Resolução CFMV nº 923 de 13/11/2009

Norma Federal - Publicado no DO em 07 dez 2009

Dispõe sobre procedimentos e responsabilidades do Médico Veterinário e do Zootecnista em relação à biossegurança no manuseio de microorganismos e de animais domésticos, silvestres, exóticos e de laboratório, inclusive os geneticamente modificados, bem como suas partes, fluidos, secreções e excreções.

O Conselho Federal de Medicina Veterinária - CFMV, no uso das atribuições definidas na alínea "f" do art. 16 da Lei nº 5.517, de 23 de outubro de 1968; considerando o disposto no art. 5º, alíneas "a", "c" e "j", art. 6º, "a", "b" e "h" e art. 8º, da Lei nº 5.517/68; considerando o disposto nos arts. 4º; 5º e 6º da Lei nº 5.550, de 04 de dezembro de 1968,

Considerando também o disposto nos arts. 1º e 2º, alínea "c", do Decreto nº 64.704, de 17 de junho de 1969,

Considerando que a base da biossegurança é a proteção do indivíduo, o respeito à vida, aos valores éticos e à responsabilidade sócio-ambiental;

Considerando finalmente, a diversidade de espécies animais existentes, a necessidade de uniformização de procedimentos de biossegurança e o seu cumprimento pelos médicos veterinários e pelos zootecnista,

Resolve:

CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Os procedimentos de biossegurança devem ser empregados visando à preservação e ao bem-estar da espécie animal, à segurança individual e coletiva e à proteção do meio ambiente.

Art. 2º Para efeitos desta Resolução, considera-se:

I - Biossegurança: conjunto de saberes e ações de prevenção, minimização ou eliminação de riscos inerentes às atividades de pesquisa, produção, ensino, desenvolvimento tecnológico e prestação de serviços, as quais possam comprometer a saúde do homem, dos animais, das plantas e do meio ambiente;

II - Nível de Biossegurança (NB): nível de contenção necessário para permitir as atividades e desenvolvimento de projetos, de forma segura e com risco mínimo para o operador e para o meio ambiente;

III - Animais Silvestres (AS): aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham a sua vida ou parte dela ocorrendo naturalmente dentro dos limites do território brasileiro e de suas águas jurisdicionais, com acesso, captura, uso e comércio controlados pelos órgãos ambientais federal, estaduais ou municipais;

IV - Animais Exóticos (AE): aqueles cuja distribuição geográfica não inclui o território brasileiro; as espécies ou subespécies introduzidas pelo homem, inclusive domésticas, em estado selvagem; outras espécies que tenham sido introduzidas fora das fronteiras brasileiras e suas águas jurisdicionais e que tenham entrado espontaneamente no território brasileiro;

V - Animais Domésticos (AD): aqueles que pelos processos tradicionais e sistematizados de manejo e de melhoramento zootécnico tornaram-se domésticos, possuindo características biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem, podendo, inclusive, apresentar aparência diferente das espécies silvestres que os originaram;

VI - Animais de Laboratório (AL): aqueles empregados na pesquisa experimental, biológica e médica, com variados objetivos;

VII - Organismo Geneticamente Modificado (OGM): organismo cujo material genético (ADN/ARN) foi modificado por qualquer técnica de engenharia genética;

VIII - Animal Geneticamente Modificado (AnGM): animal que tenha ácido nucléico exógeno intencionalmente incorporado ao genoma de suas células germinativas ou somáticas;

IX - Contenção: condição que não permite o escape ou liberação para o meio ambiente de microrganismos patogênicos e/ou OGM/AnGM, realizada em pequena ou grande escala;

X - Risco: possibilidade de promoção de evento negativo para a saúde humana e/ou animal, os vegetais, outros organismos e o meio ambiente, cientificamente fundamentado, decorrente de processos ou situações, envolvendo ou não OGM/AnGM e/ou seus derivados.

Art. 3º A avaliação do risco deve preceder a determinação dos Níveis de Biossegurança e medidas de contenção a serem adotadas, considerando, além da espécie animal, o risco potencial do agente, as atividades e as condicionantes locais.

Art. 4º Para as Classes de Risco Biológico considera-se:

I - Risco 1: baixo risco individual e baixo risco para a coletividade;

II - Risco 2: moderado risco individual e baixo risco para a coletividade;

III - Risco 3: alto risco individual e risco moderado para a coletividade;

IV - Risco 4: alto risco individual e alto risco para a coletividade;

V - Risco Especial: alto risco de causar doença animal grave e de disseminação no meio ambiente.

