Resolução Normativa SEF/COPAT nº 34 de 11/09/2002

Norma Estadual - Santa Catarina - Publicado no DOE em 19 set 2002

Ementa: ICMS. Redução da base de cálculo. Benefício que implica o aproveitamento proporcional dos créditos do imposto. Regra expressa na Lei de regência, que ainda mais se justifica na hipótese do benefício concedido aos estabelecimentos distribuidores e atacadistas estabelecidos no estado, por se tratar de benefício pelo qual pode o contribuinte optar livremente, conforme lhe seja favorável.

De acordo com o disposto no art. 4º da Portaria SEF nº 226/01, faço publicar a seguinte Resolução Normativa, acompanhada do respectivo parecer, aprovada pela Comissão Permanente de Assuntos Tributários - COPAT.

Resolução Normativa nº 034, aprovada na sessão realizada em 11 de setembro de 2002:

01. CONSULTA

A consulente, entidade associativa que congrega empresas dedicadas à distribuição e comércio atacadista estabelecidas em Santa Catarina, formula consulta à COPAT versando sobre a interpretação dos dispositivos da legislação tributária estadual que estabelecem o benefício da redução da base de cálculo do ICMS nas operações realizadas pelas suas afiliadas, questionando se a fruição do benefício implica a necessidade de aproveitamento proporcional do crédito pelas entradas das respectivas mercadorias.

Defende a consulente o entendimento de que tal proporcionalidade não deva ser observada, haja vista ser o imposto não cumulativo. Menciona, buscando suporte para o seu entendimento, decisão do Supremo Tribunal Federal que declara inaplicável aos casos de redução da base de cálculo do ICMS as regras relativas ao aproveitamento de crédito estabelecidas pela Constituição Federal para os casos de isenção e não incidência. Refere-se ainda ao teor da Exposição de Motivos que acompanhou a proposta de edição do Decreto instituidor do benefício, na qual se consigna a intenção de que deste resultasse para o contribuinte uma carga tributária equivalente a 12% do valor da operação.

Pergunta a consulente ao final se está correto seu entendimento.

02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Lei nº 10.297/96, art. 23;

RICMS/01, art. 30, Anexo 2, arts. 90 e 91.

03. FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

A matéria objeto da consulta tem sua disciplina estabelecida de forma bastante clara no art. 23 da Lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996, que dispõe sobre o ICMS, cujo teor é o seguinte:

Art. 23. O crédito será apropriado proporcionalmente, nos casos em que a operação ou prestação subseqüente for beneficiada por redução de base de cálculo, na forma prevista na legislação tributária.

Da leitura do dispositivo, cujo conteúdo é reproduzido pelo art. 30 do RICMS, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, resulta bastante clara a incorreção do entendimento defendido pela consulente. A regra é vazada, com efeito, em termos inequívocos, que não autorizam dúvida quanto a seu sentido, que não é outro senão o de que, nas operações beneficiadas com redução de base de cálculo, "o crédito será apropriado proporcionalmente".

Na verdade, a consulta ora analisada não expressa propriamente uma dúvida quanto à interpretação do dispositivo referido. Consiste mais em uma coleção de argumentos que, no entender da consulente, seriam suficientes para afastar, na hipótese, a aplicação da regra combatida. A resposta exigida da COPAT, então, é se, diante de tais argumentos, podem as empresas afiliadas à entidade consulente, deixar de aplicar, em suas operações a regra do art. 23 da Lei nº 10.297/96, e realizar o aproveitamento integral do crédito, não obstante o benefício da redução da base de cálculo.

A resposta à questão é negativa. Inicialmente porque se trata de norma vigente e válida, a que não se pode negar aplicação, especialmente em sede administrativa, enquanto não retirada, pelos meios próprios, do ordenamento jurídico vigente. Mas não somente por isso, uma vez que o dispositivo não padece dos vícios apontados pela consulente.

Ao contrário do afirmado pela consulente, o dispositivo não contém ofensa ao princípio da não-cumulatividade do ICMS. Ofensiva ao princípio seria a regra que estabelecesse total vedação ao aproveitamento do crédito, como é o caso daquela declarada inconstitucional pelo STF, no julgado apenas parcialmente trazido à colação pela consulente, do RE 161.031/MG, cuja ementa é a seguinte:

ICMS. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. MERCADORIA USADA. BASE DE INCIDÊNCIA MENOR. PROIBIÇÃO DE CRÉDITO. INCONSTITUCIONALIDADE.

