Consulta nº 78 DE 30/11/2021

Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 30 nov 2021

ICMS. EMPRESA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. TRATAMENTO E OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS.

CONSULENTE: TENDA NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS S.A. INSCRIÇÃO: CNPJ 09.625.762/0001-58.

SÚMULA: ICMS. EMPRESA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. TRATAMENTO E OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS.

RELATOR: Luís Carlos Carranza

A consulente, com matriz no Estado de São Paulo e com filial no Paraná, não inscrita no CAD/ICMS, expõe que atua no setor de construção civil, na qualidade de incorporadora, realizando obras próprias em terrenos de sua propriedade, bem como atividades conexas e correlatas ou subsidiárias, que direta ou indiretamente se relacionam ao seu objeto social.

Destaca que os empreendimentos construídos são de sua titularidade, não realizando atividades em favor de terceiros, mas somente com o objetivo de venda de unidades residenciais populares.

Explica que reservava um local em cada canteiro de obras para a alocação de materiais e insumos, tendo optado, porém, por incremento na racionalidade, facilitação logística e economia, em concentrar a recepção e a armazenagem dos materiais necessários à execução de seus diversos empreendimentos em um local específico, situado no Estado de São Paulo, o qual denomina por "canteiro fixo".

Expõe, a consulente, que não comercializa os mencionados materiais, o que não lhes confere a condição de mercadorias, já que a construtora, na condição de consumidora final e não na de prestadora de serviços, os compra, recebe e consome na sua atividade de construção de imóveis próprios destinados à venda, sem a figura da empreitada ou semelhante.

Invocando os posicionamentos favoráveis ao seu entendimento, manifestados pelos fiscos paulista e carioca, assim como as decisões do Poder Judiciário acerca das operações entre estabelecimentos de uma mesma empresa, a consulente apresenta as seguintes indagações:

i) Está correta a interpretação de que as remessas de materiais de construção civil do canteiro fixo de obras, situado no Estado de São Paulo, para emprego em obras próprias da consulente no Estado do Paraná, estão fora do âmbito de incidência do ICMS?

ii) Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, está correta a interpretação de que os estabelecimentos da consulente (localizados no Paraná e em São Paulo) estão dispensados de inscrever-se no CAD/ICMS?

iii) Os materiais, adquiridos pela consulente e armazenados no canteiro fixo paulista, poderão ser movimentados entre os seus estabelecimentos mediante a emissão de nota fiscal de simples remessa, sem destaque do ICMS e em nome da própria consulente, conforme entendimento veiculado pela SEFAZ/SP?

RESPOSTA

Transcreve-se, de início, as disposições pertinentes do Regulamento do ICMS (RICMS), aprovado pelo Decreto nº 7.871, de 29.9.2017:

TÍTULO I - DAS DISPOSIÇÕES BÁSICAS

...

Art. 7.º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento (art. 5º da Lei n. 11.580, de 14 de novembro de 1996):

...

XV - da realização de operações e prestações iniciadas em outra unidade federada que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto localizado neste Estado (inciso XV do "caput" do art. 5º da Lei n. 11.580, de 14 de novembro de 1996).

...

§ 10. Na hipótese do inciso XV do "caput", caberá ao remetente ou ao prestador a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre as alíquotas interna e interestadual (Difal) (§ 7º do art. 5º da Lei n. 11.580, de 14 de novembro de 1996)...

Art. 17. As alíquotas internas são, conforme o caso e de acordo com a Nomenclatura Comum do Merco-sul - NCM, assim distribuídas (art. 14 da Lei n. 11.580, de 14 de novembro de 1996):

...

§ 12. São internas as operações com mercadorias entregues a consumidor final não contribuinte do im-posto no território deste Estado, independentemente do seu domicílio ou da sua eventual inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS em outra unidade federada.

Art. 18. As alíquotas para operações e prestações interestaduais são (art. 15 da Lei n. 11.580 de 14 de novembro de 1996):

...

§ 1.º Na saída de mercadoria para empresa de construção civil inscrita no cadastro de contribuintes do ICMS da unidade federada de destino aplica-se a respectiva alíquota interestadual (inciso II do "caput" do art. 1º da Lei n. 16.016, de 19 de dezembro de 2008).

CAPÍTULO II - DO CADASTRO DE CONTRIBUINTES

SEÇÃO I - DA INSCRIÇÃO

Art. 176. Deverão inscrever-se no Cadastro de Contribuintes do ICMS - CAD/ICMS, antes do início de suas atividades, aqueles que pretendam realizar operações relativas à circulação de mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (art. 33 da Lei 11.580, de 14 de novembro de 1996).

