Consulta de Contribuinte nº 172 DE 31/08/2022
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 31 ago 2022
ICMS – REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO – CARNE PRODUZIDA NO ESTADO – Para fins da aplicação da redução de base de cálculo prevista no item 20 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, considera-se produzido no Estado o produto proveniente de outra unidade da Federação que tenha sido submetido, em estabelecimento mineiro, a uma das operações de industrialização previstas nas alíneas “a” e “c” do referido inciso II do art. 222 do RICMS/2002, conforme inciso II do § 6º do mesmo artigo.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a fabricação de produtos de carne (CNAE 1013-9/01).
Informa que tem como atividades secundárias o comércio atacadista de carnes bovinas e suínas e derivados (CNAE 4634-6/01), o comércio atacadista de aves abatidas e derivados (CNAE 4634-6/02) e o comércio atacadista de pescados e frutos do mar (CNAE 4634-6/03).
Aduz que, no exercício regular de suas atividades, adquire carcaças de boi, assim entendido “o animal abatido, sangrado, esfolado, eviscerado, desprovido de cabeça (separada entre os ossos occipital e atlas), patas (seccionadas à altura das articulações carpo-metacarpiana e tarso metatarsiano), rabada, órgãos genitais externos, gordura perirrenal e inguinal, ferida de sangria, medula espinhal, diafragma e seus pilares”, junto a fornecedores localizados em Minas Gerais e em outros Estados.
Relata que pretende adquirir aves e cortes de aves abatidas fora de Minas Gerais e processar essas mercadorias, in natura ou levemente temperadas, através da desossa, cortes de partes (separação de partes), fracionamento de peso, em novas embalagens e nova rotulagem.
Esclarece que a matéria-prima (carcaças bovinas e suínas), adquirida de abatedouros mineiros e de outros estados, chega ao seu estabelecimento em carretas frigoríficas, penduradas em varais e sem nenhum tipo de embalagem e que, depois de conferidas as condições e a qualidade, as carcaças são descarregadas e armazenadas em câmara frigorífica.
Salienta que, em relação às aves utiliza o mesmo tipo de veículo, porém, ao invés de penduradas em varais, estas chegam em caixa com o produto congelado a fim de manter a qualidade.
Afirma que em seu estabelecimento é realizada a desossa, separação em cortes, limpeza, colocação de embalagem primária e secundária, sendo o produto final posteriormente revendido para seus clientes pessoas jurídicas, contribuintes ou não.
Entende que a saída da carne desossada, limpa, separada e embalada deve ser feita com adoção da base de cálculo reduzida, constante na alínea "a" do item 20 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, a qual exige que o produto seja produzido no Estado.
Acrescenta que pretende, ainda, fazer a opção pelo crédito presumido previsto no inciso IV do art. 75 do RICMS/2002 e que, para isso, cumprirá todas as exigências do § 2º do mesmo artigo.
Compreende que a base de cálculo reduzida e o crédito presumido são assegurados mesmo que o abate do gado tenha ocorrido em outro Estado.
Alega que o caput do item 20 da Parte 1 c/c itens 6 e 8 da Parte 6, ambas do Anexo IV do RICMS/2002, prevê a redução da base de cálculo para os "produtos comestíveis resultantes do abate de gado bovino ou suíno e também as aves, em estado natural, resfriados ou congelados", o que abrange tanto a carcaça como a carne propriamente dita, já que ambas são derivadas do abate.
Observa que adquire a carcaça, submetendo-a a processo de industrialização de forma a obter carne desossada, limpa, separada e embalada ao final, o que é um novo produto, que também se constitui em um “produto comestível resultante do abate de gado bovino ou suíno, além das aves, em estado natural, resfriados ou congelados”.
Realça que há uma nova operação, a de industrialização da carcaça, que é integralmente realizada em seu estabelecimento mineiro, sendo que a industrialização (carne desossada), do início ao fim, ocorre dentro do estado de Minas Gerais, e as vendas dos seus produtos ocorrerão com adoção da base de cálculo reduzida e a utilização do crédito presumido nas vendas no território deste estado.