Conflita com o princípio da não-cumulatividade norma vedadora da compensação do valor recolhido na operação anterior. O fato de ter-se diminuição valorativa da base de incidência não autoriza, sob o ângulo constitucional, tal proibição. Os preceitos das alíneas "a" e "b" do inciso II do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal somente têm pertinência em caso de isenção ou não-incidência, no que voltadas à totalidade do tributo, institutos inconfundíveis com o benefício fiscal em questão.

Ocorre que não se trata, na hipótese objeto da consulta, de aplicação aos casos sujeitos à redução da base de cálculo das regras constitucionais reservadas à isenção ou não incidência. Trata-se, isto sim, de regra própria, estabelecida pelo legislador estadual especificamente para os casos em que seja concedida redução da base de cálculo do imposto. Neste caso, tem-se que o próprio legislador, exercendo sua competência tributária exclusiva que abrange naturalmente a competência de exonerar - cuidou de estabelecer o alcance do benefício fiscal nas hipóteses em que entender por bem conceder redução da base de cálculo.

É certo que em decorrência da regra insculpida no art. 23 da Lei nº 10.297/96 o montante da desoneração tributária da operação sujeita a redução da base de cálculo será um pouco menor que aquela que resultaria do mesmo benefício sem a necessidade de creditamento proporcional. Mas é igualmente certo que o legislador não está vinculado a conceder benefícios fiscais em montante determinado. A intensidade da exoneração é matéria que se insere no âmbito de sua competência discricionária, exercida com atenção a critérios de política tributária.

Pode, assim, entender que determinadas situações devam sofrer maior grau de exoneração do ônus tributário, e que outras a necessitem em grau menor. Para atingir tais objetivos de forma adequada às necessidades de cada situação, vale-se o legislador de uma série ampla de instrumentos, por meio dos quais pode exercer sua competência exonerativa em diferentes graus de intensidade.

O benefício fiscal pode, pois, variar desde a concessão de uma isenção do imposto com autorização para que o contribuinte aproveite-se integralmente do crédito relativo ao imposto pago em operações anteriores - abrindo exceção à regra do art. 155, § 2º II, a e b, da Constituição Federal -, passando pelas isenções normais, em que o crédito é vedado e pelas concessões de créditos presumidos, até as reduções de base de cálculo. Nos casos em que concede créditos presumidos ou reduções da base de cálculo do imposto, o legislador goza ainda de ampla liberdade para a fixação do benefício, que pode consistir num crédito de pequeno valor, ou na redução quase integral da base sobre a qual é calculado o imposto.

Essa liberdade revela a possibilidade de, mediante o manejo dessa ampla gama de instrumentos, implementar, no âmbito do ICMS, o princípio da seletividade da tributação, mediante o dimensionamento da carga tributária de forma adequada às circunstâncias de cada caso, princípio igualmente reconhecido por julgado do Pleno do STF, também parcialmente transcrito na consulta.

Na hipótese sobre que versa a consulta, verifica-se que o montante da exoneração tributária fixado pela legislação não é, segundo o entendimento da consulente, satisfatório. Porém é ao legislador que cabe fazer esse julgamento, e não ao destinatário da norma. Ao texto expresso da norma exonerativa deve ceder a insatisfação do contribuinte beneficiado, não importa quão grande seja essa insatisfação ou o montante em que entenda seria justo fixar o favor fiscal.

Nesse sentido, é essencial para a análise da consulta observar que a fruição do benefício fiscal referido constitui mera faculdade posta pelo legislador estadual à disposição do contribuinte. Não se trata de um benefício "imposto" ao contribuinte. Caso este entenda que lhe seja mais vantajoso permanecer no sistema normal de tributação, sem a redução da base de cálculo, aproveitando-se integralmente do crédito pelas suas entradas, nenhum obstáculo lhe será imposto.

É o que se verifica com bastante clareza das disposições dos arts. 90 e 91 - especialmente deste último - do Anexo 2 do RICMS/01, verbis:

Art. 90. Até 30 de junho de 2003, fica reduzida a base de cálculo do imposto nas seguintes operações promovidas por distribuidores ou atacadistas estabelecidos em território catarinense, atendidas as disposições desta Seção:

I - em 29,411% (vinte e nove inteiros e quatrocentos e onze milésimos por cento), nas saídas de mercadorias sujeitas a alíquota de 17% (dezessete por cento);

II - em 52% (cinqüenta e dois por cento), nas saídas de mercadorias sujeitas a alíquota de 25% (vinte e cinco por cento).

Parágrafo único. O benefício não se aplica às mercadorias:

I - alcançadas por qualquer outro benefício fiscal;

II - sujeitas ao regime de substituição tributária.

III - saídas com destino a consumidor final.