...

§ 7.º As empresas de construção civil deverão observar o disposto no Capítulo I do Título III deste Regulamento.

TÍTULO III - DOS PROCEDIMENTOS EM OPERAÇÕES E PRESTAÇÕES ESPECÍFICAS

CAPÍTULO I - DA CONSTRUÇÃO CIVIL

Art. 392. A empresa de construção civil deverá manter inscrição no CAD/ICMS, em relação a cada esta-belecimento, para cumprimento das obrigações previstas neste Regulamento.

§ 1.º Entende-se por empresa de construção civil, para os efeitos deste artigo, toda pessoa natural ou jurídica, que promova, em seu nome ou de terceiros, a circulação de mercadoria ou a prestação de serviço de transporte, na execução de obras de construção civil, tais como:

I - construção, demolição, reforma ou reparação de prédios ou de outras edificações;

II - construção e reparação de estradas de ferro ou rodagem,  incluindo os trabalhos concernentes às es-truturas inferiores e superiores de estradas e obras de arte;

III - construção e reparação de pontes, viadutos, logradouros públicos e outras obras de urbanismo;

IV - construção de sistemas de abastecimento de água e de saneamento;

V - execução de obras de terraplenagem, de pavimentação em geral, hidráulicas, elétricas, hidrelétri-ca, marítimas ou fluviais;

VI - execução de obras de montagem e construção de estruturas em geral;

VII - serviços auxiliares ou complementares necessários à execução das obras, tais como de alvenaria, de instalação de gás, de pintura, de marcenaria, de carpintaria, de serralheria.

§ 2.º O disposto neste artigo aplica-se, também, aos empreiteiros e subempreiteiros, responsáveis pela execução de obras no todo ou em parte.

Art. 393. Não está sujeito à inscrição no CAD/ICMS:

I - a empresa que se dedicar às atividades profissionais relacionadas com a construção civil, para pres-tação de serviços técnicos, tais como: elaboração de plantas, projetos, estudos, cálculos, sondagens de solos e assemelhados;

II - a empresa que se dedicar exclusivamente à prestação de serviços em obras de construção civil, me-diante contrato de administração, fiscalização, empreitada ou subempreitada, sem fornecimento de materiais.

Art. 394. Em relação à construção civil o ICMS será devido, dentre outras hipóteses:

I - na saída de materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, quando remetidos a terceiros;

II - no fornecimento de casas e edificações pré-fabricadas e nos demais casos de execução, por admi-nistração, empreitada ou subempreitada de construção civil, de obras hidráulicas e de outras seme-lhantes, inclusive serviços auxiliares ou complementares, quando as mercadorias fornecidas forem produzidas pelo próprio prestador fora do local da prestação dos serviços;

III - na entrada de bens importados do exterior;

IV - na aquisição de mercadoria ou bem destinado ao uso ou consumo ou ao ativo permanente, em ope-ração interestadual, relativamente ao diferencial de alíquotas.

Parágrafo único. O disposto no inciso IV do "caput" somente se aplica na hipótese em que o estabeleci-mento adquirente seja contribuinte do ICMS.

Art. 395. O estabelecimento inscrito sempre que promover saída de mercadoria ou transmissão de sua propriedade fica obrigado à emissão de nota fiscal.

§ 1.º Na hipótese de a mercadoria ser retirada diretamente do local da obra, tal fato será consignado no campo "Informações Complementares" do quadro "Dados Adicionais" da nota fiscal, indicando-se, além dos requisitos exigidos, o endereço desta.

§ 2.º Tratando-se de operação não sujeita ao ICMS, a movimentação de mercadoria ou outro bem mó-vel, entre os estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra obra será feita mediante a emissão de nota fiscal, com as indicações dos locais de procedência e destino.

§ 3.º A mercadoria adquirida de terceiros poderá ser remetida diretamente para a obra, desde que no documento fiscal constem o nome, o endereço e os números de inscrição, estadual e no CNPJ, da em-presa de construção, bem como a indicação expressa do local onde será entregue.

§ 4.º O contribuinte poderá manter impressos de documentos fiscais no local da obra, desde que regis-tre no RO-e os seus números, série, sendo o caso, bem como o local da obra a que se destinarem.

Art. 396. Os livros serão escriturados nos prazos e condições previstos neste Regulamento.

Parágrafo único. Na hipótese do § 2º do art. 395 deste Regulamento, a nota fiscal emitida deverá ser escriturada nos respectivos livros fiscais, nas colunas relativas a data e ao documento fiscal, fazendo constar na coluna "Observações" a natureza da operação.

