitário, todavia constituem indicativos de realização de operações com o gado, podendo ser utilizados como subsídios da ação fiscal para identificação do fato gerador do ICMS, apuração e constituição do crédito tributário, com fundamento nos arts. 445 e 455 do RCTE-GO.

É o parecer.

GERÊNCIA DE ORIENTAÇÃO TRIBUTÁRIA, aos 30 dias do mês de setembro de 2019.

Documento assinado eletronicamente por OLGA MACHADO REZENDE, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 17/10/2019, às 10:50, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.

Documento assinado eletronicamente por DORMIVAL LEAL DE ALMEIDA, Gerente, em 17/10/2019, às 15:04, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.