Parecer Técnico nº 46 DE 02/09/2011

Norma Estadual - Pará - Publicado no DOE em 02 set 2011

ASSUNTO:ICMS. OPERAÇÕES COM PRODUTOS DE PETRÓLEO. INCIDÊNCIA NAS TRANSFERÊNCIAS.

PEDIDO

Trata - se de impugnação à exigência do ICMS destacado em DAE (fls. 10) no código de Antecipado nas Entradas, decorrente de operação com 30.204 litros de Álcool (etanol) Etílico Hidratado Combustível - AEHC, descrita na Nota Fiscal nº 52.863, de 19/06/2011.

O expediente veio à DTR em atenção ao despachos de fls. 28 e 29, pois as razões da impugnação sustentam a injuridicidade da exigência do ICMS nas operações de transferência entre estabelecimentos da mesma empresa.

Entende a impugnante que “as entradas de AEHC, por intermédio de operações de transferências, não foram alcançadas pelo art. 679 - A, do Decreto nº 4.676/2001 (RICMS/PA), razão pela qual não se pode cogitar da antecipação de ICMS sobre elas.”

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Lei nº 5.530, de 13 de janeiro de 1989.

Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996.

Decreto nº 4.676, de 18 de junho de 2001

MANIFESTAÇÃO

A exigência formalizada pela CEEAT - ST, conforme indica a empresa impugnante, tem base no art. 679 - A do RICMS, que expressa o seguinte:

Art. 679 -A. Nas aquisições, em operações interna e interestadual, de Álcool Etílico Hidratado Combustível - AEHC fica atribuído ao estabelecimento adquirente localizado no Estado do Pará aresponsabilidade pela antecipação do imposto incidente nas operações subsequentes. (destaque nosso)

A operação realizada pela empresa encerra a transferência de um estabelecimento para outro do mesmo titular de 30.204 litros de Álcool (etanol) Etílico Hidratado Combustível - AEHC, descrita na Nota Fiscal nº 52.863, de 19/06/2011.

Aempresa impugnante entende que as transferências não estão contempladas no conceito de aquisição constante do referido dispositivo e que o sentido esboçado no regulamento do ICMS do Estado do Pará quer equiparar aquisição à compra, sendo, assim, inteiramente díspares do significado de transferência.

A sustentação aproveitada pela empresa impugnante ainda tem base na significação do termo aquisição ofertada no Vocabulário Jurídico De Plácido e Silva, como transcrito em parte, a seguir:

“Aquisição - Formadado vocábulo latino acquisitio (ação de adquirir), é empregado na linguagem jurídica para indicaro ato ou o fato, em virtude do qual se opera a transferência do domínio ou propriedade de uma coisa, móvel ou imóvel, ou a sua posse, ou a transferência de um direito, para uma pessoa, que assim se torna proprietário dela, ou titular deste direito.

É, assim, o ato jurídico em que se funda a transmissão da propriedade da coisa ou do direito, olhada em relação à pessoa que, por ela, se transforma em proprietário da cousa ou titular do direito.”

Em complemento, a impugnante entende que a remessa de mercadoria de um estabelecimento para outro do mesmo titular não constitui transmissão de propriedade e, avançando na tese, busca apoio na Súmula 166 do STJ que expressa: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.”

Em oposição ao entendimento da empresa impugnante, cabe lembrar que a incidência do ICMS tem base na circulação de mercadorias. Assim dispõem a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, a Lei nº 5.530, de 13 de janeiro de 1989 e, ainda o próprio Decreto nº 4.676, de 18 de junho de 2001 - RICMS - PA.

Promover a circulação, portanto, é o que motiva a tributação, nos moldes como definido na legislação antes referida, nas respectivas hipóteses de incidência. O modo como a circulação pode dar - se é variável, admitindo - se sua ocorrência em operações de naturezas diversas, dentre as quais a compra, a transferência, etc., o que nos parece consentâneo com o entendimento acima exposto e transcrito da obra de De Plácido e Silva.

Aquisição é “ ato ou o fato, em virtude do qual se opera a transferência do domínio ou propriedade”. Infere - se, pois, a transferência de titularidade.

Para os fins tributários, cada estabelecimento é unidade autônoma que fica sujeita às regras atinentes, sejam acessórias ou principais e, por isso, em regra, respondem isoladamente pelas atividades sujeitas à incidência do tributo.

Nesta linha, cabe deliberar que a incidência tributária é motivada pelo deslocamento (circulação) de mercadoria ou bem entre estabelecimentos, que pode dar - se por aquisição de qualquer natureza jurídica, incluídas a compra e até mesmo a transferência.