Parágrafo único. As classes de Riscos para microorganismos não geneticamente modificados tem como base a classificação dos agentes biológicos e as diretrizes gerais para o trabalho em contenção com agentes biológicos do Ministério da Saúde e, para OGM e AnGM, as definidas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio).

Art. 5º Consideram-se quatro Níveis de Biossegurança (NB-1, NB-2, NB-3 e NB-4), crescentes conforme o grau de contenção e a complexidade de proteção necessárias.

§ 1º O Nível de Biossegurança - NB é determinado segundo o organismo de maior classe de risco envolvido, sendo:

I - NB-1: requer procedimentos para o trabalho com microorganismos Classe de Risco 1, que normalmente não causam doenças em seres humanos ou em animais;

II - NB-2: requer procedimentos para o trabalho com microorganismos Classe de Risco 2, não transmissíveis pelo ar, mas capazes de causar doenças em seres humanos ou em animais. O risco de contaminação e/ou infecção é baixo, havendo tratamento efetivo e medidas preventivas disponíveis;

III - NB-3: requer procedimentos para o trabalho com microorganismos Classe de Risco 3, que geralmente causam doenças em seres humanos ou em animais e podem representar risco se disseminados na comunidade, mas usualmente existem medidas de tratamento e prevenção. Exige contenção para impedir a transmissão pelo ar, por efluentes ou outras formas;

IV - NB-4: requer procedimentos para o trabalho com microorganismos Classe de Risco 4, que causam doenças graves ou letais para seres humanos e animais, com fácil transmissão por qualquer meio. Exige contenção rigorosa.

§ 2º A classificação dos Níveis de Biossegurança para microorganismos não geneticamente modificados tem como base a classificação dos agentes biológicos e as diretrizes gerais para o trabalho em contenção com agentes biológicos do Ministério da Saúde e, para OGM e AnGM, as definidas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio).

CAPÍTULO II
DOS DEVERES

Art. 6º Todo acidente deve ser comunicado à chefia superior e, aqueles envolvendo OGM/AnGM, à Comissão Interna de Biossegurança (CIBio).

Art. 7º O Médico Veterinário ou Zootecnista designado para ser membro de CIBio, profissional responsável pelos procedimentos de biossegurança e/ou membro de equipe, deve:

I - Exigir da instituição o seu treinamento adequado e reciclagens periódicas, para execução das atividades previstas e a prática dos procedimentos e normas de biossegurança, visando à prevenção de acidentes e ao aumento da segurança individual e coletiva;

II - Conhecer as regras para o trabalho com agentes patogênicos e os respectivos riscos biológicos, químicos, radioativos, tóxicos e ergonômicos;

III - Conhecer os mecanismos de funcionamento da CIBio, quando utilizar técnicas e métodos de engenharia genética ou realizar pesquisas com OGM/AnGM e seus derivados, conforme estabelecido pela CTNBio;

IV - Estar protegido por imunização apropriada;

V - Usar Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e coletiva (EPC), adequados ao nível de risco;

VI - Transitar com material patogênico devidamente acondicionado, identificado e protegido, seguindo as normas pertinentes;

VII - Transportar animais e microorganismos atendendo à legislação existente, sanitária, ambiental e de biossegurança;

VIII - Executar os procedimentos sem/ou com o mínimo de produção de aerossóis;

IX - Conhecer e cumprir a legislação regente da matéria, especificamente as normas expedidas pela CTNBio, estando sujeito às leis de crimes ambientais, da vigilância sanitária e de biossegurança;

X - Atender às normas expedidas pela CTNBio quanto às instalações físicas e procedimentos de contenção para atividades e projetos com OGM/AnGM;

XI - Comunicar ao CRMV, em cuja jurisdição a atividade se realiza, o nome e a inscrição do profissional responsável, bem como dos demais médicos veterinários e/ou zootecnistas envolvidos.

Art. 8º Todo procedimento deverá seguir as regras básicas para o trabalho em laboratório, incluindo as normas de boas práticas e as recomendações descritas nos anexos 1 e 2.