Primeiramente, impõe-se destacar que a empresa de construção civil é contribuinte do ICMS, caso promova a circulação de mercadorias, a prestação de serviços de transporte, bem como as atividades previstas no artigo 394 do RICMS.

A consulente assevera que suas atividades não incorrem nessas situações, o que de fato, em regra, retira-lhe a condição de contribuinte do imposto.

Diante dessas premissas, passa-se a examinar as questões formuladas.

Quanto à primeira questão, ressalta-se, de plano, que não é competência deste Setor Consultivo avaliar a incidência ou não de imposto que, se devido, caberia a outra unidade federada.

No que tange às remessas de que trata essa indagação, cinge-se a análise ao aspecto do diferencial de alíquotas devido à unidade federada de destino, à medida que, a partir da Emenda Constitucional nº 87, 16 de abril de 2015, mercadorias destinadas a consumidores finais não contribuintes do imposto passaram também a estar sujeitos à exigência decorrente da diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna praticada no destino, como especificado no inciso XV do artigo 7º do RICMS.

Observa-se, no entanto, que as operações retratadas nesse dispositivo regulamentar subordinam-se à condição de que tenham por objeto mercadorias, não sendo essa a situação verificada na descrição da consulente, haja vista que, além dos materiais para construção já terem sido adquiridos e recebidos pelo estabelecimento paulista na qualidade de consumidor final, são transferidos para emprego em obra da consulente localizada no Paraná com a mesma natureza, mormente quando, como declara, a consulente não presta serviços de construção civil, mas sim constrói obras próprias, em que são os imóveis já construídos os bens posteriormente por ela comercializados.

Assim, na situação relatada pela consulente, qual seja na remessa física, ao estabelecimento paranaense, de materiais que já são de propriedade da pessoa jurídica e que estão efetivamente estocados no seu estabelecimento paulista nominado canteiro fixo, correto o entendimento da consulente quanto à inexistência de imposto a ser recolhido a este Estado.

Ressalva-se, no entanto, que descabe a adoção, por conveniência da consulente, de movimentações triangulares dos materiais, com a utilização de operações de natureza simbólica, para afastar recolhimento de imposto legitimamente devido a este Estado, como, por exemplo, o que seria devido em conformidade com as disposições do inciso XV do artigo 7º do RICMS, no caso de fornecedores da consulente situados em outras unidades federadas que enviem materiais diretamente às suas obras (estabelecimentos) localizadas neste Estado.

E, de igual maneira, no caso de fornecedores da consulente situados neste Estado que enviem os materiais diretamente às obras (estabelecimentos) aqui realizadas, hipótese em que inaplicável a alíquota fixada de acordo com o § 1º do artigo 18 do RICMS, porquanto impositiva a regra de que trata o § 12 do art. 17 da mesma norma regulamentar. Precedente na Consulta nº 144/2016.

Adentrando à segunda questão, mais uma vez, informa-se que não cabe ao Setor Consultivo se manifestar quanto à necessidade de a consulente ser ou não detentora de inscrição estadual em outra unidade federada, entretanto, não podem os materiais de construção destinados às obras localizadas no Paraná serem movimentadas sem documentos fiscais que espelhem fidedignamente as respectivas operações efetuadas.

Nesse sentido, importa enfatizar, conforme dispõe o § 7º do artigo 176 do RICMS, que a empresa de construção civil, ainda que não promova a circulação de mercadorias, deverá ser detentora de inscrição estadual neste Estado sempre que promover a movimentação de materiais inerentes à sua atividade, para cumprimento das obrigações dispostas no Capítulo I (Da Construção Civil) do Título III (Dos Procedimentos em Operações e Prestações Específicas) do mesmo Regulamento, que compreendem os artigos 392 a 396, antes transcritos.

E, no que tange à terceira questão, esclarece-se que a nota fiscal emitida por estabele-cimento paulista, ainda que com destinatário paranaense, deve observar as regras previstas na legislação daquele Estado, o que, ao atender simultaneamente as disposições do Sinief - Sistema Nacional Integrado de Informações Econômico-Fiscais, está apta a documentar o trânsito dos materiais entre o referido canteiro fixo e a obra aqui localizada.

Registre-se, no entanto, que se materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, forem objeto de operações iniciadas nos locais das obras aqui loca-lizadas, deverá ser obtida inscrição no CAD/ICMS, e impor-se-á o cumprimento das obrigações tributárias correspondentes, inclusive a emissão de notas fiscais que documentem as menciona-das operações. Precedente na Consulta nº 21/2012, dentre outras.