Assevera estar ciente de que, caso queira utilizar o crédito presumido para as vendas para outras Unidades da Federação, deverá efetuar o pedido de regime especial.
Defende que, se, durante o processamento, remetesse a carne em produção para que fosse parcialmente industrializada em outro Estado (industrialização por encomenda), nesta hipótese, de fato, a redução da base de cálculo e o crédito presumido não seriam permitidos.
Menciona que seu posicionamento está em perfeita sintonia com o Convênio ICMS 89/2005, uma vez que não há exigência, nesse convênio, para que toda a etapa produtiva ocorra no território de um Estado, como condicionante para fruição do benefício.
Deduz, baseando-se nas disposições contidas no inciso IV c/c § 2º, ambos do art. 75 do RICMS/2002, que o processamento (industrialização da carcaça) é espécie diversa da industrialização ("o abate ou o processamento”), ou seja, o abate não integra o processamento da carne.
Contextualiza que, de um lado, tem-se o abate e de outro o processamento da carne, porém, ambas as situações constituem ciclos de industrialização, próprios e independentes.
Argumenta que no processo industrial do abate há entrada da matéria-prima (boi vivo, NCM 0102) e saída da carcaça do boi (produto final NCM 0201.10.00), no entanto, no seu processo industrial, há entrada da carcaça (matéria-prima NCM 0201.10.00) e saída de carne pronta para ser vendida (produto final NCM 0201.30.00).
Pondera que a compra de carcaça de bovino, suíno e aves junto a fornecedor localizado em outro Estado não impede a utilização da redução da base de cálculo e a utilização do crédito presumido, desde que todas as etapas do processo produtivo da carne (desossa, separação em cortes, limpeza, embalagem primária, embalagem secundária) ocorram em território mineiro.
Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 – Considerando os fatos e a fundamentação legal acima mencionados, poderá a Consulente optar pelo crédito presumido do inciso IV do art. 75 do RICMS/2002 na venda de carne de bovino, suíno e aves abatidos e adquiridos em outra Unidade da Federação, sendo parte da industrialização realizada neste Estado?
2 – Os processamentos realizados pela Consulente, tais como desossa, separação em cortes, limpeza, embalagem primária, embalagem secundária, desossa, corte de partes e fracionamento de peso em novas embalagens e rotulagem são considerados industrialização ou processamento?
3 – Aplica-se a redução da base de cálculo nas vendas internas de bovino, suíno e aves abatidos e adquiridos em outra unidade da Federação?
4 – Ocorre a hipótese de inaplicabilidade da substituição tributária na operação de venda realizada pelo fornecedor em operação interestadual, nos termos do inciso IV do art. 18 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002, considerando que a mercadoria se destina à industrialização?
5 – Nas vendas internas de carnes de bovino, suíno e aves abatidos e adquiridos para alimentação humana, destinadas a pessoas jurídicas, aplicar-se-á a substituição tributária prevista no Anexo XV cumulada com a redução da base de cálculo estabelecida no Anexo IV, ambos do RICMS/2002?
RESPOSTA:
Preliminarmente, esclareça-se que embora tenha a Consulente se referido à Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) e a legislação mineira se baseie na Nomenclatura Brasileira de Mercadorias baseada no Sistema Harmonizado (NBM/SH), há equivalência entre as normas, pois, nos termos do art. 3º do Decreto Federal nº 11.158/2022, a NCM constitui a NBM/SH.
Vale ressaltar que a correta classificação e o enquadramento dos seus produtos na codificação da NBM/SH são de exclusiva responsabilidade do contribuinte. No caso de dúvida, caberá à Consulente dirigir-se à Secretaria da Receita Federal do Brasil, órgão competente para dirimir questões sobre classificações que tenham por origem normas federais.
Feitos esses esclarecimentos, passa-se à resposta dos questionamentos formulados.