Art. 9º Todo procedimento que envolva OGM/AnGM deverá seguir as normas de segurança estabelecidas pela Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005, por seu Regulamento, Decreto nº 5591, de 22 de novembro de 2005 e demais normas que as complementem ou substituam.

Art. 10. Os protocolos experimentais relativos ao uso de animais deverão ser submetidos à Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA), nos termos da Resolução CFMV nº 879, de 15 de fevereiro de 2008, e demais normas que a complementem ou substituam.

Art. 11. As doenças animais exóticas não existentes no País devem ser consideradas de alto risco, mesmo que não atinjam o homem, e trabalhadas no mais alto grau de contenção disponível, visando a eliminação adequada dos restos de alimentos e dos animais infectados, suas secreções e excreções, bem como dos animais que tenham contato direto com os espécimes atingidos, inclusive o tratamento de efluentes, para impedir a disseminação do agravo no país.

Art. 12. As condições para o funcionamento de estabelecimentos médicos veterinários devem obedecer ao disposto na Resolução CFMV nº 670, de 10 de agosto de 2000 e demais normas que a complementem ou substituam.

Art. 13. Para o acondicionamento e o descarte dos resíduos biológicos deve-se atender ao item 32.5 da Portaria nº 485, de 11 de novembro de 2005, do Ministério do Trabalho e Emprego, às normas da vigilância sanitária e de segurança ambiental, bem como aos demais dispositivos que as complementem ou substituam.

CAPÍTULO III
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 14. O descumprimento da presente Resolução configura infração ética e ensejará, independentemente da responsabilização civil, administrativa e criminal, a instauração, de ofício ou em decorrência de representação, de Processo Ético-Disciplinar.

Art. 15. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação no DOU, revogadas as disposições em contrário.

BENEDITO FORTES DE ARRUDA

Presidente do Conselho

JOAQUIM LAIR

Secretário-Geral do Conselho

ANEXO 1

Requisitos recomendados (R) ou obrigatórios (O) para área física e instalações conforme Níveis de Biossegurança Animal (NBA)

Requisito NBA1 NBA2 NBA3 NBA4 
Sinalização com símbolo de risco biológico 
Biotério separado de passagens públicas 
Biotério isolado 
Torneira com acionamento sem uso das mãos 
Ventilação mecânica, sem recirculação do ar para outras áreas 
Filtro HEPA nas saídas de ar 
Pressão negativa na sala de animais 
Portas de entrada e saída das salas de animais com intertravamento 
Paredes, portas, tetos e pisos lisos, impermeáveis e resistentes à desinfecção 
Antecâmara de acesso ao biotério:     
- com lavatório e local para paramentação  
- dotada de portas com intertravamento  
- pressurizada com chuveiro e vestiário 
- para equipamentos 
Separação física dos corredores de acesso às salas de animais 
Tratamento de efluentes 
Selagem/vedação de frestas nas paredes, tetos, pisos e demais superfícies 
Cabine de segurança biológica (CSB) na sala de procedimentos 
Autoclave     
- no biotério 
- dupla porta 
Área contígua de apoio para descontaminação, lavagem, preparo e esterilização 

ANEXO 2

Requisitos recomendados (R) ou obrigatórios (O) para área física e instalações conforme Níveis de Biossegurança em laboratório

Requisito NB1 NB2 NB3 NB4 
Laboratório separado de passagens públicas 
Laboratório com acesso  
- Controlado 
- Restrito    
Locais para armazenar jalecos e EPI de uso exclusivo no laboratório 
Lavatório para as mãos próximo a entrada/saída do laboratório 
Torneira com acionamento sem o uso das mãos 
Ventilação     
- Fluxo interno de ar 
- Sistema central de ventilação 
- Filtragem HEPA de exaustão 
Laboratório     
- Janelas vedadas 
- Sem janelas 
Pressão negativa 
Antecâmara 
- com lavatório e local para jalecos 
- cotada de portas com intertravamento 
- com chuveiro 
- pressurizada com chuveiro 
Paredes, tetos e pisos lisos, impermeáveis e resistentes à desinfecção 
Tratamento de efluentes 
Sistema de geração de emergência de energia elétrica 
Selagem/vedação de frestas nas paredes, tetos e demais superfícies 
Cabine de Segurança Biológica CSB 
Autoclave     
- próxima ao laboratório 
- no laboratório 
- dupla porta 
Monitoração de segurança (visor, circuito interno de TV, interfone, etc