Acerca da decisão sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, convém observar sua transcrição e histórico, desde anterior decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal:

Disse o STF que

“O simples deslocamento de coisas de um estabelecimento para outro, sem transferência de propriedade, não gera direito à cobrança de ICM. O emprego da expressão ‘operações’, bem como a designação do imposto, no que consagra o vocábulo ‘mercadoria’ são conducentes à premissa de que deve haver o envolvimento de ato mercantil e este não ocorre quando o produtor simplesmente movimenta frangos”. (AI 131.941 - 1 - Rel. Min. Marco Aurélio - un. DJ 19.4.91, p. 4583).

“A simples circulação física da mercadoria não implica na caracterização do fato gerador do ICM. Sem que exista um fato econômico de relevância jurídica não há que se falar em fato gerador da obrigação tributária.” (RE 72.412 -1ª T- Rel. Min. Djaci Falcão - j. 6.4.72).

As decisões judiciais transcritas referem - se a situações específicas que não permitiram definir a existência de “um fato econômico de rele vância jurídica” nas operações celebradas.

Relativamente à história dos fatos que conduziram à fixação do entendimento antes exposto, Hugo de Brito Machado, em Aspectos fundamentais do ICMS. 2ª ed. São Paulo. Dialética. 1999, pág. 32/33, dá conta de que:

“O Supremo Tribunal Federal, por seu turno, já decidiu que o imposto não incide na transferência para estabelecimento da mesma empresa. Estava em julgamento a questão de saber se devido, ou não, o imposto, na hipótese em que uma empresa, produtora de frangos, remetia seus produtos a um estabelecimento seu, cuja atividade consistia exclusivamente na pesagem dos mesmos, que eram devolvidos ao estabelecimento remetente.

Também nessa hipótese o imposto não é devido. Não porque inocorrente a transmissão da propriedade, mas porque não ocorre uma operação de circulação de mercadoria. Vimos, já, que circulação é o impulso que movimenta a mercadoria do ponto de vista econômico. É a marcha que as coisas realizam desde a fonte de produção até o consumo. Marcha que no caso apreciado pelo Supremo Tribunal Federal não se realizou. O envio de bens para simples pesagem, como retorno ao estabelecimento remetente, para retomada da circulação do ponto em que antes estavam aqueles bens, não configura circulação de mercadorias.”

Como paradigma, tenho que o caso sob apreciação apresenta a relevância jurídica faltante no caso apreciado por ocasião do julgamento no STF.

A operação de transferência de AEHC foi realizada com ânimo definitivo, sem previsão para que a destinatária cumprisse etapa complementar da atividade realizada pela remetente. Os atos da destinatária foram realizados de modo próprio, justamente como que, para fins fiscais, deve ser celebrada a autonomia dos estabelecimentos.

A decisão aproveitada pela defesa, do STJ, é no sentido de que: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.” Súmula 166, aprovada pela Primeira Seção - DJU 1 27.8.96, p. 2996.

Penso tratar - se de interpretação extensiva daquela proferida inicialmente pelo Supremo Tribunal Federal. É decisão que, na forma como redigida, generaliza o tratamento dispensado às situações que não demonstram a necessária relevância jurídica.

Não obstante tratar - se de decisão judicial proferida no Superior Tribunal de Justiça, ainda que sumulada, deve ser levado em conta que o fato de constituir fonte do direito, não exclui essa natureza à fonte maior: a lei.

A interpretação aproveitada pela fiscalização é fundada na legislação tributária. Tem contemplação na lei a ocorrência do fato imputável, a transferência, visto tratar - se de saída de estabelecimento com circulação de mercadoria.

É preciso destacar que a legislação estadual mantém consonância com a decisão sumulada do Superior Tribunal de Justiça. Agrega, apenas, o elemento faltante, qual seja, a relevância jurídica do fato.

No caso o AEHC foi transferido de um estabelecimento para outro com ânimo definitivo, sem previsão de retorno, o que evidencia a intenção de transferir ao controle efetivo do estabelecimento destinatário toda a quantidade transferida. Não sendo previsto o retorno devido, a operação de remessa ganha contornos de operação suscetível de incidência tributária, justamente pela ocorrência, na hipótese, de circulação econômica com relevância jurídica, celebrada entre estabelecimentos autônomos.

Em caráter opinativo, com as razões antes esboçadas, entendemos possível a formalização da exigência.

Assim, compete à unidade fazendária correspondente o exame sobre a adequação ou não do comportamento do contribuinte ou responsável frente às disposições legais tributárias estaduais, com decisão fundamentada ao final, isto porque é sua a atribuição de avaliar a conduta do contribuinte.  Do que resultar o exame, deve ser formalizada a exigência (AINF), se for o caso, resguardado o direito de defesa, ou deve ser o sujeito ser desonerado do gravame.

Em, 2 de setembro de 2011.

HÉLDER BOTELHO FRANCÊS,Coordenador da CCOT/DTR;

ROSELI DE ASSUNÇÃO NAVES, Diretora de Tributação