IV - saídas de atacadista ou distribuidores de:

a) auto peças;

b) material de construção;

c) produtos agropecuários;

d) tecidos, confecções e calçados.

Art. 91. A aplicação do benefício dependerá de regime especial concedido pelo Diretor de Administração Tributária ao interessado.

§ 1º Ao requerer a concessão do regime especial o interessado deverá no período abrangido pelo regime especial, comprometer-se a:

I - aumentar o nível de empregos;

II - ampliar as áreas de armazenagem e a frota de veículos;

III - incrementar o recolhimento de ICMS.

§ 2º - Além do disposto no § 1º, a fruição do benefício condiciona-se a que o contribuinte:

I - transfira aos adquirentes das mercadorias, sob forma de redução nos preços, o resultado da redução do imposto.

II - não incorra em inadimplemento de tributos estaduais.

§ 3º O não-cumprimento do disposto nos §§ 1º e 2º, implica cassação do regime especial, com a conseqüente exigência do imposto dispensado, sem prejuízo da multa e dos acréscimos legais cabíveis.

Importa observar que, em situação semelhante, já reconheceu o Supremo Tribunal Federal, em votação unânime, a legitimidade de mecanismos destinados à redução da carga tributária do imposto, que impliquem em substituição do crédito normal do imposto por alguma espécie de benefício fiscal. É o que fica evidenciado na ementa da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.502/DF, em que se lê:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONVÊNIOS ICM Nº 46/89 E ICMS Nº 38/89 (PARÁGRAFO ÚNICO DAS RESPECTIVAS CLÁUSULAS SEGUNDAS), QUE ESTARIAM A IMPEDIR O PRESTADOR DE SERVIÇO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE UTILIZAR CRÉDITOS FISCAIS RELATIVOS A ENTRADAS TRIBUTADAS, COM OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, DA NÃO-CUMULATIVIDADE E DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA ESTADUAL. REQUERIMENTO DE CAUTELAR.

Dispositivo que, ao revés, se limita a estabelecer compensação automática para a redução da carga tributária operada por efeito da cláusula anterior, como parte do sistema simplificado de contabilização e cálculo do tributo incidente sobre as operações sob enfoque, constituindo, por isso, parte do sistema idealizado e posto à livre opção do contribuinte. Assim, eventual suspensão de sua vigência, valeria pela conversão do referido sistema em simples incentivo fiscal não objetivado pelos diplomas normativos sob enfoque, transformado, por esse modo, o Supremo Tribunal Federal em legislador positivo, papel que lhe é vedado desempenhar nas ações da espécie. Conclusão que desveste de qualquer plausibilidade os fundamentos da inicial. Cautelar indeferida.

Também aqui, como na situação objeto desse acórdão, o benefício consiste num sistema alternativo da apuração do montante do tributo devido pelo contribuinte. Por esse sistema alternativo pode ou não, com absoluta liberdade, optar o contribuinte, caso entenda que o benefício lhe seja mais favorável que a tributação sem benefício algum. Fácil concluir, como de fato concluiu o STF, que a legislação expressa nesses termos não traz qualquer prejuízo ao contribuinte do imposto.

Não se vislumbra como possa o contribuinte, após admitir - ao optar pelo benefício e requerer ao fisco sua fruição, mediante solicitação da concessão de regime especial - que a sua aplicação lhe é favorável, que a carga tributária a que fica sujeito em razão de suas operações resta reduzida, pretender demonstrar qualquer prejuízo em razão da fruição do mesmo benefício fiscal, ainda que seja a título de cumulatividade do imposto.

Se o contribuinte opta pelo benefício em substituição ao aproveitamento integral dos créditos, não pode ser por outra razão senão pelo fato de que os créditos não lhe proporcionam diminuição do imposto a pagar tão grande quanto a redução da base de cálculo. Incabível, portanto, falar em cumulatividade. Afinal, verifica-se a cumulatividade do imposto apenas quando esse venha a incidir mais de uma vez sobre uma mesma base tributável, de forma que o ônus tributário a que sujeito o contribuinte resulte agravado, o que evidentemente não ocorre na hipótese.

Face ao exposto, responda-se à consulente que não está correto o seu entendimento, devendo os contribuintes seus afiliados observar, quando da fruição do benefício previsto nos arts. 90 e 91 do Anexo 2 do RICMS/01, a regra traçada pelo art. 23 da Lei nº 10.297/96, que determina o creditamento proporcional do imposto

É o parecer. À consideração da Comissão.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 7 de agosto de 2002.

Laudenir Fernando Petroncini

FTE - Matr. 301.275-1

COPAT, em Florianópolis, 16 de setembro de 2002.

Laudenir Fernando Petroncini

Secretário Executivo