1 – Considerando-se as informações prestadas pela Consulente, verifica-se que ela adquire carcaças bovinas e suínas e pretende adquirir aves e cortes de aves abatidas, tanto junto a fornecedores localizados em Minas Gerais, quanto junto a fornecedores localizados em outros Estados.
Ademais, conforme afirmado pela Consulente, todas as etapas de seu processo produtivo (desossa, separação em cortes, limpeza, embalagem primária e embalagem secundária) serão realizadas em seu estabelecimento localizado em Minas Gerais. Por fim, a Consulente assevera que seus produtos serão revendidos para clientes pessoas jurídicas, contribuintes ou não do ICMS.
Destarte, e tendo em vista a situação fática em epígrafe, verifica-se que a Consulente poderá optar pelo crédito presumido, previsto no inciso IV do art. 75 do RICMS/2002, na venda de seus produtos alimentícios oriundos do processamento de aves e de gado bovino e suíno, ainda que o abate dos animais, que constituem a matéria-prima de seu processo industrial, tenha sido realizado em outra unidade da Federação, pois, conforme estabelecido na alínea “b” do inciso III do § 2º do referido art. 75, desde que a desossa ou qualquer outra etapa do processamento seja realizada em Minas Gerais, pelo próprio contribuinte, e a mercadoria seja destinada a pessoa jurídica, ainda que o abate não seja realizado no Estado, o contribuinte poderá optar e utilizar o supracitado crédito presumido.
2 – As atividades descritas pela Consulente, realizadas em seu próprio estabelecimento, fazem parte do processamento da carne e, em assim sendo, verifica-se que, nos termos do inciso II do art. 222 do RICMS/2002, a desossa, a separação em cortes e peças, assim como a limpeza da carne são consideradas industrialização na modalidade beneficiamento e a colocação de embalagens (primária ou secundária) é considerada industrialização na modalidade acondicionamento. Nesse sentido, vide as Consultas de Contribuinte nos 223/2015 e 058/2021.
Por oportuno, vale lembrar que, conforme disposto no supramencionado inciso II, a atividade de abate de animais, ainda que sob encomenda de terceiros, caracteriza-se como industrialização, estando incluída no campo de incidência do ICMS. Nesse sentido, vide a Consulta de Contribuinte nº 189/2020.
3 – Conforme disposto no item 20 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, as saídas, em operação interna, dos produtos destinados à alimentação humana relacionados no item 6 (produtos comestíveis resultantes do abate de gado bovino ou suíno, em estado natural, resfriados ou congelados) e no item 62 (produtos comestíveis resultantes do abate de galos e galinhas, inclusive frangos, perus e peruas, em estado natural, resfriados ou congelados), ambos da Parte 6 do mencionado Anexo IV, são contempladas por redução de base de cálculo, desde que produzidos no Estado.
Assim sendo, no que tange aos produtos relacionados nos aludidos itens 6 e 62, cumpre salientar que a redução de base de cálculo prevista no referido item 20 somente será aplicável aos produtos que tiverem sido produzidos em Minas Gerais, sendo que, nos termos do inciso II do § 6º do art. 222 do RICMS/2002, são considerados produzidos no Estado os produtos provenientes de outra unidade da Federação que tenham sido submetidos, em estabelecimento mineiro, a uma das operações de industrialização previstas nas alíneas “a” e “c” do inciso II do reportado art. 222.
Portanto, a redução de base de cálculo prevista na alínea “a” do apontado item 20, na saída em operação interna dos produtos alimentícios relacionados nos versados itens 6 e 62, somente será aplicada quando tais produtos forem submetidos à modalidade de industrialização denominada “transformação”, assim entendida aquela que, exercida sobre matéria-prima ou produto intermediário, importe em obtenção de espécie nova, conforme alínea “a” do inciso II do citado art. 222, ainda que parte de seu processamento industrial, como, por exemplo, o abate do gado ou da ave, tenha sido realizado em outra unidade da Federação. Nesse sentido, vide a Consulta de Contribuinte nº 217/2020.
Desse modo, e considerando-se que, conforme esclarecido na resposta nº 2 acima, a desossa, a separação em cortes e peças e a limpeza são consideradas operações de industrialização na modalidade beneficiamento, e a colocação de embalagens (primária ou secundária) é considerada operação de industrialização na modalidade acondicionamento, verifica-se que as operações de industrialização realizadas pela Consulente, com matérias-primas adquiridas em outras unidades da Federação, não são alcançadas pela redução de base de cálculo prevista no relatado item 20, haja vista que os produtos oriundos dessas operações (beneficiamento e acondicionamento) não são considerados produzidos no Estado.
Vale ressaltar que, em relação aos produtos comestíveis, inseridos no item 60 da Parte 6 do Anexo IV do RICMS/2002, resultantes do abate de aves, exceto os relacionados no indigitado item 62 da mesma Parte 6, de gado bufalino, caprino ou ovino, em estado natural, resfriados ou congelados, inexiste a obrigação de que eles tenham sido produzidos no Estado para fruição do benefício fiscal previsto no item 20 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002.
4 – Sim. Conforme previsto no inciso IV do art. 18 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002, o regime de substituição tributária não se aplica às operações que destinem mercadorias a estabelecimento industrial para emprego em processo de industrialização como matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem, desde que este estabelecimento não comercialize a mesma mercadoria.
Dessarte, e tendo em vista que a Consulente adquire matérias-primas (carcaças bovinas e suínas e aves e cortes de aves abatidas) para emprego em seu processo de industrialização, o ICMS/ST deverá ser recolhido por ocasião da operação de saída que ela promover, consoante o disposto no art. 12 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002.
Ressalte-se que, nos termos do § 4º do supracitado art. 18, os fornecedores da Consulente deverão indicar no campo “Informações Complementares” das notas fiscais que acobertarem as operações de saída de suas mercadorias (carcaças bovinas e suínas e aves e cortes de aves abatidas), o dispositivo em que se fundamenta a inaplicabilidade da substituição tributária, qual seja, o precitado inciso IV do art. 18.
5 – Em Minas Gerais, a sujeição de determinado produto ao regime da substituição tributária, relativamente às operações subsequentes, depende do cumprimento de três requisitos cumulativos, quais sejam: estar corretamente classificado em um dos códigos da NBM/SH relacionados na Parte 2 do Anexo XV do RICMS/2002, integrar a respectiva descrição e ter o âmbito de aplicação diferente de “Inaplicabilidade da substituição tributária”.
Além disso, a partir de 1º/01/2018, o regime de substituição tributária passou a alcançar somente as mercadorias constantes dos itens vinculados aos respectivos segmentos nos quais estão inseridos.
As mercadorias comercializadas pela Consulente, objeto da presente Consulta, encontram-se inseridas nos itens 83.0 a 87.2 do Capítulo 17 da Parte 2 do Anexo XV do RICMS/2002, e, dessa forma, a Consulente deverá, na condição de sujeito passivo por substituição, reter e recolher o ICMS devido nas operações subsequentes destinadas a contribuintes mineiros, a menos que o estabelecimento destinatário seja estabelecimento industrial que as utilize para emprego em processo de industrialização e desde que este estabelecimento não comercialize as mesmas mercadorias. Nesse sentido, vide a Consulta de Contribuinte nº 164/2020.
Quanto à redução de base de cálculo prevista no item 20 da Parte 1 do Anexo do IV do RICMS/2002, tem-se que, conforme esclarecido na resposta nº 3, as operações de industrialização realizadas pela Consulente, utilizando matérias-primas adquiridas em outras unidades da Federação, não são alcançadas pela redução de base de cálculo prevista no relatado item 20, haja vista que os produtos oriundos dessas operações (beneficiamento e acondicionamento) não são considerados produzidos no Estado. Não obstante, em relação às matérias-primas adquiridas de fornecedores situados em território mineiro, produzidas no estado, a Consulente poderá aplicar a redução de base de cálculo prevista no supradito item 20.
Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 31 de agosto de 2022.
Alberto Sobrinho Neto |
Ricardo Wagner Lucas Cardoso |
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação